Espetáculo da Tragédia

É impressionante o poder da mídia de tornar as coisas muito maiores do que realmente são. Vários casos poderiam ser citados, mas, gostaria de me limitar ao de Isabella de Oliveira Nardoni, a garota de cinco anos que morreu após ter sido jogada do sexto andar de seu prédio em São Paulo e cujos principais suspeitos são seu pai, Alexandre Nardoni, e sua madrasta, Anna Carolina Jatobá. Desde 29 de março, o sábado no qual o crime teria ocorrido, nenhuma emissora de televisão brasileira passou mais de dois dias sem ao menos citar o caso, que também ganhou destaque em rádios, jornais impressos e principalmente a internet. Será que isso tudo é necessário e, principalmente, ético?

Não há nada de errado em aprofundar fatos importantes, mas, nesse caso, a coisa chega ao absurdo de, na TV, emissoras apresentarem semanalmente tudo o que já foi mostrado apenas para trazer “novidades” pouco relevantes. Entre elas, a tesoura e a faca utilizadas para cortar a grade da janela de que Isabella foi atirada, ou, quais familiares ou pessoas próximas negaram-se a dar entrevista. Também não é raro ouvir comentários sobre o caso em programas destinados à culinária e outros temas sem nenhuma ligação com o crime. Ainda na TV, mas também no rádio, emissoras diferentes entrevistam familiares como Ana Carolina de Oliveira, a mãe de Isabella, e Antonio Nardoni, pai do acusado Alexandre, e fazem as mesmas perguntas pouco necessárias, tais como “Você sente a falta dela?”.

Na internet, onde as coisas são mais fáceis de serem veiculadas, é ainda mais pesado. Nela, podemos encontrar desde pessoas sem nenhum conhecimento comentando o caso em blogs, até alguns indivíduos falando sobre a forma como teriam cometido o crime para que não fossem descobertos.

A morte de Isabella já ultrapassou há muito tempo, nos meios de comunicação, os limites do jornalismo de informação e interpretação. Está muito mais próxima do espetáculo, do entretenimento, do dito jornalismo “suflê”, ou seja, com conteúdo murcho. Muito provavelmente, se não fosse a maneira como o caso foi tratado, a população não teria se indignado da mesma forma e nem feito campanhas nas ruas e comunidades em sites de relacionamento pedindo por “justiça”. Ou seja, a reação das pessoas contra os acusados é obra da mídia, e não do crime em si.

Não quero, com o que digo, tirar a importância da crueldade com a qual Isabella foi morta, mas, e quanto às crianças das comunidades pobres, que levam uma vida muito mais difícil do que a de Isabella e morrem de formas também cruéis por causa do intenso tráfico de drogas? Por que os meios de comunicação não dão a mesma cobertura a esses casos? Talvez seja porque realmente considerem a morte de Isabella muito mais brutal, ou, isso pode representar uma mídia excludente, que trata a morte de forma distinta em diferentes classes sociais.

Este tipo de jornalismo não é desejável e é nesse momento em que os novos jornalistas e os estudantes devem refletir sobre como irão tratar os fatos durante sua carreira.