A LIÇÃO DO POVO JÊJE E A SAUDAÇÃO AOS VODUNS, POR ANTONIO JORGE MOURA
Diz a tradição oral do povo negro baiano e brasileiro que, por volta do século XVI, um "ajuntamento" escravos rebeldes refugiou-se nas matas de onde está localizado hoje o Engenho Velho da Federação. E deu início a um povoamento, dentro da mata, que ficou conhecido como Bogum.
Eram todos oriundos do leste da África, de uma região que ficou conhecida pelos colonizadores portugueses como Dhaomé, território da atual República do Benin.
Os negros do povo jêje da Bahia juntaram-se aos revoltos da chamada e historicamente conhecida Revolução dos Alfaiates - primeira tentativa de proclamar-se a independência do Brasil, tal como acontecera na proclamação bem sucedida da independência do Haiti pela população afrohaitiana.
Os jêje baianos eram notáveis pelo conhecimento da leitura, da escrita e do Alcoorão. Hoje, a única lembrança histórica desse fato que marca a vida do Engenho Velho da Federação é o nome oficial da Ladeira do Bogum - ligação da Vasco da Gama com o Engenho Velho -, que leva o nome de Ladeira Manoel Bonfim, um dos revoltosos da Revolta dos Alfaiates, executado na Praça da Piedade - enforcado e esquartejado, para servir de exemplo - pela Coroa Portuguesa.
Apesar da distância histórica e da difícil vida dos despossuídos da Bahia e do Brasil, o povo Jêje prossegue sua saga no Engenho Velho, antes sinônimo de samba-forró nos festejos juninos e hoje conhecido pela violência urbana de Salvador.
E, como fazem todos os anos, os remanescentes da tradição trazida do Benin se reúnem no Terreiro do Bogum, se reúnem a partir do dia 21 de dezembro próximo, um domingo, para reverenciar seus "encantados" e manter viva a tradição Jêje no Brasil.
Tudo começa com uma reverência ao sincretismo religioso da Bahia, com uma missa solene que a comunidade manda celebrar no Rosário dos Pretos, no Pelourinho, às 9hs. Depois da missa os "santos" católicos do Bogum se reúnem na porta da Casa Branca e sobem em procissão a Ladeira Manoel Bonfim.
A procissão chega ao final de linha do Engenho Velho, contorna a Praça Mãe Runhó e entra, sob salva de foguetes e a "presença" dos "encantados" junto às "vodunces", no salão principal do Terreiro.
Quando os atabaques soam e os sons religiosos se misturam ao som de artistas como Luizinho Jêje, Kainã, Peu Meurray e outros que buscam inspiração no Bogum para continuar a saga do povo Jêje.
O Bogum é espaço religioso de personalidades como o advogado Jackson Azevedo. Como foi do jornalista Jeová de Carvalho, já falecido. E onde o jornalista Tasso Franco foi buscar força para escrever o livro "Gêmeos da Catalunha". Trata-se de um matriarcado escolhido pelos "encantados".
Como já foi Mãe Runhó e a Doné Nicinha, hoje quem reina é a Nadoji Índia, indicada através dos búzios do Professor Agenor.
Nadoji Índia, atual líder religiosa do Bogum e sucessora da Doné Nicinha, foi incorporada recentemente ao Conselho Religioso da Universidade Estadual da Bahia (Uneb), ao qual foi incorporado também João Jorge, do Olodum, Vovô, doi Ilê, e Mãe Carmem, do Terreiro do Cobre, localizado também no Engenho Velho da Federação".
Diferente das tradições keto (orixá) e angola, os Jêje reverenciam mos voduns, como são chamados os "encantados" na língua fon. E os nomes dos "encantados" da nação não são tão populares quanto os dos orixá.
Depois da missa do dia 21, começa o ciclo de festas com as Águas de Olisá, madrugada do dia 31/12 para 01/01. A festa pública de Olisá será 04/01. Em seguida vem a festa de Azonwônodô, dia 06/01; de Gbessên, dia 11/01; de Lokô, dia 18/01, de Gú, Agangatolú e Ágüe, dia 20/0-1; de Kavine, dia25/01; de Tobossi, dia 01/02; de Hoho, dia 04/02; e Azonsú, dia 08/02; O ciclo é encerrado dia 10/02 coma festa de Alugbagê.
Salve os voduns do Bogum e do povo Jêje