Godard: 1930-2022 (publicado originalmente em 1/10/2022)
Jean-Luc Godard tinha só 21 anos quando, em 1952, começou a escrever críticas na ‘Cahiers du Cinéma’. Passou infância-juventude na Suíça. Depois, estudou etimologia na Sorbonne. Esquerdista até o último fio de cabelo (fã de Marx e do existencialismo), aplicou a verve nos cineastas veteranos. Alegava que jovens não tinham vez e somente a tradição possuía ‘privilégios’.
Não à toa, a destruir a suposta espiral, a sua geração começou a rodar os próprios filmes, cujo teor político desejava restabelecer o ‘cinema de autor’ que predominou na França até a década de 1930. A ‘Nouvelle Vague’ (‘Nova Onda’), movimento surgido a partir destes jovens, conquistou milhões de admiradores. Godard, que morreu dia 13/9 aos 91 anos (de ‘suicídio assistido’), teve como companheiros ícones como Truffaut, Allan Resnais, Claude Chabrol, Eric Rohmer, Roger Vadim.
Os longas-metragens pregavam amor livre e a ‘revolução pela revolução’. O ápice se deu nos protestos de maio-1968, quando greves gerais e manifestações estudantis dominaram a França. Bernardo Bertolucci quebrou este paradigma com ‘Os Sonhadores’ (2003), ao escancarar que eram apenas adolescentes de família rica que aspiravam ficar eternizados pela conflagração – a chamada ‘elite culpada’ que fingia, por exemplo, estar presa a correntes (para demonstrar ‘sofrimento’) e pintava cartazes com frases pré-fabricadas pela bolha que se recusava a crescer.
‘Acossado’ (1960) foi o debute de Godard. Roteiro ágil, câmera balançando, diálogos ousados, closes imperfeitos, atores bonitos, sexualidade exacerbada eram as características. Mas, tal qual o ‘Cinema Novo’ brasileiro, o auge parou naqueles anos 60, quando a utopia ainda tinha algum sentido.
Daí em diante, Godard e sua turma ainda tentou repaginar a ‘Nouvelle Vague’, porém ninguém se interessava mais ou tinha paciência, a não ser, claro, ‘esquerdinhas’ de 40, 50 ou 60 anos que viam naquele tipo de cinema o espelho do passado a tentativa de, talvez, ‘remoçar’.
Em 2010, Godard foi agraciado com o Oscar pelo conjunto da obra. Como todo ‘revoltado com o sistema’, se recusou a buscar o prêmio. De todos os componentes da NV, foi o último a falecer. Fechou as cortinas da fase outrora gloriosa. E, como ambicionava, escreveu, queiram ou não, seu nome na história do cinema.