A BELA ARTE DE ESCREVER
Tenho companheiros de copo, talvez até amigos que escrevem e ficam com aquilo na gaveta, quem sabe até na memória e não tem coragem de publicar. Lembro de meus primeiros rabiscos e também tinha certa relutância em tornar minha suposta obra de conhecimento público. Ontem, num desses dias em que a gente quer dar adeus ao mundo, um deles, de nome “Vatote”, vulgo Álvaro, perdeu amor ao seu próprio umbigo e me entregou uma folha onde estava escrito essa obra prima:
“A escrita deve ser inteligível, clara e franca
Deve ser alegre, sem ser frívola
Precisa mostrar firmeza, porém, sem ser inflexível
Deve agradar, sem, no entanto, bajular o leitor
Tem que servir sem ser servida
Precisa, concisa, correta, a escrita quer ser
Quer ser ainda, a chave de ouro que abre a porta para as mentes e corações
Uma vez lançada, já não se pode recolher, não mais tem um dono – é de todos os que a possam amar
Carece a nossa estrela, de carinho, pois é muito suscetível
Necessita, como a pequena planta, de desvelo e cuidados de mãe
Não admite grosserias, nem aceita ser tratada com desdém
Os que a utilizamos, devemos dela nos afastar para que melhor a possamos concluir.
Como o bom pedreiro, necessitamos de alguns instrumentos que nos auxiliem – réguas, compassos, e que tais. Se queremos a nossa “parede” (palavras são tijolos), além de forte, bela; além de útil, também é arte.
Assim possamos, quem sabe? Os que nos metemos a escrever (que somos muitos), fazê-lo com amor, com cuidado; com atenção que têm os que conduzem uma criança pela mão....”
JOSÉ EDUARDO ANTUNES