ESTUDO DA EVOLUÇÃO POÉTICA ATRAVÉS DO TEMPO: DE QUE SERVE A POESIA?
É tácito que desde o início do que viria a ser o que hoje chamamos humanidade, nossos ancestrais mais antigos esquadrinharam na luta pela exteriorização de suas ideias, nascia aí a comunicação. Marcada pelas primeiros agrupamentos de hominídeos, no período paleolítico e mesolítico 500.000 A.C. a 18.000 A.C., com a formação desses grupos o ser vivente foi acometido pela necessidade de se comunicar, para transmitir mensagens através de gritos, grunhidos, gestos, e posteriormente a grafia de desenhos nas paredes de cavernas (pintura rupestre). Recriando assim os seus costumes através de uma nova forma de linguagem, onde demonstrava o dia-a-dia, os ritos de caça, os símbolos mítico-religiosos dentre outras informações inerente à sua percepção do mundo.
No período neolítico 18.000 A.C. a 5.000 A.C., com maior dominância da grafia de figuras, os meios a ser utilizados para tal passaram a ser ossos, placas de madeira, pedras dentre outro. Migraram de cavernas paras pequenas habitações construídas por eles mesmos, essa mudança no meio de grafia possivelmente possibilitou a praticidade na produção e difusão das ideias que se queria comunicar. Nota-se também nesse período o surgimento das esculturas em argila, fato que permite ao homem transmitir sua percepção e ideias através de uma linguagem mais visual.
A evolução do homem enquanto ser atuante e modificante na natureza, propiciadas pelas necessidades de sobrevivência, obrigou o ser a modificar seu modo de agir, se por e apreender meios que lhe garantisse a manutenção da vida, bem como a facilitação da mesma pela obtenção de utensílios e ferramentas que lhe proporcionassem maior praticidade em suas tarefas, com isso o homem passa a dominar os metais como o cobre, o ferro e o bronze no seu cotidiano, para a produção de armas e demais utensílios domésticos, devido a isso esse período é conhecido como idade dos metais 5.000 A.C a 4.000 A.C., e é no fim dele que se considera o aparecimento da escrita, pelos Sumérios na Mesopotâmia e pelos Egípcios no Egito. O que marca o ponto transitório entre a chamada pré-história e a história.
Desde então os povos antigos se empenharam na criação e desenvolvimento da escrita e na difusão de ideias valendo-se da mesma, bem como, a comunicação visual e a comunicação verbal, muito utilizada na antiguidade. Talvez seja aí que acontece o aparecimento da poesia como forma de comunicação de pensamentos criativos, bem como a ilustração de fatos engrandecedores através da produção dos antigos épicos históricos, todos compostos duma linguagem poética para facilitar sua transmissão oral. Logicamente a escrita não seria grafada da mesma forma, sendo desenvolvidos outros meios para a documentação da mesma, passando a ser usado para isso o couro de animais, por povos como os Persas. O papiro possibilitou o desenvolvimento dos primeiros livros, e posteriormente o papel revolucionou-o, transformando em uma ferramenta difusora de conhecimento que resiste até os tempos de hoje. Assim como a escrita a escultura também evoluiu, por conta do enriquecimento da comunicação.
A poesia desde então se destaca como forma de transmissão de pensamento desejos e documentação de fatos históricos, dividindo-se e dois gêneros básicos, a poesia épica geralmente na forma de longas narrativas que retratam os grandes feitos de um povo, mencionada anteriormente, e a poesia lírica na forma de composições literárias que denotam assuntos inerentes ao eu, um retrato do mundo capitado pelas retinas da alma do poeta, usada também como engrandecimento do belo, do homem, dos mitos, dos sentimentos e da crítica. Neste período o aperfeiçoamento da escrita proporciona o surgimento de outras linguagens artísticas como o teatro. Também possibilita a documentação de relatos dos pensamentos e diálogos que marcariam o novo conceito de pensamento crítico através do rompimento com o mito, em virtude de explicações pautadas nos princípios da razão a filosofia, que até então era transmitidas por comunicação oral.
Desde então a poesia vem sendo modificada, e recriada através dos anos, resistindo aos impropérios do tempo e das mudanças comportamentais, sociais, filosóficas e políticas, acompanhando os interesses de cada geração que surgia, de cada escola literária que se desenvolvia, com um novo pensamento filosófico. A poesia oi manipulada de tempos em tempos, para melhor expressar as ideias, sendo criado para ela formas de poemas, como as canções de trova na idade média, uma forma poética produzida na forma de canções onde encontramos algumas subdivisões como as cantigas de amor, amigo, escárnio e maldizer.
No renascimento a poesia torna-se palaciana e demonstra pontos de contato com o pensamento da época, que buscava a valorização dos elementos ligados a antiguidades e o rompimento com os paradigmas da idade média, voltando-se assim como todas as produções da época para um pensamento humanista e naturalista, mantém ainda os gêneros poéticos da antiguidade, e as redondilhas, mas aparecem então os poemas metrificados chamados de sonetos, composições que necessitam de uma série de regras buscando a harmonia na obra, através de esquema de rimas e versos de dez e doze sílabas poéticas (sonetos decassílabos e dodecassílabos ou alenxandrinos) divididos por quatro estrofes, sendo dois quartetos e dois tercetos. Essa criação baseia-se na construção poética através da inteligência e criatividade, normalmente evocando elementos naturais e pensamentos humanísticos, tais como explorando o sentimento como construção poética. Posteriormente dá início ao Classicismo, como forma de pensamento e criação esse tipo de expressão tem como principais características, nesse período novas formas poéticas inspiradas nos modelos clássicos passam a ser usadas como: a ode, a elegia, a écloga e a epopeia. Suas principais características são: O universalismo, o racionalismo, o antropocentrismo, o paganismo, e a referência à cultura grega.
Posteriormente a isso, acontece a tentativa de recriação dos antigos conceitos religiosos, pelos artistas ligados ao cristianismo, buscando mais uma vez o rompimento com os padrões e símbolos clássicos. O homem dessa época vivia em constante desequilíbrio, entre as coisas divinas e terrenas, descarregando sobre a poesia uma roupagem voltada ao culto exagerado da forma, à sobrecarga de figuras como a metáfora, a antítese e a alegoria. Buscando expressar as ideias ligadas ao divino, é marcada pela dualidade entre o homem e deus, o pecado e o perdão, a luz e a escuridão, o material e o divino, estes dilemas perturbaram demasiadamente o homem do século XVII, a arte assume uma postura marcada pelo exagero e o rebuscamento formal. Destaca-se a poesia cultista ou gongórica, marcada pela linguagem culta e extravagante, rebuscada a ponto de originar uma poesia que beira a obscuridade das ideias devido aos jogos de palavras e pela valorização dos pormenores.
Com a revolução burguesa o pensamento filosófico passa por mudanças severas, como a criação dos pensamentos iluministas, que rompiam mais uma vez com a religiosidade, pondo-a a um segundo plano. Basicamente pode-se afirmar que é o rompimento com a arte cortesã praticada desde o renascimento, que teve seu declínio devido ao cansaço do público com os exageros da estética barroca, em contrapartida, uma nova arte era produzida, uma expressão pautada na subjetividade. A arte produzida pela burguesia em ascensão. Com o crescimento econômico desta nova classe, a mesma passa a lutar pelo poder, detido até então pelos monarcas e religiosos, dá-se início a uma das revoluções sócio-filosófica mais representativa da história. Sendo essa revolução refletida na nova produção artística denominada de Arcadismo, esse estilo cultua o “bom selvagem” (O homem nasce bom, a sociedade o corrompe - Rousseau) e busca novamente a pureza e a simplicidade da forma clássica, unidos a novos valores de liberdade. Sua principal característica é a relação entre a arte e política, e a arte como difusão de ideais políticos e filosóficos. Esses pensamentos deram origem à Revolução Francesa.
No fim do século XVIII se dá a origem do romantismo, marcado pelo rompimento dos conceitos classicistas e a retomada dos modelos da idade média, porém marca definitivamente o rompimento da arte com a classe dominante, para aderir a essa uma maior atuação popular, tanto na produção quanto no consumo. Põe o homem no centro de sua inspiração voltando-se para a imaginação e sentimentos, resultando assim em produções marcadas por interpretações subjetivas da realidade. Cresce nessa época o sentimento de nacionalismo, buscando um retorno no passado histórico e a criação dum herói nacional, desenvolve-se com concomitantemente à revolução industrial, e sua poética é caracterizada por versos livre (sem métrica e estrofação) e versos brancos (sem rimas), procurando dar destaque à inspiração como principal meio de produção, se desvinculando dos padrões e normas estéticas do modelo clássico. Os românticos propõe a volta ao catolicismo medieval através da construção de grandes catedrais no estilo gótico, onde a grandiosidade é celebrada através do faustoso, da pompa de sua arquitetura como admiração da grandeza de Deus. Sua poética é marcada pelo sentimentalismo, o niilismo, pelo subjetivismo, e à medida que a busca dos valores pessoais se intensifica, com o culto do individualismo e pessoalismo, perde-se contato com o coletivo, o que gera o egocentrismo, por sua vez o choque de realidade entre o mundo real e o mundo interior do poeta, gerando a derrota do ego, um estado de tédio que conduz a evasão, através da fuga da realidade pelo álcool, ópio, e da maior de todas as fugas a morte. Divide-se em três gerações a indianista (exaltação da natureza, da pátria e a criação do herói nacional), mal-do-século (egocentrismo, negativismo, pessimismo, dúvida, tédio, fuga da realidade e exaltação da morte.) condoreira (termo relativo ao símbolo da liberdade adotado pelos jovens românticos o condor – suas características é a poesia social e libertária).
Com as novas tendências sociais, políticas e filosóficas do fim do século XIX e início do século XX, nasceram dois estilos literários paralelamente, o Realismo e o naturalismo, ambos concentrados na análise social, e na representação dos problemas inerentes à realidade cotidiana, porém o primeiro se baseava na analise do homem como ser atuante da sociedade, dando destaque ao homem da classe dominante e sua relação com o mundo, já o segundo analisava o homem a partir do grupo, e tem como ponto central as classes menos favorecidas. A expressão poética dessa época se deu através do Parnasianismo, estilo que busca a reforma da poesia produzida pela intelectualidade essa estática surge no final da década de 1870 mantendo-se até o início do modernismo em 1922, a poesia assume uma posição oposta à poesia romântica, através da objetividade e do culto à forma, como tentativa de negar o pessoalismo, a fim de atingir a impessoalidade, entrando em contato novamente com os assuntos sociais, basicamente retorna ao racionalismo e às formas perfeitas, que são características principais na poética dos moldes clássicos. Surge então a poesia de meditação filosófica. Tem como principais características a poesia de forma fixa como os sonetos, a rima rica, rara e perfeita.
Na transição do século XIX para o XX, nasce a poesia Simbolista, em primeiro momento é visivelmente um repúdio às manifestações realistas, pois rejeita o cientificismo, o materialismo, o racionalismo, valorizando em contrapartida as manifestações metafísicas e espirituais, ou seja é a evidente negação ao naturalismo e ao parnasianismo. Mais uma vez o poeta se volta para a realidade subjetiva, fechando seus olhos ao mundo objetivo, retomando os antigos aspectos do romantismo. O eu passa a ser novamente o centro do universo, porém não o mesmo eu sentimentalista do Realismo, buscando o eu como essência do ser, ou a conceituação da essência como a alma, o simbolismo é a busca pela sublimação etérea, os poemas simbolistas são marcados por um ritmo bem definido que beira a musicalidade.
No início de 1900 a poesia busca um novo rompimento com o passado com um período denominado pré-modernismo, essa ruptura se dá através, do uso de palavras consideradas não poéticas uma afronta ao parnasianismo, e do Academicismo, são presentes também características como a denúncia da realidade, regionalismo, tipos humanos marginalizados, e assume estreitas ligações com os fatos políticos, econômicos e sociais. Esse período durou até 1922 quando teve início as tendências modernistas, o modernismo marca a ruptura definitiva com o passado, buscando o “novo” como combustível para a produção artística, uma nova visão do mundo, uma nova visão política, uma nova visão nacional, enfim o novo era a palavra de ordem. De 1922 a 1930, a poesia passou por sua revolução mais marcante uma revolução radical, que proporcionou o rompimento com o mundo passado, em virtude da criação duma nova poética, chega a ter certa característica anárquica, e disseca as possibilidades criativas, explorando toda a extensão e sentido das palavras. Dá-se início a busca pelo moderno, o original e o polêmico, divide-se em frentes nacionalistas diferentes uma é o nacionalismo crítico ligado com a esquerda e a outra é um nacionalismo ufanista e fascista ligado com corrente política da extrema direita, a política nunca foi tão viva na poesia como na poesia modernista, o modernismo é dividido atualmente em três momentos.
Após o período modernista, poesia se modifica, e hoje ganha novas formas, e meios de difusão, a aliança com a tecnologia permite a popularização da arte como um todo, bem como acontece com a poesia, na forma do surgimento de novos poetas, que apostam no mundo virtual, como forma de produção e divulgação de suas obras. Aparentemente não possui características, bem definidas, unindo os conceitos e técnicas das escolas e estéticas anteriores, com a linguagem atual e o dinamismo do mundo globalizado, é utilizada como expressão tanto do eu como do social, estabelecendo para si uma enorme flexibilidade de temáticas. Hoje, porém parece que a poesia perde espaço, e o questionamento sobre sua serventia volta a ser necessário, se lançarmos um olhar para toda a transformação que vem sofrendo até os dias de hoje, veremos que há uma espécie de inanição dos valores poéticos, e a passionalidade da própria poesia, que aparentemente não mantém d’outrora, o aspecto agitador, de reconstrução do eu e do social, de definição de pensamento político, de difusão de pensamentos, de denúncia da realidade e até mesmo de linguagem artística modificadora da realidade. A poesia é vista com indiferença por muitos, mas é notável que há uma revolução silenciosa, uma produção que busca uma nova tendência através de questionamentos das escolas passadas. A poesia no mundo de hoje, apesar de subjugada e relegada à escuridão do esquecimento e desvalorização, deve ser usada para expressar, todos os tipos de realidades, todos os tipos de gritos, deve ser pessoal, coletiva e política, ao mesmo tempo em que busca a criação de sua nova identidade. A poesia no mundo contemporâneo reencontrar o seu resplendor através da retratação das diversas realidades existentes, não apenas exteriorizar o que é o indivíduo, mas também para condenar as atrocidades geradas pelo controle duma elite invisível, mas poderosa, serve e mais do que nunca para gritar contra a tirania, propor uma revolução intelectual, e a proposição de novas realidades mais justas, a poesia serve para dar voz ao homem popular, serve para desarticular os alicerces da diferença e da injustiça. A poesia serve de libertação das correntes invisíveis.