Um bom caldo (publicado originalmente em 28/1/2014)
Martin Scorsese e Leonardo DiCaprio. Um se apoia no outro desde a primeira parceria, há 12 anos, com ‘Gangues de Nova Iorque’ (2002). Até ‘O Lobo de Wall Street’, que estreou sexta-feira por aqui, outros três trabalhos juntaram a dupla: ‘O Aviador’ (04), ‘Os Infiltrados’ (06) e ‘Ilha do Medo’ (09). DiCaprio fez bem a Scorsese e vice-versa. Este ‘O Lobo...’ é, talvez, o segundo melhor da união. Bater ‘Os Infiltrados’ é difícil por conta do elenco e do momento. Os longas-metragens de M.Scorsese costumam não fugir desta literalidade e são compridos realmente... O recém-lançado tem três horas de duração. Não cabe no bolso, por assim dizer. Se você for um daqueles adoradores da impaciência, fique longe. Ou compre o ingresso, pois a trama te prende. Trata-se da história verídica de Jordan Belfort (DiCaprio), corretor de bolsa de valores, viciado em drogas e sexo, e em mentir e manipular. Ele começa numa empresa de Wall Street. Durante seis meses é um estagiário, escuta as ‘orientações’ de seu guru, Mark Hanna (Matthew McConaughey – participação especial; está impecável). Quando finalmente consegue ser contratado, há uma crise nas Bolsas em geral e Belfort é demitido. Assim, o protagonista cria a própria corretora, com funcionários debilóides. Aos poucos arrecada os milhões, e os gasta com bebidas, drogas, remédios e mulheres. E não somente ele... A empresa toda se ‘diverte’.
Além de L. DiCaprio e M. McConaughey, Scorsese reuniu dois outros atores que se viraram: a bela Margot Robbie, na pele da esposa de Belfort, Naomi, e Jonah Hill, que vive Donnie Azoff, o sócio do empresário. O trio DiCaprio-Margot-Hill domina a trama. Parecem ser orquestrados pelo diretor, como se Scorsese tivesse uma batuta e regesse-os. ‘Os Infiltrados’ pode ter melhor acabamento, mas a atuação do ex-‘Titanic’ em ‘O Lobo...’ é de se encher os olhos. Cada vez mais, o ator tem se dedicado em fazer sumir a imagem de mocinho de navio, um frangote às voltas com a Kate Winslet naquela de mimá-lo e satisfazê-lo. DiCaprio quer porque quer, por exemplo, ganhar um Oscar de melhor ator e ter a recompensa por ter tido escolhas certas. Na festa deste ano, dia 2 de março, ele estará lá para a disputa. O páreo é duro: concorrerá com tipos excelentes, como Chiwetel Ejiofor, músico escravo de ’12 Anos de Escravidão’ e Christian Bale, por ‘Trapaça’. Não vi ainda ‘Nebraska’ e ‘Clube de Compras Dallas’, cujos atores centrais complementam a lista da Academia: o veterano Bruce Dern e o próprio McConaughey, respectivamente. Entre os três que vi, daria a estatueta a DiCaprio, sem pensar. Claro que os outros dois fazem um trabalho excepcional, mas a vontade de DiCaprio nas cenas, nos sets, é contagiante. Fiquei com a impressão de que o ator quis validar a carreira com este belo personagem.
Hill concorre a coadjuvante e Scorsese na direção. Pontos a eles, principalmente o primeiro. Dois anos atrás, Hill estreou no Oscar também coadjuvando, desta vez Brad Pitt em ‘O Homem que Mudou o Jogo’. Porém, é em ‘O Lobo de Wall Street’ que ele demonstra sua capacidade. Donnie, seu personagem, é como Jordan Belfort: viciado em tudo. Cheira até açúcar, se este estiver esparramado na mesa. Quer ter relações sexuais com a porta, se for possível. Enfim, um brilho destacável. Os seus concorrentes em 2014 são muito fortes: Barkhad Abi (‘Capitão Phillips’), Bradley Cooper (‘Trapaça’), Michael Fassbender (’12 Anos de Escravidão’) e Jared Leto (‘Clube de Compras Dallas’). Para mim, o favorito, de meu gosto, é B. Abi. ‘O Lobo...’ ainda tem as chances na categoria roteiro adaptado, e está ao lado de ‘Capitão Phillips’, ‘Antes da Meia-Noite’, ‘Philomena’ e ‘12 Anos de Escravidão’. Terence Winter é o responsável pelo script de ‘O Lobo de...’ e estreia como roteirista na sétima arte. De minha parte, gostaria que o prêmio caísse no colo de ‘Antes da Meia-Noite’, sequência de ‘Antes do Pôr-do-Sol’ (2004) e ‘Antes do Amanhecer’ (1995). Sobre Margot, a beleza estonteante da atriz compromete em nada seu trabalho. E com uma forcinha, mereceria indicação a coadjuvante. Não seria surpresa. É o que sempre digo: os bons atores nas mãos de bons diretores. Este caldo fica apetitoso, sem dúvida.