Filme operístico (publicado originalmente em 9/3/2019)
O próprio Arnaldo Jabor já declarou em entrevistas que a realização de 'O Casamento' (1974) foi muito 'brutalizada', sem recursos, meio às favas com os escrúpulos, digamos assim.
Dois anos antes o diretor havia filmado outra história de Nelson Rodrigues, 'Toda Nudez Será Castigada', sucesso retumbante. A empolgação condenou Jabor. No fim de 2018 li 'O Casamento', único romance de Nelson assinado por ele, sem seus famosos pseudônimos. Dias depois vi o filme.
O livro foi censurado– lançado em 1966, meses depois teve de ser recolhido das prateleiras, baleado pelo regime militar. Nelson protestou. Em editorial, 'O Globo', onde ele era cronista, apoiou a censura à obra.
E em dois textos ainda, em dias diferentes. Mas em meados de 67 a liberação veio. Percebe-se que há algo equivocado na fita de Jabor. Os exageros estão bastante evidentes, inclusive nas interpretações, em ritmo de tango dramático.
O cineasta escalou ao elenco um time de artistas de renome nos anos 1970, como Paulo Porto, Camila Amado, André Valli, Fregolente e Mara Rúbia, além de Adriana Prieto, na pele da protagonista Glorinha.
O enredo é o típico de Nelson Rodrigues: tragédias familiares, amores reprimidos, culpas passadas, sexo, incestos, toda a caretice da tal classe média brasileira exposta em carne viva.
Glorinha, moça de 20 anos, vai se casar com Teófilo, porém uma revelação do dr. Camarinha, médico da família, pode por tudo a perder. Nas 24 horas que antecedem o casório, atestados de moral são, um a um, desmoronados.
Afinal, na visão rodrigueana, todos nós temos pecados inconfessáveis... Semanas após o lançamento do filme, a atriz Adriana Prieto, 24 anos, morreu vítima de acidente automobilístico. Nascida na Argentina, e com a vida toda passada no Brasil, esteve em 18 filmes nos 7 anos de carreira.
Até isso o viés operístico de 'O Casamento' teve. É longa que traduz, de forma deformada, mas honesta, as páginas do autor biografado por Ruy Castro. Duração: 95 minutos. Cotação: regular.