Filme Noé, Odisséia e o Eterno Retorno


 
Recheado de um elenco de primeira, contendo Russell Crowe, Jeniffer Connely, Antony Hopkins, Emma Watson e outros, o filme prometia, haja vista haver sempre a polêmica de lidar com o tema da crença, e mesmo de nossa cultura e religião. Talvez tenha sido mais a promessa e a curiosidade do que poderia surgir. Em muito o filme parecia semelhante as antigas produções religiosas, apesar de surpreender pela aparência dos gigantes, homens de pedra, que seriam anjos caídos, leva em muito algumas diferenças com o que disse a Bíblia, apesar de na maioria a informação parecer vinda de lá. Uma versão original do mito, e trazendo o pensamento do recomeço, ou o que para um pensador grego seria o Eterno Retorno, em um mundo novo que nasce da águas que engoliram o velho.

A mitologia tem seu paralelos com outras referentes a heróis e vitórias de eventos grandiosos, como no caso de Odisseu, lá em Odisséia, onde ele fica um período de 10 anos enfrentando os maiores perigos, e que retorna triunfante ao seu reinado, inclusive reconquistando a esposa. No caso de Noé, ele constrói a arca junto com os gigantes, e assim preserva a sua família afastada do perdido mundo, apesar de conservar lembrar a toda a hora do evento da serpente do Éden, e ser um tanto tirano, como demonstrou em certa misoginia, ao desprezar namoradas dos filhos, ou no caso de querer sacrificar neném, se nascesse menina, quase o fazendo com as netas gêmeas. No mais parece mostrar um patriarcado, o que lá em Odisséia também talvez ocorria, apesar de encontrarem lá mulheres poderosas em ilhas desertas, bem como uma rainha.

Na arca, apesar de sua construção pelos gigantes de pedra, houve a repetição de querer colocar todas as espécies de animais, inclusive as cobras, em seu interior. Talvez o momento infantil do filme. Do mais, o namoro do filho Sem, bem como a crise do filho Cam, rendem até certos momento de drama. O filme em certo momento parece um dramalhão mexicano, tamanha a choradeira das mulheres em conflito com o machão Noé. Restou o sábio Matusalém, que exercia milagres, e que apesar de morrer na grande enchente, foi o melhor personagem do filme, curando a esterilidade da esposa de Sem, bem como tranquilo com o fim do mundo. Também Noé tem poderes paranormais, e exerce milagres, e o vilão ficou por conta de Tubal Caim, que levava consigo uma relíquia, a pele da serpente do Éden, usada como filactério, faixa amarrada ao braço, no estilo judaico.

Vemos a virtude ou Areté de Noé, bem como a Hibris do povo de Sodoma/Gomorra, com seu caos, que não foram identificados. Também notamos o aspecto filosófico da reconstrução do destino ou realidade, em verdadeiro eterno retorno, lembrando Nietzsche, que falava que isso era que nem o renascimento sem fim de um demônio, repetindo todas as coisas. Há no filme belas cenas e bastante batalha, faltando temas como a mulher transformada em estátua de sal, mas somando informações, como o caso de Noé ter tirado água da rocha, milagre descrito no Alcorão. Parece que se usou os escritos apócrifos, aqueles encontrados em Nag Hamadhi, no Egito, em 1945, para somar mais fatos, como o caso dos gigantes, que são bem descritos no Livro de Enoque. Os corpos de luz de Adão e Eva são descritos em evangelhos gnósticos, bem como pela cabala, e mostram a diferença antes da queda e depois. A produção assim tem boa fotografia, abusando do contraste, em cenas no escuro, e de uma imagem não muito positiva da humanidade, não parecendo Noé mais justo do que aqueles que lá viviam, uma vez ter matado homens e parecendo praticar artes mágicas. Parece em muito um Odisseu, ou mesmo Hércules e outros heróis, fazendo de tudo para agradar o céu, e colocando em perigo e até sacrificando a família, se necessário, em proveito de seu fanatismo. Mesmo assim o filme é muito bom e mostrar um lado positivo dos gigantes foi curioso, o que pode surpreender os leitores mais aficcionados da Bíblia. Talvez teve bem menos repercussão que outros que lidaram com tema religioso, como O Código da Vinci, mas mesmo assim uma boa produção, com diálogos interessantes e não centrando muito na ação, e não contendo cenas de sexo ou violência, o que possibilitou menor censura.