Destino e azar (publicado originalmente em 29/1/2022)
Qualquer um que saiba o básico do básico da recente história brasileira conhece os acontecimentos envolvendo a doença e a morte do presidente eleito de forma indireta e que não tomou posse. Em 2010, o escritor Luís Mir lançou 'O Paciente: O Caso Tancredo Neves', que desenrola o novelo e o calvário do político mineiro (1910-85), onde narra bastidores e confusões da equipe médica que o assistia, numa sucessão de fracassos de cirurgias.
Baseado na obra, o diretor Sérgio Rezende, famoso pelos longas-metragens de cunho político ('O Homem da Capa Preta', 1986, 'Lamarca', 94, 'Zuzu Angel', 2006 e 'Salve Geral', 2009, por exemplo), decidiu rodar a fita (cujo título é o mesmo do livro - estreou em 2018) e exibir a sua visão sobre os acontecimentos que agitaram o país há 37 anos.
Othon Bastos encarna o protagonista, ciceroneado por um time gabaritado: Ester Góes (Risoleta, esposa de Tancredo), Leonardo Medeiros (Dr. Pinheiro), Paulo Betti (Dr. Pinotti), Octávio Muller (Dr. Renault) e Emílio Dantas (Antônio Britto, o porta-voz do político). Como produto acabado, o filme não pode ser considerado produção estupenda, de currículo admirável. Porém, como registro histórico, vale a pena ser observado.
Ao lado do bom documentário 'Tancredo: A Travessia' (2011), de Silvio Tendler e Roberto D'Ávila, joga luz ao cenário daqueles meses de março e abril, quando o Brasil se viu refém de operações médicas incorretas. Somente vi a película estes dias e me deparei com algumas emoções inesperadas, muito em virtude do trabalho desenvolvido por Bastos e o sofrimento e agonia do personagem.
Rezende não quer deixar ao espectador a tomada de decisão de quem esteve certo ou errado. A teoria conspiratória de que alguém ou um grupo queria assassinar Tancredo, cujas ideias econômicas e sociais eram de esquerda, diga-se, era bobagem. A frase de Napoleão, tantas vezes repetida pelo mineiro - 'Política é destino' -, se provou eficaz nele próprio: o ex-governador de MG (1983-84) estava fadado a passar por tudo aquilo, num tremendo azar biográfico.
É verdade que Tancredo disse, em seus derradeiros dias, não merecer aquilo, mas, fazer o quê? Política é destino. Duração: 108 minutos. Cotação: bom.