Matar um marido (publicado originalmente em 16/12/2023)
Chico Anysio contou certa vez que Joffre, filho de Nelson Rodrigues, convidou-o a gravar participação especial no filme ‘Vestido de Noiva’, que Joffre produzia, roteirizava e dirigiria. O comediante topou – nem discutiu cachê. Recusou outros trabalhos por isto. Para surpresa dele, dias depois, num jornal, espantou-se com a propaganda anunciando a estreia do longa-metragem (2006, íntegra no youtube), adaptação à telona da mais célebre peça de Nelson, que dia 29/12 completa 80 anos da estreia num teatro do RJ, então capital federal. O humorista ficou possesso. Ameaçou processar Joffre, o que não fez. Nunca assisti à encenação, mas vi o filme. Concluo que foi melhor Chico não ter entrado nesta barca furada.
Com orçamento baixo, tem elenco esforçado. Só. Único trabalho cinematográfico de Joffre, a fita é mal comandada desde o começo. O script, cheio de idas e vindas, tem o objetivo de confundir o público entre realidade e delírio, verdade e mentira.
Na trama, Alaíde (Simone Spoladore) está para casar com Pedro (Marcos Winter) e é atropelada. O motorista foge sem socorrê-la. Dias antes, ela encontra na casa em que morará o diário de Clessi (Marília Pêra), cafetina que ali residiu décadas atrás e foi assassinada por um adolescente. Enquanto é operada, fica entre a vida e a morte e lembra das brigas com a irmã, Lúcia (Letícia Sabatella), de quem roubou o namorado.
Outra historinha para encerrar: Ruy Castro, quando pesquisava a escrever a biografia de Nelson (‘O Anjo Pornográfico’ – 1992), frequentava diariamente a casa de Helena, irmã do cronista – lá havia muito material, dentre eles um anúncio de página inteira do ‘Diário da Noite’ de ‘Vestido de Noiva’, com a frase ‘É tão fácil matar um marido’ em letras garrafais. Ruy afanou-o (“Quando ia, além de Helena, outras irmãs iam também e me vigiavam para ver se eu não roubaria nada”). Emoldurou-o. Hoje adorna uma parede de seu apartamento. Duração: 109 minutos. Cotação: ruim.