ADEUS ÀS ARTES

ADEUS ÀS ARTES

Heribaldo de Assis

Recentemente o apresentador Ronnie Von comentou em seu programa que atualmente para gravar um CD o cantor precisa ser milionário - pois, se quiser por um novo projeto musical no mercado fonográfico, vai precisar pagar a gravação, a prensagem e a distribuição do CD.

Concomitante, no mercado editorial brasileiro, novos escritores não encontram oportunidade de lançarem seus livros de maneira impressa – as editoram optam pela publicação de livros de autores famosos: mesmo que estes livros fiquem encalhados nas prateleiras das livrarias (o que comumente ocorre)...

Propus (em gestões diferentes) a três Ministros da Cultura a criação da Editora e gravadora governamental pública – que seria uma forma de estabelecer uma ponte entre o compositor, o escritor e as grandes empresas brasileiras do mercado fonográfico e editorial (além disso a Editora e gravadora governamental pública iria gerar emprego e renda através dos livros e CDs lançados e ainda revelar novos talentos).

Esses novos talentos não precisariam competir com artistas famosos – artistas famosos que constantemente são contemplados pela Lei Rouanet, pois os empresários preferem patrocinar artistas com visibilidade na mídia e assim economizarem com publicidade.

Mas, por três vezes minha idéia não foi aceita: nem sei ao menos se meu Projeto ficou nas omissas mãos dos burocratas ou se realmente foi repassado para a devida análise dos Ministros da Cultura. A Editora e gravadora governamental pública também serviria para evitar o desvio de verbas - pois o dinheiro seria realmente utilizado para proporcionar a autores e compositores a viabilização de um projeto editorial ou fonográfico de qualidade - a escolha dos Projetos atenderia unicamente ao critério qualitativo (não haveria apadrinhamentos ).

Antigamente, no Brasil, bastava apenas ter talento para concretizar um novo Projeto musical através de uma gravadora ou publicar um livro por alguma grande editora - mas ,atualmente, tornou-se apenas uma questão de ter dinheiro, sobrenome ou apadrinhamento... Enquanto isso compositores enviam músicas inéditas e de qualidade para as gravadoras do nosso país – músicas que jamais serão escutadas, analisadas. Enquanto isso novos autores enviam seus livros inéditos e de qualidade para as editoras – livros que jamais serão lidos, analisados...

Ao compositor e escritor desconhecidos não é sequer dada a oportunidade de terem seus projetos fonográficos e literários analisados - parece que enviar músicas e livros inéditos para a devida apreciação das gravadoras e editoras tornou-se um insulto...

Se Miguel de Cervantes tivesse nascido no Brasil e vivesse nos dias atuais provavelmente jamais iria publicar Dom Quixote de La Mancha – um dos mais belos romances da Literatura Universal.O mesmo aconteceria com Fernando Pessoa – não publicou um livro em vida e, nem mesmo depois de morto teria as suas belas e filosóficas poesias publicadas caso tivesse nascido no Brasil do século XX.

Similarmente aconteceria o mesmo com o compositor e cantor italiano Sergio Endrigo - se fosse apenas um pobre brasileiro desconhecido vivendo nos dias atuais dificilmente iria gravar suas belas canções - tão pior quanto o desperdício de alimentos é o desperdício de talentos...

Infelizmente esse monstruoso desperdício de talentos ocorre devido a omissão do governo brasileiro, a insensibilidade do Ministério da Cultura e o tendenciosismo das gravadoras e editoras (que preferem analisar a fama de um artista e não a qualidade do seu novo Projeto!).

O resultado é que a mediocridade fonográfica e literária tomou conta da cultura brasileira: músicas com letras de péssima qualidade e livros que não merecem estar ao lado de obras como Vidas Secas (do escritor Graciliano Ramos) e nem de Broquéis (do poeta Cruz e Souza).

Portanto, o Brasil não está apenas assassinando pessoas - mas também o sonho de vários artistas que almejam sobreviverem dignamente através dos frutos de suas artes...

Mas, no Brasil viver dignamente é apenas para os corruptos – um inculto país no qual é muito mais fácil ficar famoso cometendo crimes do que tentando publicar livros ou gravar músicas...

*Escritor, poeta, filósofo, Redator-publicitário e Licenciado em Letras pela UESC – Universidade Estadual de Santa Cruz. E-mail: herisbahia@hotmail.com