Arquiteto ou Balconista?
Arquitetura é assim, existem diversas maneiras de entendê-la. É claro que valor da arquitetura está ligado ao modo como você vê e a entende. O exemplo de F. L. Wright é interessante para a gente captar o instante onde a arquitetura acontece e quando acontece. A clientela tem que ter preparo e inteligência para interpretar, absorver e consumí-la. As testemunhas garantem que este arquiteto adiava a entrega do projeto há mais de 6 meses aos proprietários da casa e marcou a entrega do para dia seguinte, após a insistência destes. Em menos de 24 horas ele e seus colaboradores desenharam e entregaram o projeto da Falling House (a casa foi construída em cima de uma cachoeira). É claro que o projeto não surgiu nos últimos momentos, com certeza este projeto estava na cabeça do arquiteto há algum tempo. Mas o instante, a idéia, a epifania surge em segundos. O resto é trabalho de qualquer um. Estou cansado de ver arquitetos sem o dom, sem a idéia, sem aquele momento de explosão onde seu projeto ninguém mais consegue mudar.
A Falling House é um desafio destes, não há nada que um mortal qualquer consiga alterá-la no mínimo que fosse. Hoje em dia, um cliente quando procura um arquiteto, geralmente vai encontrar um balconista de materiais de construção. Senta-se fronte a algumas "idéias", na base do tudo se copia nada se cria, e começa-se o que chamamos de espetáculo da imaginação - um desfile de catálogos, amostras, telefones, contatos e lojas onde quem vende recebe e quem compra paga! Muito justo, não fosse a utilização da máscara de arquiteto para fazer o trabalho de um balconista, de um vendedor de loja de material de construção.
Infelizmente existem arquitetos carregando uma latinha d'água tentando apagar um incêndio numa floresta. Vai ser muito difícil alterar esta tendência.
Nos anos 80, Brasília colocava no mercado através da Unb, no máximo 40 arquitetos por ano. Hoje estamos chegando aos 400. É claro que a oferta de arquitetos é bem superior a demanda, daí, talvez o trabalho de balconista ganhe espaço em detrimento da verdadeira vocação do arquiteto.
O comportamento do mercado hoje, leva a maioria dos arquitetos a desdenharem do preço do projeto em função da profissão oculta de balconista. Especificar materiais é uma consequência do projeto, é uma competência do arquiteto, o que não pode é fazer da remuneração deste ato, um fim na profissão.
Arquitetura é arte, artesanato, não tem garantia nem prazo de validade. Arquitetura antes de tudo é espaço e não revestimento. Obrigatoriamente tem que ser criativa, tem que ter leitura própria. É pessoal tanto para o arquiteto quanto para o cliente.
Falling House hoje é patrimônio público da humanidade, uma idéia realizada em menos de 24 horas.
A diferença entre a atividade de criar espaço e criar o acabamento e ou revestimento está no fato de que no espaço você parte praticamente do zero, suas referências estão na expectativa, no sonho, no desejo. Quanto à decoração não existe imaginação, não existe sonho, o que temos são vitrines, catálogos e outros expositores. A critica em si, não é sobre a especificação dos materiais. Existe o arquiteto que trabalha o espaço e o consolida com a indicação dos revestimentos, mas sempre como finalização do trabalho de arquitetura, nunca como ponto de partida. Para o vendedor, primeiro ele vende o material, depois encontra um lugar onde coloca-lo. É muito comum o material a ser aplicado sobredeterminar o espaço, principalmente se o vendedor for muito bom.
Os corretores de imóveis, no afã de vender o imóvel, eles acabam se tornando também os incorporadores. Esse é o perigo da nossa profissão - o balconista quer ter a preferência e acaba se tornando o arquiteto também.
Antes de procurar um arquiteto, tente entender um pouco sobre arquitetura, sobre os grandes arquitetos e também sobre projetos. Depois, será muito fácil diferenciar um arquiteto de um balconista.