O FUTURO DO LIVRO
Existe uma determinação do Governo Brasileiro, de alto significado educacional: em futuro próximo, nenhum município brasileiro poderá receber recursos do Ministério da Cultura enquanto não possuir uma biblioteca pública. Além disto, pela Lei 12.244/10, até 2020, todas as instituições educacionais, públicas e privadas do Brasil, ficam obrigadas a ter uma biblioteca. Nesta mesma Lei se manda valorizar os(as) profissionais bibliotecários(as).
É evidente, biblioteca somente existe onde há um acervo de livros, acessível a um público. E quem deve administrar as bibliotecas são os bibliotecários. Também no Brasil a profissão do(a) bibliotecário(a) está regulamentada, exigindo-se formação universitária para exercê-la com dignidade. Ao menos alguns legisladores brasileiros, no passado, tiveram a sensibilidade civilizatória de dar o devido valor aos livros. Estavam conscientes de que os livros devem ser amados, e cuidados com carinho.
Já o Decreto-lei no. 25 de 30 de novembro de 1937, assinado por Getúlio Vargas, organiza a proteção do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. A este Patrimônio cultural brasileiro pertencem também muitos livros, caracterizados posteriormente com mais detalhes pela Lei 5.471 de 09 de julho de 1968, que diz em seu art. 10: “Fica proibida, sob qualquer forma, a exportação de bibliotecas e acervos documentais constituídos de obras brasileiras ou sobre o Brasil, editadas nos séculos XVI a XIX”. Aqui dá-se grande valor a bibliotecas, como abrigo de livros e documentos que informam sobre nossa história e preservam nossa cultura.
Embora já existam leis que protegem livros e valorizam bibliotecas, sabe-se que nem todos os livreiros e políticos zelem adequadamente pela valorização das bibliotecas, e dos profissionais bibliotecários. O Governo costumeiramente abre pouquíssimas vagas para bibliotecários em concursos públicos. Pensam os mandatários que qualquer professor, com dificuldades em sala de aula, possa ser deslocado para cuidar daquilo que deveriam ser as bibliotecas das Escolas.
Além disto, ainda existem livreiros que continuam contrabandeando livros editados nos séculos XVI a XIX, que falam do Brasil. Estes livros saem do país, provavelmente, porque a Polícia Federal não conhece a Lei, ou porque não dá importância a livros. Felizmente, agora, o Ministério da Cultura exige bibliotecas públicas nos municípios brasileiros. Mas, se esta determinação ministerial vai ser respeitada, é outra história. Significa, contudo, um avanço.
Mas a minha intenção neste texto não é propriamente exaltar o valor imaterial dos livros, e sim falar dos livros como objetos. Livros com páginas que se manipulam, se conservam, se expõem. A história do livro tem diversas etapas.
Na Antiguidade se fala em “bíblia”(livros), palavra grega que deriva da palavra egípcia, que designava o papiro. A designação “livro” vem da palavra latina “líber”, que é a película de madeira que fica entre a casca e o tronco da árvore. Nesta película, originariamente, se pintavam sinais gráficos. No tempo em que se escrevia em papiro, pergaminho, peles de animais, os textos eram enrolados. Daí se falar que os rolos de “livros” possuíam volume. Hoje se fala em livros como “volumes”, “volumaços”. E a palavra “página” vem do latim “pagus”, que significa aldeia, locais interiores. Estas páginas permitem ir de uma “aldeia” para outra.
Por estas considerações constata-se que, para chegar ao formato dos nossos livros de papel, transcorreu um longo tempo, e fases interessantes na utilização de material como substrato para a escrita.
Até há poucos anos, nossas bibliotecas conservavam apenas livros impressos em papel. Hoje temos as bibliotecas virtuais, os e-books, textos eletrônicos. Uma verdadeira revolução nos substratos para a escrita, no acesso aos livros e sua conservação. A pergunta que muitos fazem é: esta tecnologia eletrônica substituirá o livro impresso em papel? Interessante é que pessoas menos avisadas, e entre elas políticos e administradores, argumentam que não é mais necessário comprar livros de papel para formar bibliotecas. Bastariam os livros eletrônicos.
No meu entender, tais argumentos são muito tacanhos. Certo, a eletrônica é uma tecnologia maravilhosa, e não é possível ignorá-la. Toda biblioteca, necessariamente, terá que se informatizar. Mas, a eletrônica apenas é mais um meio para incentivar a leitura. Jamais substituirá o livro impresso em papel.
A conservação eletrônica do livro é muito menos duradoura do que a do livro impresso em bom papel. Pessoalmente possuo alguns livros com mais de 300 anos de idade. No caso eletrônico, o substrato (CD, DVD) se conserva apenas de 5 a 10 anos.
Também a leitura do livro em papel é bem mais cômoda. Para voltar a uma página anterior, basta virar a página. No livro eletrônico, para o mesmo processo, exigem-se várias manipulações. Assim poderíamos enumerar muitas outras vantagens do livro em papel. Não me parece necessário fazê-lo aqui. Pois, não há nenhum perigo de as bibliotecas virtuais, os e-books, no futuro, simplesmente substituírem o livro tradicional, da mesma forma como a TV não substituiu o rádio, nem acabou com o cinema.
Desta forma, querer formar bibliotecas apenas com livros eletrônicos é uma grande ignorância. Sem dúvida, o livro impresso em papel ainda terá um longo futuro.
Inácio Strieder é Professor de Filosofia – Recife/PE