Consciência de Ator
O que separa o ator do personagem? Um ator empresta o próprio corpo e voz ao seu personagem, mas deve manter-se consciente como ele mesmo. É essa consciência que o permite lembrar de texto e marcações, improvisar se algo der errado e outros detalhes técnicos extremamente importantes para o bom andamento da trama encenada e ao mesmo tempo, ele deve ter a consciência do personagem... Aquela que sente, que vive a situação da peça, que tem sua própria história e experiências de vida. Mas o que os separa? São dois seres distintos. Um com toda a sua vivência pré-definida pelo autor da obra e outro que escreve sua própria história de vida todos os dias. A arte pode transformá-los em um só ser, ainda que individualmente. Confuso?
Se a consciência do ator e a do personagem devem estar em alerta simultaneamente e o tempo todo, então a linha que separa ambas é extremamente delicada. É como a linha do Equador, os Trópicos ou Meridiano de Greenwich... Linhas imaginárias! Divisões invisíveis, porém eficazes. Limites imensuráveis. Não podemos ver, nem tocar, mas sabemos que existem e estão lá demarcando.
Um ator que vive um vilão em uma novela corre o risco de ser xingado ou até apanhar na rua. A individualidade do ator é confundida com a do personagem. E não é à toa, já que aquela linha imaginária que os separa é tão tênue.
Não é de se admirar que existam histórias de atores que enlouqueceram. Que se viram tão inseridos no íntimo do personagem que se esqueceram de si próprios. Ainda que possam ser apenas histórias fantasiosas, não é mesmo algo para se pensar? Será possível um ator esquecer completamente de si mesmo e passar a viver a vida do personagem? Será que em algum momento as duas consciências podem deixar de coexistir e apenas uma imperar? Um ator pode deixar de existir como ele mesmo nem que seja por um segundo? E seguindo a lógica de que o personagem só se torna físico com o auxílio de um ator, poderia ele existir verdadeiramente por conta própria? Se o ator empresta o corpo e a voz ao personagem mantendo sua própria consciência, então realmente há limite entre os dois. E esse limite deve ser respeitado! Se o personagem morre, morre sozinho... O ator permanece vivo!
O ator deve convencer o público de que sente pelo personagem, mas não deve “sofrer” por ele. Se o personagem leva um soco e tem o nariz quebrado, o ator usará de artifícios para convencer que está sentindo a dor de ter o nariz quebrado. Ele não irá quebrar o nariz de verdade. O ator deve convencer, transmitir verossimilhança mesmo sem o uso de artifícios. Outro exemplo, uma atriz pode fazer o público acreditar que está sentindo contrações de parto sem sequer estar grávida. A intenção do ator de transmitir a verdade deve obter sucesso sem que ele precise “sofrer as consequências”. Um ator deve ser capaz de sentir pelo personagem sem que seja necessário sentir na própria pele, sentir por sua individualidade e consciência. É isso, é isso que os separa!