Nosso chão
Entre as desejadas potencialidades naturais do Brasil e as pesquisadas mazelas sofridas pelo seu povo há uma riqueza pouco valorizada e explorada: a sabedoria que nasce do nosso chão, concebida na prática da vida. Muitos mestres estão espalhados pelo país, construindo, na peleja pela sobrevivência, na poeira que o viver levanta, um fecundo chão de saberes.
Na intenção de conhecer como vivem e pensam esses mestres, decidi iniciar, no Vale do Jequitinhonha, Nordeste de Minas Gerais, uma incursão à sabedoria brasileira. Viajei com a ideia de, lá, poder ser uma garimpeira. Não fui explorar os recursos minerais do rico solo da região, mas o mundão de possibilidades que brotam do chão humano. Durante as três semanas de minha passagem pela região, conheci gente de muito saber em Araçuaí, Berilo, Chapada do Norte e Diamantina.
Ao tentar garimpar as riquezas de suas percepções, comecei a perceber que é de troca e convivência que o chão se alimenta. Ele é formado por gente e não por deuses. Seu Antenor, um dos fazedores com quem conversei, ensina: “Deus é um sozinho que tem”. No chão, ama-se e se é amado, acolhe-se e se é acolhido, dá-se e recebe-se, perde-se e ganha-se: nele se vive! E com abundância. Nas prazerosas conversas que tive com os fazedores, comecei a compreender: o aprender e o ensinar é uma peleja constante e comum a todos.
Voltar os olhos para o nosso chão pode ser uma experiência reveladora. É que, quando nos limitamos às alturas, deixamos de enxergar, nas sutilezas e miudezas que ensinam vida, a grandeza que tanto procuramos no alto. Colocando os pés na nossa terra podemos descobrir o nosso chão, o chão do Brasil e, mais do que isso: podemos ter um valioso guia na aventura que é o viver.