O grandioso Hitchcock (publicado originalmente em 13/7/2019)
Dez anos depois de 'Sabotagem' (tema da coluna passada) Alfred Hitchcock era famoso mundialmente e escolhia histórias, além de já bater ponto em Hollywood.
'Interlúdio' (1946) teve as estrelas de então, Ingrid Bergman, Cary Grant e Claude Rains, no elenco, e o roteirista Ben Hecht, que trabalhara com o Mestre do Suspense em outras oportunidades, como em 'Correspondente Estrangeiro' (1940).
É mais uma história de espionagem, nazista agora. Bergman é Alicia, filha dum traidor americano condenado à prisão perpétua. Às voltas com a vida de boemias, bebidas, namorados, fruto da revolta generalizada causada pela figura paterna, a moça se vê diante de um desafio proposto por Devlin (Grant), agente da polícia: espionar um clã de nazistas que estão infiltrados no Rio de Janeiro (!) para saber quais são os planos mirabolantes, diabólicos do pessoal, cujos líderes são Sebastian (Rains) e a mãe (interpretada de forma estupenda por Leopoldine Konstantin).
Mas neste ínterim Devlin e Alicia se apaixonam. Mas e agora? A tarefa não será cumprida? Precisamente em 'Interlúdio' há uma passagem que contei aqui anos atrás, e vale a repetição: I. Bergman estava com dificuldades sobre o seu personagem.
Não sabia a colocação certa das frases, o ar de garota (tinha 30 anos) simultaneamente ao da insegura falsa espiã. Enfim. Foi perguntar a Hitchcock o que devia fazer. 'Ingrid, por favor não pense. Apenas finja', disse o diretor.
Em determinadas sequências percebe-se certo incômodo na atriz de 'Casablanca' (1943). Não nas da festa, onde Devlin invade a adega de Sebastian à procura de algo suspeito... É impressionante o modo como o cineasta sabia conduzir o público ao sistema catalisador da dúvida somada ao romance.
O casal Bergman-Grant surpreendeu a crítica da época por acabar com os 3 segundos de beijo. Foram bem além desse tempo. 'Hitch' disse ter se inspirado ao ver uma menina segurar o braço do namorado enquanto ele urinava. 'O romance não deve ser interrompido', disse. 'Interlúdio': um grande trabalho. Duração: 101 minutos. Cotação: ótimo.