O BRINCO NA ORELHA.
Carlos Sena
Faz vinte e cinco anos que uso brinco na orelha. Quando minha mãe me viu com ele pela primeira vez, quase que desmaiou; quando meus amigos me viram com o adorno me disseram poucas e boas, inclusive que eu era veado (é assim que se chama no Nordeste, embora hoje “GAY” já esteja também em uso). Na sala de aula meus alunos cochichavam, riam baixinho. No ônibus, via claramente algumas pessoas cutucarem as outras apontando em minha direção.
Passados alguns anos precisei tirar o brinco por algum motivo. Chegando à casa de mamãe ela foi logo dizendo que eu estava diferente. Chamou as minhas irmãs e lhes perguntou se não achavam que estava faltando alguma coisa em mim. Logo concluíram que eu estava sem o brinco. Mamãe não titubeou: “cuide logo de botar o brinco, ele já faz parte de você”!
Hoje, após esse tempo todo, se meus amigos pensam que continuo sendo veado, não sei, pois me garanto do que sou. O grande detalhe é que os filhos deles usam mais de um brinco em cada orelha, fazem a sobrancelha, maquiam-se, fazem unhas, pés, usam tatuagem, mas são machos.
Eu poderia fazer a revanche, mas sei que revanchismo não leva a nada, até porque não creio que os meninos sejam veados. Se eu quisesse utilizar a mesma medida que os pais deles usaram pra mim eu tinha que dizer que eles são TRAVESTÍS ou coisas do gênero. O conjunto de adornos e penduricalhos que utilizam é infinitamente mais sintomático de sexualidade duvidosa do que um simples brinco na orelha. Mas como dizem na minha terra “é muito bom ser fresco com o “C” dos outros”...