Mulher nota 1.000 (publicado originalmente em 16/9/2014)
‘Lucy’ estreou no país há 20 dias. Mostra Scarlett Johansson, a bela, no papel-título. Ingênua, deixa-se manipular por um amigo e cai numa cilada que envolve drogas, chineses e os meandros da fé. A moça está na Ásia e é encarregada de levar a droga C.P.H. 4 no estômago para a Europa, junto com os outros quatro rapazes. Cada um vai a um país. Mas pouco antes, quando o capanga do chefe tenta estuprá-la e ela recusa, leva a surra que mudará a sua vida.
Ao apanhar, os pacotes com a droga explodem dentro dela e o material a faz ter superpoderes que deixariam o Superman com inveja. Na verdade, paralelo a isto, vemos Norman (Morgan Freeman), o professor que estuda a capacidade do cérebro. Ele se pergunta: ‘Hoje usamos 10% do cérebro. O golfinho é o mais inteligente, usando 20%. O que ocorreria se conseguíssemos usar 100%?’. Nesta tese, Lucy começa a desenvolver o raciocínio de maneira extraordinária. Vai a 20%, depois 30%, 40%. Aí, consegue controlar as pessoas, dominar a informática, a telecinesia, e a inteligência apurada. Logo, parte em busca de mais C. P H. 4, pois ela sabe que morrerá em um dia porque o seu corpo não suportará a química ali. Lucy quer vingança.
E, para tanto, contará com a ajuda de um delegado desconfiado, mas completamente absorto nas ideias, Pierre Del Rio (Amr Waked). A fita levou 10 anos desde a concepção primeira do diretor Luc Besson. Besson, diretor, ator, produtor, editor, roteirista francês, de 55 anos, é cineasta maiúsculo. O filme ‘Lucy’ é seu 15o trabalho como diretor. Ele não leva muito tempo para nos convencer de que é a história do momento. Mesmo com pouca duração – 89 minutos – trata de temas conturbados como gente grande. Questões que envolvem ciência, religiosidade, tecnologia e presente com o passado vão e vem no script bem preparado por Besson. Ao testar a paciência do espectador com muita violência e efeitos especiais à toa em determinados casos, ‘Lucy’ cai bem no paladar da sétima arte.
E, enfim, a afirmação tão aguardada: Scarlett Johansson está na melhor fase tanto da vida como na profissão. A filha dela, Rose, com o jornalista francês Romain Dauriac, nasceu por estes dias e ‘Lucy’ conquistou a maior quantidade de elogios possível. Besson declarou algum tempo atrás que a película era mistura de três clássicos: ‘O Profissional’ (94), comandado por ele próprio, ‘A Origem’ (2010), de Christopher Nolan, e ‘2001: Uma Odisseia no Espaço’ (1968), do mago Stanley Kubrick. Afora possíveis exageros que se possa ter, o realizador francês acertou na mosca. As sequências de ação, perseguições e tantos tiros a esmo lembram a fita da década retrasada.
O teor de elucubrações, viagens psicológicas e suas determinações no futuro são coesos com o filme de Nolan. E de ‘2001’ tem referências e reverências. A coincidência, porém, fica com Scarlett. Após emprestar a voz a Samantha no excelente ‘Ela’ (2013), a atriz de novo esteve às voltas com um longa-metragem cheio de ilusões da informática, e o futuro ao seu dispor. Mas a artista tem isto de bom. Aos 30 anos de idade e 20 de carreira, trabalhou em 38 filmes com os mais diversos diretores. Desde aqueles cults como Sofia Coppola (‘Encontros e Desencontros’, 2002), Woody Allen (‘Match Point: Ponto Final’, 2005, ‘Scoop: O Grande Furo’, 06, e ‘Vicky Cristina Barcelona’, 2008) e Brian de Palma (‘Dália Negra’, 2006), até estreantes como Joseph Gordon-Levitt (‘Como não Perder Esta Mulher’, 2013), e Shainee Gabel (‘Uma Canção de Amor para Bob Long’, 2004), e os ‘descolados’, como o já citado C. Nolan (‘O Grande Truque’, 06) e Michael Bay (‘A Ilha’, 2005). O dom de saber escolher bons papéis nunca foi o forte dela.
Todavia, a versatilidade é a mãe dos indecisos. Ao optar por trabalhos tão discrepantes– ‘Lucy’, a mulher nota 1.000, é a mais clara delas – Scarlett acerta o alvo no atual. Já errou aqui e ali. Desta vez foi no centro do círculo com a sua flecha, assim como tinha sido ao aceitar participar de ‘Ela’. Scarlett é o tipo de artista que não para. Tem alguns filmes prontos para estrear em 2015 e 2016. Todos blockbusters. A balança pende a este lado, o dos comerciais. E quando a agenda permitir, rodará algo de mais sustância, como ‘Lucy’.