A CRIAÇÃO DAS ESCOLAS MÉDICAS NO BRASIL
Sérgio Martins PANDOLFO*
“Ao mudar a capital do Império Português de Lisboa para o Rio de Janeiro, o Príncipe Regente não chegava aqui como foragido ou exilado, mas como soberano em solo seu”.
Comemorou-se festivamente em 2008, em todo o território nacional, os 200 anos da transferência da Corte Portuguesa para o Brasil, fato que mudou radicalmente a rotina política, econômica e sociocultural da até então colônia portuguesa no continente americano, influenciando decisivamente no seu desenvolvimento. E dentre os fatos mais notáveis dessa metamorfose destaca-se a instalação dos cursos médicos em solo brasileiro.
A medicina praticada hoje no Brasil é, sem ponta de dúvida, uma das mais avançadas do mundo, suplantando mesmo, em determinadas áreas, a que se exerce em países do Primeiro Mundo. Mas nem sempre foi assim.
Até 1808, quando foram criadas as primeiras escolas médicas no País, todo o sistema educacional era exercido pelos colégios e seminários jesuítas. Com a expulsão destes, pelo Marquês de Pombal, em 1759, criou-se um verdadeiro vazio educacional, até que com a inserção da reforma pombalina, implantada na passagem dos séculos XVIII para XIX, operou-se uma verdadeira dinamização no mundo cultural, com a criação de sociedades e associações científicas e literárias, com ênfase para o estudo das ciências. A Medicina era então exercida escassamente por físicos (médicos clínicos), cirurgiões formados em escolas européias, notadamente em Coimbra, cirurgiões-barbeiros (espécie de técnicos práticos, sem diploma), bem como por médicos reinóis que para cá se deslocavam.
Quando a Família Real portuguesa, pressionada pela cobiça francesa de Napoleão Bonaparte, para cá se transferiu, em princípios de 1808, um fato novo e de extraordinária importância ocorreu, tão logo D.João VI pisou o solo baiano (22 de janeiro). Convencido por José Correia Picanço, um pernambucano, lente jubilado da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra e que havia pouco fora guindado à função de cirurgião-mor da Corte, o Príncipe Regente criou a Escola de Cirurgia da Bahia, a primeira do País, que passou a funcionar no antigo Colégio dos Jesuítas, no histórico sítio do Terreiro de Jesus, por decisão régia de 18 de fevereiro de 1808.
Menos de um mês após sua chegada a Salvador, a Família Real transfere-se para o Rio de Janeiro, capital da colônia portuguesa da lusamérica, onde se instala de vez, com plenitude administrativa e idéias de longa (à vontade do regente, definitiva) permanência, dando início a uma série de medidas de extraordinária envergadura que mudariam a face do País.
No Rio, novamente o irrequieto e persuasivo Dr. Correia Picanço convence o Regente a fundar a Escola Anatômica, Cirúrgica e Médica do Rio de Janeiro, a 5 de novembro do mesmo ano de 1808, situando-a no Real Hospital Militar e da Marinha, no Morro do Castelo. Salvador e Rio eram, à época, as duas maiores e mais importantes cidades do florescente território brasílico e suas escolas médicas foram o núcleo formador dos esculápios brasileiros durante muitos anos. Por sua soberba e meritória atuação, o Dr. José Correia Picanço foi aclamado “Patriarca da Medicina Brasileira”, por ocasião do III Congresso Brasileiro de História da Medicina.
Após passar por vários endereços, a Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro instala-se, em 1918, em majestoso e histórico prédio mandado construir na Praia Vermelha, bairro da Urca, lá permanecendo até 1973, quando é transferida para o campus universitário da Ilha do Fundão.
Durante quase uma centúria essas duas escolas médicas foram as únicas a existir no País, posto que a terceira a ser criada, a Faculdade de Medicina, Cirurgia e Farmácia de São Paulo, somente surgiu em 25 de julho de 1891, como curso livre; por lei federal de 19 de dezembro de 1912 passou a chamar-se Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, tendo sido seu primeiro diretor o médico Arnaldo Augusto Vieira de Carvalho, que a ela imprimiu tal nomeada e progresso, instalando-a, pouco tempo passado, em sede própria, para tal construída, que esse edifício, hoje patrimônio estadual paulista, ficou conhecido como a “Casa de Arnaldo”.
Tanto a faculdade paulista, como as anteriormente citadas, desenvolveram suas atividades práticas, durante longo tempo, nos vetustos hospitais das Santas Casas de Misericórdia – o que nem sempre gerou boa concórdia! –, estabelecendo, destarte, estreito liame entre a caridade assistencial e o ensino da arte hipocrática, o que muito auxiliou no desenvolvimento da Medicina brasileira e constituiu sustentáculo para a assistência prestada aos pacientes pobres que para esses nosocômios acorriam.
Veio a seguir, em 25 de julho de 1898, a Faculdade de Medicina e Cirurgia de Porto Alegre, mais tarde (1936) incorporada à esfera universitária como Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Em 1911 foi criada a Faculdade de Medicina de Minas Gerais, em Belo Horizonte, pela qual se formou seu aluno mais ilustre, o Dr. Juscelino Kubitschek de Oliveira, que a cursou de 1922 a 1927- um dos maiores, se não o maior Presidente da República que esta Nação já teve.
A sexta escola a nascer foi o Curso de Medicina e Cirurgia do Paraná (1912), depois mudado para Faculdade de Medicina do Paraná, em 1920, mais tarde passando a integrar a Universidade Federal do Paraná (1965).
A Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, sétima do País, surgiu em 9 de janeiro de 1919, por iniciativa conjunta de alguns ilustres e abnegados médicos que aqui labutavam, tendo à frente a figura apostolar de Camilo Henrique Salgado. Constituía seu Corpo Médico inicial o que havia de melhor e mais seleto na classe médica local, à época, quase à unanimidade, formada pelas escolas da Bahia e do Rio de Janeiro.
A Faculdade funcionou, a princípio, em dependências do Lyceu Paraense, atual Ginásio “Paes de Carvalho”, tendo sido seu primeiro diretor o Dr. Antônio Emiliano de Souza Castro, o Barão de Anajás. Em 1923 a escola adquiriu o prédio situado no antigo Largo de Santa Luzia, hoje Praça Camilo Salgado, que abrigava um Grupo Escolar e, após reformas, para lá se mudou em definitivo, sede que tem sido simbólica e tradicionalmente referenciada a essa escola superior, até os dias correntes e, à semelhança do ocorrido com o prédio da faculdade de São Paulo, é hoje também conhecido como “a Casa de Camilo Salgado”. O Hospital da Santa Casa de Misericórdia, hoje centenário, à altura considerado um dos melhores e mais bem instalados do norte do País, por estar localizado em frente ao edifício antecitado vem sendo utilizado, até presentemente, como centro de treinamento prático dos alunos. Federalizada em janeiro de 1950, a faculdade passou a integrar, a partir de 1957, juntamente com outras seis unidades de ensino superior, a Universidade do Pará, criada por ato oficial do Presidente Juscelino Kubitschek. Em 1965, por lei federal, todas as universidades vinculadas ao Ministério da Educação e Cultura receberam o designativo Federal, seguido do nome do estado respectivo, passando a ser Universidade Federal do Pará, cujo Campus Universitário está privilegiadamente localizado às margens do rio Guamá.
Muitos médicos de expressão máxima nacional e até internacional foram formados por essas Escolas Médicas, desde as primevas, instaladas na Bahia e no Rio, por D.João VI, até as que foram sendo criadas subsecutivamente nos demais estados.
Só para pôr alguns relevantes exemplos citaríamos, sem implicar ordem de importância, os seguintes: Carlos Pinto Seidl, paraense de Belém, formado no Rio, um dos maiores sanitaristas brasileiros, junto com Miguel Pereira e o clínico Miguel Couto; Carlos Chagas, cientista que identificou o agente causador da tripanossomíase, a qual passou a ser mundialmente conhecida, em sua honra, como “doença de Chagas”; Evandro Chagas, que nomina nosso principal instituto de pesquisa, e era filho de Carlos Chagas, vulto eminente da patologia tropical; Osvaldo Cruz, pioneiro da Medicina Experimental no Brasil, especializado em Paris, combateu surto de peste bubônica em São Paulo, erradicou a febre amarílica no Rio e em Belém, reformulou o Código Sanitário nacional e criou o Instituto que leva seu nome, em Manguinhos, na ex-capital federal, figurando, internacionalmente, como dos mais importantes cientistas; Maurício Gudin, cirurgião brasileiro de rara capacidade técnica, granjeou renome mundial por suas contribuições originais para o aperfeiçoamento da técnica cirúrgica asséptica.
Gaspar Vianna, paraense de Belém, formou-se no Rio em 1909. Afamou-se mundialmente pela extraordinária descoberta de todo o ciclo evolutivo da leishmaniose, bem como pela instituição de seu efetivo tratamento pelo tártaro emético. Gaspar morreu vítima de infecção tuberculosa fulminante, ao contaminar-se, durante uma necrópsia, sendo, assim, “Mártir da Ciência”. Pela magnitude de seus trabalhos recebeu o denominativo de “Benfeitor da Humanidade”, foi apontado como um dos maiores da Medicina do Século XX e por sufrágio popular, livremente procedido, eleito o “Paraense do Século” e empresta seu celebrado nome a um dos melhores hospitais do Pará; como nos diz o grande médico e “imortal” da Academia Nacional de Medicina Pedro Nava; “As grandes idéias médicas não pertencem a este ou aquele século, não são sucessivas e sim coexistentes”. Euríclides de Jesus Zerbini, cirurgião brasileiro que se notabilizou internacionalmente por ter realizado o primeiro transplante cardíaco no Brasil, logo a seguir ao realizado pioneiramente por Christian Barnard; Ivo Pitangui, o mais ilustre cirurgião plástico nacional e um dos de maior prestígio internacional, por suas técnicas originais.
Dentre os paraenses aqui atuantes, começaríamos por reapontar Camilo Salgado, cirurgião de rara destreza técnica, professor de Medicina, humanitário, amigo dos desvalidos da fortuna, que ele atendia em seu consultório, sem distingui-los dos clientes particulares, e na Santa Casa, onde os operava e tratava com excepcional zelo e competência, razão por que é, até hoje, figura reverenciada, quase venerada, mítica, tida por muitos populares como santo, executor de milagres e como tal invocado; Acilino de Leão, clínico atilado, professor emérito, humanitário, literato, inflamado orador; Prisco dos Santos, exímio malabarista do bisturi, anatomista meticuloso, professor de méritos; Ofir Loiola, pediatra de recursos avançados, dedicado, dá nome a um dos nossos mais importantes hospitais; Francisco de Souza Pondé, Professor de Medicina Legal, fundador da faculdade paraense e pioneiro da Pediatria em nosso estado; Lauro Magalhães, cirurgião e urologista de grande nomeada.
Eis alguns poucos exemplos, dentre milhares que poderiam ser listados, que bem honram e enobrecem a Medicina e os discípulos de Hipócrates, nesses dois séculos de criação dos cursos médicos em nosso imenso e pujante País.
Nota: Na figura ao alto da página o quadro "Criação da Escola Médico-Cirúrgica da Bahia" (pintura alegórica, Museu da Faculdade de Medicina da Bahia)
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*Médico e Escritor. ABRAMES/SOBRAMES
serpan@amazon.com.br - sergio.serpan@gmail.com - www.sergiopandolfo.com
Sérgio Martins PANDOLFO*
“Ao mudar a capital do Império Português de Lisboa para o Rio de Janeiro, o Príncipe Regente não chegava aqui como foragido ou exilado, mas como soberano em solo seu”.
Comemorou-se festivamente em 2008, em todo o território nacional, os 200 anos da transferência da Corte Portuguesa para o Brasil, fato que mudou radicalmente a rotina política, econômica e sociocultural da até então colônia portuguesa no continente americano, influenciando decisivamente no seu desenvolvimento. E dentre os fatos mais notáveis dessa metamorfose destaca-se a instalação dos cursos médicos em solo brasileiro.
A medicina praticada hoje no Brasil é, sem ponta de dúvida, uma das mais avançadas do mundo, suplantando mesmo, em determinadas áreas, a que se exerce em países do Primeiro Mundo. Mas nem sempre foi assim.
Até 1808, quando foram criadas as primeiras escolas médicas no País, todo o sistema educacional era exercido pelos colégios e seminários jesuítas. Com a expulsão destes, pelo Marquês de Pombal, em 1759, criou-se um verdadeiro vazio educacional, até que com a inserção da reforma pombalina, implantada na passagem dos séculos XVIII para XIX, operou-se uma verdadeira dinamização no mundo cultural, com a criação de sociedades e associações científicas e literárias, com ênfase para o estudo das ciências. A Medicina era então exercida escassamente por físicos (médicos clínicos), cirurgiões formados em escolas européias, notadamente em Coimbra, cirurgiões-barbeiros (espécie de técnicos práticos, sem diploma), bem como por médicos reinóis que para cá se deslocavam.
Quando a Família Real portuguesa, pressionada pela cobiça francesa de Napoleão Bonaparte, para cá se transferiu, em princípios de 1808, um fato novo e de extraordinária importância ocorreu, tão logo D.João VI pisou o solo baiano (22 de janeiro). Convencido por José Correia Picanço, um pernambucano, lente jubilado da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra e que havia pouco fora guindado à função de cirurgião-mor da Corte, o Príncipe Regente criou a Escola de Cirurgia da Bahia, a primeira do País, que passou a funcionar no antigo Colégio dos Jesuítas, no histórico sítio do Terreiro de Jesus, por decisão régia de 18 de fevereiro de 1808.
Menos de um mês após sua chegada a Salvador, a Família Real transfere-se para o Rio de Janeiro, capital da colônia portuguesa da lusamérica, onde se instala de vez, com plenitude administrativa e idéias de longa (à vontade do regente, definitiva) permanência, dando início a uma série de medidas de extraordinária envergadura que mudariam a face do País.
No Rio, novamente o irrequieto e persuasivo Dr. Correia Picanço convence o Regente a fundar a Escola Anatômica, Cirúrgica e Médica do Rio de Janeiro, a 5 de novembro do mesmo ano de 1808, situando-a no Real Hospital Militar e da Marinha, no Morro do Castelo. Salvador e Rio eram, à época, as duas maiores e mais importantes cidades do florescente território brasílico e suas escolas médicas foram o núcleo formador dos esculápios brasileiros durante muitos anos. Por sua soberba e meritória atuação, o Dr. José Correia Picanço foi aclamado “Patriarca da Medicina Brasileira”, por ocasião do III Congresso Brasileiro de História da Medicina.
Após passar por vários endereços, a Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro instala-se, em 1918, em majestoso e histórico prédio mandado construir na Praia Vermelha, bairro da Urca, lá permanecendo até 1973, quando é transferida para o campus universitário da Ilha do Fundão.
Durante quase uma centúria essas duas escolas médicas foram as únicas a existir no País, posto que a terceira a ser criada, a Faculdade de Medicina, Cirurgia e Farmácia de São Paulo, somente surgiu em 25 de julho de 1891, como curso livre; por lei federal de 19 de dezembro de 1912 passou a chamar-se Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, tendo sido seu primeiro diretor o médico Arnaldo Augusto Vieira de Carvalho, que a ela imprimiu tal nomeada e progresso, instalando-a, pouco tempo passado, em sede própria, para tal construída, que esse edifício, hoje patrimônio estadual paulista, ficou conhecido como a “Casa de Arnaldo”.
Tanto a faculdade paulista, como as anteriormente citadas, desenvolveram suas atividades práticas, durante longo tempo, nos vetustos hospitais das Santas Casas de Misericórdia – o que nem sempre gerou boa concórdia! –, estabelecendo, destarte, estreito liame entre a caridade assistencial e o ensino da arte hipocrática, o que muito auxiliou no desenvolvimento da Medicina brasileira e constituiu sustentáculo para a assistência prestada aos pacientes pobres que para esses nosocômios acorriam.
Veio a seguir, em 25 de julho de 1898, a Faculdade de Medicina e Cirurgia de Porto Alegre, mais tarde (1936) incorporada à esfera universitária como Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Em 1911 foi criada a Faculdade de Medicina de Minas Gerais, em Belo Horizonte, pela qual se formou seu aluno mais ilustre, o Dr. Juscelino Kubitschek de Oliveira, que a cursou de 1922 a 1927- um dos maiores, se não o maior Presidente da República que esta Nação já teve.
A sexta escola a nascer foi o Curso de Medicina e Cirurgia do Paraná (1912), depois mudado para Faculdade de Medicina do Paraná, em 1920, mais tarde passando a integrar a Universidade Federal do Paraná (1965).
A Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, sétima do País, surgiu em 9 de janeiro de 1919, por iniciativa conjunta de alguns ilustres e abnegados médicos que aqui labutavam, tendo à frente a figura apostolar de Camilo Henrique Salgado. Constituía seu Corpo Médico inicial o que havia de melhor e mais seleto na classe médica local, à época, quase à unanimidade, formada pelas escolas da Bahia e do Rio de Janeiro.
A Faculdade funcionou, a princípio, em dependências do Lyceu Paraense, atual Ginásio “Paes de Carvalho”, tendo sido seu primeiro diretor o Dr. Antônio Emiliano de Souza Castro, o Barão de Anajás. Em 1923 a escola adquiriu o prédio situado no antigo Largo de Santa Luzia, hoje Praça Camilo Salgado, que abrigava um Grupo Escolar e, após reformas, para lá se mudou em definitivo, sede que tem sido simbólica e tradicionalmente referenciada a essa escola superior, até os dias correntes e, à semelhança do ocorrido com o prédio da faculdade de São Paulo, é hoje também conhecido como “a Casa de Camilo Salgado”. O Hospital da Santa Casa de Misericórdia, hoje centenário, à altura considerado um dos melhores e mais bem instalados do norte do País, por estar localizado em frente ao edifício antecitado vem sendo utilizado, até presentemente, como centro de treinamento prático dos alunos. Federalizada em janeiro de 1950, a faculdade passou a integrar, a partir de 1957, juntamente com outras seis unidades de ensino superior, a Universidade do Pará, criada por ato oficial do Presidente Juscelino Kubitschek. Em 1965, por lei federal, todas as universidades vinculadas ao Ministério da Educação e Cultura receberam o designativo Federal, seguido do nome do estado respectivo, passando a ser Universidade Federal do Pará, cujo Campus Universitário está privilegiadamente localizado às margens do rio Guamá.
Muitos médicos de expressão máxima nacional e até internacional foram formados por essas Escolas Médicas, desde as primevas, instaladas na Bahia e no Rio, por D.João VI, até as que foram sendo criadas subsecutivamente nos demais estados.
Só para pôr alguns relevantes exemplos citaríamos, sem implicar ordem de importância, os seguintes: Carlos Pinto Seidl, paraense de Belém, formado no Rio, um dos maiores sanitaristas brasileiros, junto com Miguel Pereira e o clínico Miguel Couto; Carlos Chagas, cientista que identificou o agente causador da tripanossomíase, a qual passou a ser mundialmente conhecida, em sua honra, como “doença de Chagas”; Evandro Chagas, que nomina nosso principal instituto de pesquisa, e era filho de Carlos Chagas, vulto eminente da patologia tropical; Osvaldo Cruz, pioneiro da Medicina Experimental no Brasil, especializado em Paris, combateu surto de peste bubônica em São Paulo, erradicou a febre amarílica no Rio e em Belém, reformulou o Código Sanitário nacional e criou o Instituto que leva seu nome, em Manguinhos, na ex-capital federal, figurando, internacionalmente, como dos mais importantes cientistas; Maurício Gudin, cirurgião brasileiro de rara capacidade técnica, granjeou renome mundial por suas contribuições originais para o aperfeiçoamento da técnica cirúrgica asséptica.
Gaspar Vianna, paraense de Belém, formou-se no Rio em 1909. Afamou-se mundialmente pela extraordinária descoberta de todo o ciclo evolutivo da leishmaniose, bem como pela instituição de seu efetivo tratamento pelo tártaro emético. Gaspar morreu vítima de infecção tuberculosa fulminante, ao contaminar-se, durante uma necrópsia, sendo, assim, “Mártir da Ciência”. Pela magnitude de seus trabalhos recebeu o denominativo de “Benfeitor da Humanidade”, foi apontado como um dos maiores da Medicina do Século XX e por sufrágio popular, livremente procedido, eleito o “Paraense do Século” e empresta seu celebrado nome a um dos melhores hospitais do Pará; como nos diz o grande médico e “imortal” da Academia Nacional de Medicina Pedro Nava; “As grandes idéias médicas não pertencem a este ou aquele século, não são sucessivas e sim coexistentes”. Euríclides de Jesus Zerbini, cirurgião brasileiro que se notabilizou internacionalmente por ter realizado o primeiro transplante cardíaco no Brasil, logo a seguir ao realizado pioneiramente por Christian Barnard; Ivo Pitangui, o mais ilustre cirurgião plástico nacional e um dos de maior prestígio internacional, por suas técnicas originais.
Dentre os paraenses aqui atuantes, começaríamos por reapontar Camilo Salgado, cirurgião de rara destreza técnica, professor de Medicina, humanitário, amigo dos desvalidos da fortuna, que ele atendia em seu consultório, sem distingui-los dos clientes particulares, e na Santa Casa, onde os operava e tratava com excepcional zelo e competência, razão por que é, até hoje, figura reverenciada, quase venerada, mítica, tida por muitos populares como santo, executor de milagres e como tal invocado; Acilino de Leão, clínico atilado, professor emérito, humanitário, literato, inflamado orador; Prisco dos Santos, exímio malabarista do bisturi, anatomista meticuloso, professor de méritos; Ofir Loiola, pediatra de recursos avançados, dedicado, dá nome a um dos nossos mais importantes hospitais; Francisco de Souza Pondé, Professor de Medicina Legal, fundador da faculdade paraense e pioneiro da Pediatria em nosso estado; Lauro Magalhães, cirurgião e urologista de grande nomeada.
Eis alguns poucos exemplos, dentre milhares que poderiam ser listados, que bem honram e enobrecem a Medicina e os discípulos de Hipócrates, nesses dois séculos de criação dos cursos médicos em nosso imenso e pujante País.
Nota: Na figura ao alto da página o quadro "Criação da Escola Médico-Cirúrgica da Bahia" (pintura alegórica, Museu da Faculdade de Medicina da Bahia)
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*Médico e Escritor. ABRAMES/SOBRAMES
serpan@amazon.com.br - sergio.serpan@gmail.com - www.sergiopandolfo.com