O cúmplice Hitchcock (publicado originalmente em 10/8/2019)
'Jovem e Inocente' (1937) é um produto no qual estão os ingredientes do suspense açucarado do diretor inglês. Vejam só – 1º take: discussão do casal – a esposa é acusada de traição.
O bate-boca leva à cena seguinte: o mar revolto, e um corpo lá, já sem vida. A cena seguinte: um transeunte, Derrick (Robert Tisdall), caminha pela praia e encontra a morta.
Vai acudi-la e depois sai correndo em busca de ajuda. Nisto, 2 moças apenas o veem à jato, pensam que ele foge do crime. O enredo está pronto. O Mestre do Suspense manejava com excelência a 'culpa' do inocente.
A histeria em querer esclarecer o caso quando tudo joga contra. A afirmação do auxílio ao protagonista é dada por um recurso hoje considerado ultrapassado e clichê: a aparição da mocinha apaixonada.
Mas em 1937 tudo era novidade. Ela é Erica (Nova Pilbeam), filha (vejam vocês!) do delegado da cidade. As características probas da menina (a atriz contava 17 anos na época) fazem com que a personagem seja a base do longa-metragem.
Enquanto Derrick tenta achar a prova de sua inocência (a capa com o cinto instalado – cinto este que estrangulou a vítima) Erica testa o humor do espectador com jogadas ricas em ironia e graça.
O roteiro cobre o público de mimos. Sabemos desde o primeiro minuto a identidade do assassino e também o seu tique nervoso: piscar sucessivamente os olhos. Com esta arma em mãos, os únicos perdidos são Derrick e Erica.
Hitchcock é nosso parceiro e os personagens que se virem. Não é bem assim, claro, pois o diretor consegue confeccionar o drama com a perspicácia de um detetive vil.
As pitadas de comiseração (o mendigo que se recusa a falar a verdade porque sente medo de ser preso) e humor (o mesmo mendigo dançando com Erica no baile do hotel, ele com o smoking enorme, ambos em busca do criminoso) trazem à fita algo de tragédia grega às avessas. Duração: 83 minutos. Cotação: ótimo.