É fácil caluniar

É FÁCIL CALUNIAR
Miguel Carqueija


Com efeito, caluniar os outros, destruir reputações, é mais fácil do que parece à primeira vista. Por isso devemos usar o nosso bom senso e não acreditar de saída em qualquer coisa que tentem nos impingir, mesmo que seja bastante difundida pela mídia. É preciso verificar o fundamento, e muitas vezes é bastante fácil. Eu mesmo em diversas ocasiões flagrei de saída calúnias, inverdades e deturpações contra pessoas e instituições.
Vou mencionar apenas um exemplo: Walt Disney, o mago da tela, que vem sendo bastante caluniado (principalmente pela esquerda) após a sua morte, quando já não pode se defender.
Disseram até que ele era nazista — logo ele, que produziu o mais contundente filme anti-nazista do período da II Guerra M undial, “A face do Fuehrer”.
Certa vez examinei um exemplar do livro “Para entender o Pato Donald”, que nunca tive e nunca cheguei a ler. Parece ter sido escrito para “desmistificar” Disney. Ora bem, logo na orelha eu encontrei uma flagrande mentira ou asneira. Dizia lá que WD parou de desenhar em 1927 e portanto só criou mesmo Alice e o Coelho Osvaldo, nem o Mickey ele criou. Insinuava-se portanto que WD era um aproveitador do talento alheio.
Veja-se como se calunia uma pessoa honrada como Walt Disney — ele que, a seu tempo, foi o baluarte da moral em Hollywood — a partir de uma premissa falsa! Vejamos os fatos. Disney parou de desenhar em 1928 (ano do lançamento de Mickey) e não em 1927. Isso porém é secundário, o erro de um ano. O que importa entender é que, desenhando ou não, WD continuou supervisionando, planejando, criando. Para um produtor de desenhos animados e outras criações, criar não é desenhar pessoalmente. Ele lançava as idéias e fazia com que seus auxiliares trabalhassem nelas. Ele adquiria os direitos de filmagem das obras literárias. Ele era a alma do estúdio. “Branca de Neve e os sete anões”, primeiro desenho longo da história do cinema (pelo menos, com som, cores e divulgação internacional, pois agora se sabe que dois desenhos longos foram feitos na Argentina na década de 1910), durante os anos de planejamento e produção a partir de 1934, era um projeto conhecido como “a loucura de Disney”. Não de Ub Iwerks, David Hand, Ben Sharpsteen e outros auxiliares. E foi WD quem, durante décadas, lutou para convencer Pamela Travers a autorizar a filmagem de sua criação literária Mary Poppins. Nos extras que agora acompanham o DVD, e que foram produzidos décadas após o lançamento de “Mary Poppins” (1964) e a morte de Walt Disney (1966) fica mais uma vez bem clara a influência do cineasta, o seu carisma, em tudo que se fazia na Walt Disney Productions.
Então vem um crítico bisonho e lança em letra de forma que Disney, por ter parado de desenhar, não criou mais nada. O pior é que raciocínios assim simplistas acabam engabelando pessoas desavisadas e que não aprenderam as técnicas de hermeneutica, de lógica.


Rio de Janeiro, 30 de junho de 2015