O CORÃO SAGRADO
Nestas últimas semanas estiveram em destaque referências ao livro sagrado dos muçulmanos: o Corão. Muitos o intitulam inadequadamente de “alcorão”, pois o “al” nada mais é do que o artigo “o”. Estamos, portanto, falando do Corão (Quran, para os árabes!). Mas, por que ele é sagrado? O termo “sagrado”, etimologicamente, se originou da palavra latina “sacer”, que significa separado. Desta forma, afirmando que o Corão é um livro sagrado, reconhecemos que ele não é um livro comum, mas um livro que merece um destaque especial, um livro com um sentido e uma finalidade diferentes do de outros livros. Segundo o próprio Corão, este livro contém uma mensagem divina para os povos árabes, comunicada pelo Anjo Gabriel ao Profeta (admoestador) do povo, em língua árabe, Mohammad (Maomé). O Anjo Gabriel, que se comunica ao Profeta Mohammad em Makka (Meca) e em Madina (Medina), é o revelador da vontade do Deus único, sob o nome de Allah. Esta vontade de Allah é expressa pela palavra Islan. Aderir ao Islan é submeter-se e obedecer às revelações de Allah e sua vontade, que estão registradas no Corão. Desta forma, todo aquele que se submete à vontade de Allah, e conforma sua vida com ela, se torna islamita (muçulmano). E o muçulmano assumido encontra seus princípios de fé e de vida nas 114 suras (capítulos) do Corão. Assim, o Corão é o livro supremo de todo muçulmano. Mas isto não significa que, antes do Corão, Allah (Deus) não tenha enviado mensagens aos homens, através de admoestadores (profetas). O Corão se entende como a última e definitiva mensagem de Deus(Allah) aos homens, que complementa as mensagens anteriores, especialmente manifestadas na Bíblia dos judeus (denominada por Mohammad de “O Livro”), e nos Evangelhos dos cristãos. Acontece, porém, que grande parte dos judeus como grande parte dos cristãos são infiéis às mensagens de seus livros sagrados, segundo afirmações do Corão. Os judeus e cristãos, por seu lado, criticam os muçulmanos de também não seguirem adequadamente os ensinamentos do Corão. O Presidente Barack Obama, inclusive, adverte que os americanos não estão fazendo guerra contra o islan, mas contra os terroristas que falsamente alegam seguirem o Corão. O Corão se apresenta como contendo a autêntica proposta de fé e de vida revelada por Deus (Allah) no Livro (a Bíblia judaica) e nos Evangelhos do cristianismo, completando-os de forma definitiva. Por isto, exige de forma radical que os judeus e os cristãos sejam fiéis aos ensinamentos de seus livros. E se, realmente, forem fiéis ao ensinamento dos profetas, com o tempo, reconhecerão e respeitarão Mohammad como o último dos profetas admoestadores que Allah enviou à humanidade. Claro, se os judeus, os cristãos ou os infiéis (ateus ou politeístas) não respeitarem o culto, o modo de vida e os ensinamentos revelados por Allah, através do Anjo Gabriel, ao Profeta Mahammad, os muçulmanos são autorizados a reagirem, e, se for necessário, eliminarem os inimigos de Allah e de seu Profeta. A infidelidade e o desrespeito a Allah e a seu Profeta é uma ofensa gravíssima a todos os adeptos do Islan (os muçulmanos). Mas, quem for respeitoso para com o Islan, também deve ser respeitado. Portanto, em princípio, o islamismo é uma religião e cultura tolerante. Tolerante para quem é tolerante e de paz. A típica saudação do muçulmano “salam” é uma proposta de paz, da mesma forma como o “shalon” dos judeus, e “a paz esteja convosco”, ensinada por Jesus. Mas, por que então a história registra conflitos terríveis entre muçulmanos, cristãos e judeus, seguidores da mesma tradição monoteísta, iniciada por Abraão e continuada por Moisés, os profetas, Jesus, Maomé? Isto se deve a interpretações diversificadas do que se considera como mensagens de Deus aos homens. Na verdade, para uma mente tolerante, tanto faz se denominamos o Ser Absoluto de Deus, Yahwé, El, Allah, Tupan ou Olorum. Mas, simples questões linguísticas podem gerar desentendimentos ideológicos, doutrinários, teológicos, motivos de ódios e guerras. O Corão manifesta alta estima e respeito para com os profetas judeus e seu monoteísmo; para com Maria, mãe de Jesus, e para com o próprio Jesus. E o primeiro fundamento para uma convivência tolerante é o respeito. Por isto, se um grupo doutrinário respeitar o que o outro propõe dignamente, e um não queimar ou desrespeitar os livros sagrados do outro, mas se dispuser a discuti-los sem fanatismos e fundamentalismos irracionais, os adeptos de qualquer religião, e mesmo os ateus, poderão conviver pacificamente nesta terra. Para isto, um bom caminho é conhecer melhor a cultura dos outros. E o quê nós, no Ocidente, conhecemos da cultura dos cerca de 1 bilhão de seguidores da doutrina do Corão? Seria muito bom lermos e discutirmos mais o Corão e a cultura muçulmana no Ocidente. Talvez até incentivarmos mais o intercâmbio cultural com os países árabes para superarmos inúmeros preconceitos.
Inácio Strieder é Professor de Filosofia- Recife-PE