CIÊNCIA E RELIGIÃO
Frequentemente se reacendem polêmicas entre cientistas e religiosos. Uns procuram explicar os fenômenos do mundo pelas leis e as potencialidades da natureza, outros buscam respostas em tradições de origem religiosa. Isto deixa a impressão que existe um conflito irreconciliável entre o mundo científico e o mundo religioso. O que é uma falsidade. Pois ciência e religião são apenas faces complementares de uma mesma realidade. Estranhamente o problema está mais do lado dos religiosos do que dos cientistas. Questão que no mundo ocidental cristão deveria estar totalmente superado, pois o Apóstolo Paulo, que é o grande teólogo do cristianismo, ensina no primeiro capítulo de sua Carta aos Romanos que “o que se pode conhecer de Deus é manifesto entre os homens... Sua realidade invisível, seu eterno poder e sua divindade tornou-se inteligível, desde a criação do mundo, através das criaturas... (cf. Rm 1,19-20). O que nos ensina este texto? Que pesquisando o mundo material, nos aprofundando no conhecimento da natureza e de todos os seres, ao mesmo tempo nos aprofundamos no conhecimento de Deus. E quem se dedica mais ao conhecimento das leis da natureza e das criaturas existentes neste mundo criado? São os cientistas. Desta forma, os verdadeiros teólogos do mundo cristão são os cientistas, e não aqueles que ficam repetindo fórmulas prontas, dogmáticas, construídas em linguagem mítica. Em outra passagem da mesma Carta aos Romanos o Apóstolo Paulo também ensina que o verdadeiro culto cristão deve ser racional, e consiste em ofertar a Deus o dia-a-dia de nossa vida corporal (Cf. Rm 12,1-2). Em poucas palavras Paulo ensina aos cristãos o fundamental da civilização cristã: pesquisar e conhecer a natureza, para saber quem é Deus; viver racionalmente a vida corporal (material) no dia-a-dia, ofertando-se assim a Deus. Isto, para Paulo, é a religião cristã. Cristão praticante, portanto, não é aquele que simplesmente frequenta os templos, assistindo passivamente a rituais e a pregações, que repete muitas rezas, que paga seus dízimos... Tudo isto é secundário e pode consistir num grande engodo, embora também possa ser um complemento daquilo que é essencial ao cristianismo. E o que é o teologicamente essencial ao cristão? Aprofundar-se no conhecimento do mundo criado e viver na terra segundo as leis da natureza. Assim ele estará espiritualmente unido ao seu grandioso Criador, a quem poderá reconhecer e honrar. Interessante é que na história do cristianismo encontramos, desde o início, sábios, místicos, filósofos e teólogos que muito bem entenderam a essência cristã. Já os primeiros cristãos repararam que os males sociais não eram vontade de Deus, mas fruto das injustiças humanas. Por isto, todos deviam viver fraterna e solidariamente, superando classes e opressões escravagistas. Os conflitos e as necessidades deveriam ser resolvidos comunitariamente. Ninguém deveria viver parasitariamente, pois “quem não trabalhasse também não comesse”. Aos doentes era enviado o atendimento solidário da comunidade, levando o pão eucarístico e os remédios para o alívio de seus sofrimentos. Em consequência surgem centros de atendimento aos pobres e aos doentes. Estes foram os grandes milagres dos primeiros tempos do cristianismo. Nada de sessões de milagres, de palavras mágicas, de sugestionamentos coletivos. Tudo isto existia supersticiosamente no mundo pagão. Deus criara sabiamente as leis da natureza, as quais se deveria conhecer para viver de acordo com elas, e assim honrar a Deus Pai, que está nos céus. Os cristãos já não cultuavam mais a JUPITER (ju + piter = ju (jour=dia), piter ( pater=pai), o deus da luz do dia, dos raios, dos trovões; o soberano, o chefe, o patrão. Para os cristãos o sol, a luz e as autoridades entre os homens apenas eram sinais do verdadeiro Deus Pai, que perpassa os céus (o mundo criado). E para encontrar este Deus o cristão devia respeitar a aliança entre homem e natureza. Pois o homem é parte objetivada desta natureza, criada sabiamente por seu Deus. Desta forma, ciência sem religião é ignorância, e religião sem ciência é magia.
Inácio Strieder é professor de filosofia- Recife-PE.