A redação do vestibular

A REDAÇÃO DO VESTIBULAR

A prova de redação do vestibular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul apresentou uma verdadeira armadilha aos candidatos, capaz de confundir lingüistas e filósofos. Os pobres vestibulandos saíram desorientados, tal a complexidade da prova, que requeria bases acima das que eles possuíam.

Um amigo, pai de um jovem que concorreu a uma vaga na Engenharia, sabendo que sou do ramo, me escreveu sobre o assunto. Como temos as letras como pólo de afinidade, pediu meu parecer, já que sabe que sou escritor, e organizador de “oficinas literárias”, alguém que “gabaritou” as redações nos três vestibulares que prestou.

Na elaboração de uma prova de redação deve ser aferida a capacidade que o candidato tem de redigir, para ser burilada posteriormente na universidade e não saiam futuros profissionais que cometam atrocidades contra o vernáculo como se enxerga por aí, em receituários, petições ou memoriais descritivos.

Na formatação da redação da UFRGS deste ano não quiseram saber se a gurizada sabia compor um texto com começo (introdução), meio (desenvolvimento da idéia) e fim (conclusão), mas, quem sabe uma represália à juventude que não lê ou aos “cursinhos” que são superficiais nessa área. O pessoal sempre se acostumou a temas banais, dos jornais do ano inteiro, ou então como era no passado, quando inseriam nas redações o nome do cachorro do Fantasma ou do cavalo do Zorro.

O idioma é uma tradição viva, a única verdadeiramente viva, concentra em si, indistintiva e naturalmente, um conjunto de tradições, de maneiras de ser e de pensar, uma história e uma lembrança, um passado que só nele pode reviver. O pessoal confundiu língua com idioma. Tem países (o Canadá e o Paraguiai, por exemplo) que tem mais de uma língua e não tem um idioma.

O idioma agrega as tradições sempre em mutação, enquantoi a língua é um sistema de representação através de palavras e regras. O verbete idioma tem no grego a idéia de algo próprio, particular. A inserção da metáfora de Adamastor, um gigante mitológico citado por L. Camões em “Os lusíadas” (canto V) é sinônimo de obstáculo a ser superado, como o foi por alguns navegadores, no caso “o ilustre Gama”.

O nosso idioma é, antes de tudo, uma entidade social que, como tal, se movimenta através do tempo e adquire novas configurações, edificando sua história. Assim, é certo que os países lusófonos, cada um tem sua língua, que são diferentes – embora algumas tentativas de unificação – em vários aspectos do idioma falado no Brasil.

Assim mesmo, acho que a prova de redação de 2012 vai estabelecer um divisor de águas, entre a superficialidade e o aprofundamento.

Filósofo e escritor