De volta ao melhor dos mundos, umas cândidas reflexões
O grande filósofo alemão Gottfried Leibniz pretendia ter provado que vivemos no melhor de todos os mundos possíveis.
Sua argumentação teológica baseava-se em duas premissas básicas:
1)Deus é onipotente.
2)Deus é infinitamente bom.
O poder inimaginável de Deus seria suficiente para gerar qualquer coisa que Sua mente vislumbrasse, qualquer mundo com que sonhasse.
Como Deus seria também infinita bondade, certamente desejaria construir, não um mundo qualquer, mas o melhor dos mundos possíveis.
Assim sendo, argumentava Leibniz, Deus não poderia ter criado outro que não o melhor de todos os mundos possíveis!
Voltaire, um francês insubordinado, refutou a argumentação irrepreensível de Leibniz, não com argumentos, mas com uma obra-prima da ficção filosófica. Imaginou um personagem, Cândido, que levado por candura e ingenuidade extremas, mete-se em sucessivas desventuras sem nunca duvidar dos ensinamentos otimistas do alemão. Seus constantes infortúnios acarretam-lhe uma vida desgraçada, cuja tragédia só é posta a termo com sua morte.
Por um tempo acreditei que tão inusitada e contundente refutação da argumentação de Leibniz era definitiva, mas minha própria candura me faz ressuscitar a absurda tese.
Relembro a tristeza do replicante, ao término do filme “Blade Runner, o caçador de andróides”, quando em meio a lágrimas profusas que se diluem na chuva torrencial, rememora momentos importantes e inesquecíveis de sua vida emendando-lhes a queixa: ...todos estes momentos estão perdidos no tempo... como lágrimas na chuva. Hora de morrer. E em seguida perece.
Talvez todos os sofrimentos, todas as desgraças, sejam apenas um modo de engrandecer o mundo. Vistas com o necessário distanciamento, todas as tragédias acabam por ostentar a mesma beleza triste que buscamos em suas representações teatrais ou cinematográficas.
Talvez a tristeza insuperável dos infortúnios seja apenas falta de distanciamento, apenas uma incapacidade no olhar. Talvez todos os fatos, mesmo os mais fúnebres e tristes, ocorram para o engrandecimento do mundo.
A mesma sabedoria que necessitamos para contemplar as tristezas inevitáveis, no entanto, deve ser empenhada na busca constante da felicidade.