Alegoria do jogo de Xadrez
Imaginemos que cada um de nós seja uma peça de um imenso tabuleiro de Xadrez. O tabuleiro é o mundo no qual vivemos, as demais peças são as pessoas que vivem conosco. Aquelas com as quais podemos contar são as que estão do “mesmo lado” que nós; as demais, com as quais não podemos contar, estão do lado oposto e os seus interesses se opõem aos nossos. De maneira semelhante à que acontece no jogo, que é regido por regras, também obedecemos a inúmeras leis, cuja transgressão pode nos causar transtornos. Da mesma maneira que a partida de Xadrez pode ser descrita através de anotações, também podemos ter a nossa história registrada nos livros, na cultura e nos hábitos. Se somos semelhantes a uma peça do jogo de Xadrez, tudo o que conhecemos são outras peças num tabuleiro, o nosso mundo. Nenhuma das peças ocupa o mesmo lugar no tabuleiro e cada uma tem a sua própria maneira de conceber a realidade à sua volta. Só vemos as cores das peças e das casas e a nossa “história” se confunde com a de todas as outras. Quando uma peça é removida, não sabemos para onde vai e, quanto a cada um de nós, peças, não sabemos o que acontecerá no próximo lance: se continuaremos onde estamos, se seremos reposicionados no tabuleiro ou se seremos eliminados e a pequena margem de liberdade de que gozamos, quase nos faz acreditar que somos os únicos autores de nossas escolhas.
Há, no entanto, uma diferença fundamental entre nós e as peças do Xadrez: a pequena margem de liberdade de que dispomos, que nos permite realizar o nosso potencial e também nos torna responsáveis pelos nossos atos. Se todos os eventos fossem totalmente alheios à nossa vontade, jamais poderíamos ser responsabilizados por nossos atos. Podemos então dizer, se for assim, que o destino é filho do livre-arbítrio. Fazemos escolhas que, dadas as suas consequências, ampliam, ou limitam, cada vez mais a nossa capacidade de escolher. Assim, podemos concluir que nem tudo aquilo que se apresenta como possibilidade é lícito ou bom. Seria muito simples se só se apresentassem a nós as “boas” alternativas. Dessa forma, no entanto, não precisaríamos do discernimento que nos foi dado. É imensa a gama de possibilidades, cujas reais causas nós desconhecemos, pois as conhecemos somente pelos seus efeitos. Dois lances em momentos diferentes de uma partida de xadrez (o enxadrista, por exemplo, sacrifica um bispo sabendo que cinco lances depois obterá a vitória, em virtude do sacrifício da peça) estão relacionados por uma intencionalidade que só existe na mente do enxadrista. Não poderia ser essa intencionalidade o “inconsciente coletivo” das peças? E quanto à mente superior que nos move no tabuleiro, que é o nosso mundo, quanta coisa deve saber que nós não sabemos?!