Dicas de sedutores (publicado originalmente em 15/10/2013)

A política fervilhou de dez dias para cá. Marineiros ficaram alegres, o plano C, de Campos, foi posto à baila, Dilma e Aécio ainda tateiam e averiguam o que pode ser feito acerca disto. Então, sobra a esta coluna indicar o documentário ‘Arquitetos do Poder’ (2010), antes de o assunto esfriar. Com a direção de Vicente Ferraz e Alessandra Aldé, traça linha história sobre as campanhas publicitárias de Getúlio Vargas, em 1950, à de 2006, a reeleição de Lula. O panorama é recheado de depoimentos dos chamados marqueteiros, os seus acertos e erros, as ousadias e as desavenças, as vergonhas alheias e as grandes reviravoltas. A fita está disponível na íntegra no YouTube e tem 100 minutos de duração.

Personagens clássicos da área estão lá. Desde Duda Mendonça, o responsável por campanhas de Paulo Maluf na década retrasada e do PT na passada, a Ronald de Carvalho, o editor da TV Globo em 1989, quando das maquiavélicas montagens dos debates Collor x Lula, com favorecimento amplo ao primeiro, ‘Arquitetos do Poder’ transforma os comerciais políticos em discussões. Até onde vale a pena ir para se ganhar um pleito? Quais são os limites do bom senso na TV e no rádio? Determinados momentos são abordados de maneira categórica. E como surgiu a frase ‘Se o Pitta não for um grande prefeito, nunca mais vote em mim’? De que forma eram os programas partidários quando existia só a Arena e o MDB? A vassoura de Jânio Quadros deu certo porque? O filme se dispõe a responder tudo.

Mais que isso, analisa crises. O mensalão é comentado pelo deputado José Genuíno e Duda Mendonça. ‘A imprensa cria a tese e corre atrás das matérias para comprová-la, mesmo que esta tese esteja errada’, diz o deputado federal, sobre o escândalo de 2005. Como não poderia ser diferente, a disputa de 24 anos atrás é o assunto de mais tempo. Collor, por exemplo, é mostrado desde quando o primeiro holofote lhe foi impingido pela mídia (diga-se Globo), em 1987, com as entrevistas a jornais e os demais badulaques das sedas rasgadas. O fenômeno ‘Caçador de Marajás’ foi criado, a história as pessoas estão cansadas de saber. O longa-metragem reflete os motivos da sua ascensão, os da queda.

De modo claro, o documentário visa aprofundar as artimanhas dos bastidores com os olhares dos ditos sedutores de ideias, os marqueteiros atualmente indispensáveis. A estrutura hollywoodiana dos programas eleitorais veio a partir de 1989, mas apenas Collor e Lula usufruíam dela. O primeiro dando vida aos cantos do país, às belezas do verde e amarelo. O segundo organizando a ‘Rede Povo’, a apologia à emissora carioca, com os programas dela, inclusive. Quem se lembra? E não se compara à de quatro anos antes, quando Jânio surgia em frente à tela com jornais a tiracolo, apontando dedos a um e a outro. ‘Arquitetos do Poder’ quer retornos de causas, efeitos. O Brasil dos anúncios de votos.

De algum jeito, a realização de V. Ferraz e Aldé traça o paralelo com ‘Muito Além do Cidadão Kane’ (1993), famoso e clandestino documentário onde a Rede Globo é despedaçada imediatamente após a eleição de F. Collor. Entretanto, depois de assistir à produção de três anos atrás, creio ser esta a com melhor atitude, avanço. ‘Muito Além...’ tem vantagem de ter tido tempo de entrevistar figuras exponenciais, como o ex-ministro Armando Falcão, autor da lei de seu nome, que levava em conta as aparições somente dos candidatos, mudos, com partidos e números na tela. Só. A ditadura e censura estavam em voga e nada era fácil. ‘Arquitetos do Poder’ tem mais. Mergulha em questões deste porte.

Carvalho assume o mea culpa da TV Globo – recentemente, a estação se penitenciou por ter apoiado o golpe militar de 1964 – no caso Collor. ‘Foi uma ordem direta do doutor Roberto’, diz, em referência ao dono da emissora, morto em 2003. Antes tarde do que nunca? Quem sabe... O correto é saber que ‘Arquitetos do Poder’ presta um imenso serviço ao Brasil. Revemos ali o barulho feito pelo depoimento de Miriam Cordeiro, Regina Duarte falando sobre o medo, a resposta de Paloma Duarte a isto, as grávidas do PT etc. Enfim, um prato bem cheio a quem deseja compreender a gente mesmo.

Rodrigo Romero
Enviado por Rodrigo Romero em 15/10/2013
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