SÓ MATANDO

"E se um dia ou uma noite um demônio se esgueirasse em tua mais solitária solidão

e te dissesse: "Esta vida, assim como tu vives agora e como a viveste, terás de vivê-la ainda uma vez e ainda inúmeras vezes:

e não haverá nela nada de novo,

cada dor e cada prazer e cada pensamento e suspiro e tudo o que há de indivisivelmente pequeno e de grande em tua vida há de te retornar,

e tudo na mesma ordem e sequência

- e do mesmo modo esta aranha e este luar entre as árvores,

e do mesmo modo este instante e eu próprio.

A eterna ampulheta da existência será sempre virada outra vez,

e tu com ela, poeirinha da poeira!"

Trecho do “Eterno retorno”; conceito filosófico formulado por Friedrich Nietzsche em “A Gaia Ciência”.

"Só Matando", (“Death of a Gunfighter”), é um filme de faroeste de 1969, sob a direção de Donald “Don” Sigel, que o assina sob o pseudônimo de “Allen Smithee” ; no elenco Richard Widmark, Lena Horne, Carroll O’Connor, etc.

Não sei a razão pela qual Sigel não quis o seu nome no filme.

Talvez medo.

O roteiro era uma sintaxe da política americana na época.

Medo é uma das coisas que move o mundo; e, não por acaso, medo será o motor que moverá os personagens do filme.

Lembrei-me desse filme, (injustamente esquecido!), porque o relacionei com algumas notícias da nossa política.

Pois bem.

O filme conta a história de uma pequena cidade do Texas, dominada por "marginais".

A sociedade de "bem", (a “elite” da cidade), se reúne e resolve que é necessário colocar um fim naquela situação.

Nada mais justo!

Para tanto, contratam um xerife incorruptível, conservador e implacável e atribuem a ele poderes legais, (e ilegais, por “baixo do pano”), para atingir o objetivo de moralizar a cidade.

O xerife em pouco tempo coloca ordem na casa.

Mas toda história tem um presente... e um futuro.

Concluída a tarefa, o xerife começa a impor os seus padrões "morais" e os seus conceitos de "corrupção seletiva".

É preciso atentar que os conceitos morais do filme, (como na vida real), são “difusos”.

Explicando melhor e usando um termo da moda “possuem oitocentos tons de cinza”.

Em conseqüência os "conceitos" do xerife chocam-se com os "interesses" da “elite”.

E, para piorar o xerife não quer sair e não aceita demissão, ele se sente com poder suficiente, (amparado pelo revolver e pela habilidade de usá-lo, na mais fiel expressão do ditado “uma arma sempre tem razão!”), para continuar a mandar na sociedade que o contratou.

Para solucionar o “impasse”, a “elite” da cidade reúne-se novamente e encontra única solução: ”matar o xerife”.

É o “Só matando” do título.

O curioso roteiro é uma metáfora do fascismo.

E o filme uma aula de hipocrisia.

Lembra um pouco a teoria do eterno retorno.

Que a história sempre se repete, como farsa.

E que, seguramente, pode-se dizer do momento atual:

“Já vi esse filme antes”.

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“Don” Donald Sigel, 26/10/2012 – 20/04/1991, cineasta americano, produziu uma extensa obra, entre os quais: 1982 Jogando Com a Vida;

1980 Ladrão por Excelência; 1979 Alcatraz - Fuga Impossível; 1977 O Telefone; 1976 O Último Pistoleiro; 1974 O Moinho Negro; 1973 O Homem que Burlou a Máfia; 1971 Perseguidor Implacável; 1971 O Estranho Que Nós Amamos; 1970 Os Abutres Têm Fome; 1969 Só Matando (como Allen Smithee); 1968 Meu Nome É Coogan; 1968 Os Impiedosos; etc.

É considerado por Clint Eastwood como seu grande mestre.

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Não é frescura...

Gosto de citar Friedrich Nietzsche porque tenho com ele uma relação afetiva; é o filósofo que consulto quando estou aborrecido com o mundo;

ele é inteligente e de entendimento fácil.

Ler Nietzsche é muito mais tranqüilo que ler Guimarães Rosa ou Euclides da Cunha, por exemplo.

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Obrigado pela leitura.

Sajob - agosto / 2015