Eu Coordenador e o Eu de Augusto
Estando na condição de Coordenador de Literatura & Memória Cultural, perguntaram-me o que a Fundação Espaço Cultural da Paraíba (FUNESC) pretende fazer a comemorações dos cem anos de edição do livro “Eu & outras poesias”, do poeta Augusto dos Anjos. Digo que estamos em avaliações dos resultados da 30ª Semana Cultural José Lins do Rego, ocorrida de 3 a 6 de junho, embora já pensando no que fazer e contatando parceiros – artistas, colegas de outros órgãos públicos ligados à Cultura, a Educação & empresários – interessados em participar.
Embora eleito Paraibano do Século por um plebiscito que o apresentava candidato a tal, entre outros, são poucos os que conhecem o clima da poesia augustiana, inspirada nos ditos do filósofo alemão Schopenhauer, que também iniciou Augusto dos Anjos no pensamento oriental budista, fontes de inspirações frequentes a expirações de toda verve lúgubre do poeta que, como vermes de cadáveres putrefatos, brotava da alma de Augusto ao escrever – ou descrever? – “seu” Eu mais íntimo.
É justamente aí que resida a razão do “desprezo” dado pelos contemporâneos de Augusto dos Anjos a sua poesia, uma vez que é sempre muito difícil despertar o interesse das pessoas sobre livros que não apenas são um tanto herméticos, do ponto de vista gramatical & artístico literário – quem sabe o que é “pólipo”, ou “moneras”, ou “orográfica”? – mas que também tratam de assuntos sobre que a maioria nada sabe ou quer saber. No caso de Augusto, sobre a Morte (que o perseguia e que prematuramente terminou por levá-lo) e, a partir de sua perspectiva, sobre a inutilidade ou, na melhor das hipóteses, o desperdício da Vida então encarnada como fera pré-humana obrigada a viver ainda relações desumanas.
Mas talvez exagere ao estimular imaginação do leitor usando imagem tão vermífuga escatológica a referendar o universo anímico do poeta Augusto dos Anjos – maltratado pelos poderosos de seu tempo, que não o apoiaram em reconhecimento de seu talento e de sua necessidade de apresentar-se fora da Paraíba, no Rio de Janeiro – onde se interessaram em publicar seu primeiro (e único) livro – obrigando-o a ser um dos pioneiros a abandonar a Paraíba em busca daqueles que, bem longe dela, sabiam apreciar sua obra.
Para não ser tão lúgubre, talvez devesse dizer que a verve poética de Augusto dos Anjos brotava de sua alma como borboletas de crisálidas ao gozo de uma nova vida, ao invés de como vermes em carne podre. Porém, de fato, não seria a imagem apropriada à descrição do angustiado universo de Augusto.
No bojo das razões de seus poemas, sobrevoados por urubus, cortados por tesouras, percebemos suas preferências a considerar, inspirados por outros “malditos”, a “certeza” de que, depois do pó em que a borboleta e tudo se transformar, haverá tão somente o nada para onde as sombras que são “nossos” eus irão, depois que sofrerem em vida a insana & inútil cotidiana violência da mão que afagava e, depois, apedrejava e os escarros dados por bocas que beijaram.