Resgate inglório (publicado originalmente em 7/5/2013)

A constatação é inevitável e nada preocupante: os anos 1980 voltaram com tudo. Isto se pelo acaso eles em algum momento estiveram longe. Impressiona a maneira de como esta nossa geração é ávida por voltar a ter à sua volta instantes de 25, 30 anos atrás. A música tem se mostrado verdadeiro destaque neste sentido. O Canal Brasil exibe atualmente a série acerca da história da cantora Clara Nunes (1942-1983). Em 2004 o Brasil reviveu as confusões e emoções de Cazuza (1958-1990) na fita ‘O Tempo não Para’. Quem não se lembra do banho de interpretação de Daniel de Oliveira? Pois é. E sexta-feira passada, dia 3, estreou ‘Somos Tão Jovens’, com Renato Russo no centro da roda. Thiago Mendonça está no papel principal e para início de conversa não chega aos pés de Oliveira. Convence, porém com menos intensidade. A maquiagem empenhada em ajudar funciona, e o ator também tem qualidades vocais. Mas atingir o nível do Cazuza de nove anos atrás seria ousado. Em nenhuma cena personagem cobre ator. Tem-se a nítida noção de que falta algo. O diretor Antônio Carlos Fontoura, o veterano de 74 anos, todavia, vive o maior sucesso da carreira–esteve à frente de filmes como ‘Uma Aventura do Zico’ (1998), ‘No Meio da Rua’, ‘Gatão de Meia Idade’ (ambos de 2006). Então, à trama.

O roteiro de Victor Atherino e Marcos Bernstein mostra o período de 1976 a 1985 da vida do líder da Legião Urbana. Desde o problema de saúde que afeta locomoção até a apresentação no Circo Voador, no Rio de Janeiro, vemos as inspirações do compositor que adorava flores e Sex Pistols. Sua amizade com Aninha (Laila Zaid) e as principais músicas estão no longa. Entretanto, pimentas como sequencias de homossexualismo, drogas e bebidas que esteve em ‘Cazuza – O Tempo não Para’ não fazem parte de ‘Somos Jovens’. Neste, o script é generoso, digamos assim, com a história de Renato Russo. O filme ‘soft’, limpinho e recheado de mimos deixa a desejar por querer influenciar as novas gerações erradamente. Eu, por exemplo, sou da geração imediatamente posterior à de Renato Russo e Cazuza. Comecei a ouvir a dupla depois da morte dos dois. Sou pouquíssimo ligado a música e mais pelo meu irmão que escutava o som. Decorei determinadas letras exatamente por ele ouvir demais. E a moda segue, pois ainda em 2013 serão lançados ‘Faroeste Caboclo’ e ‘Eduardo e Mônica’, baseados em canções de Russo (1960-1996). Se os economistas denominam a década de 1980 como ‘perdida’, a cultura brasileira pode se gabar com Legião, Capital Inicial, Blitz etc? Ou olhamos para ‘Menudos’?

‘Somos Tão Jovens’ conta no elenco com o então sumido Marcos Breda e Sandra Corveloni, a atriz premiada em Cannes por ‘Linha de Passe’ (2008). Eles são os pais de Renato. Comportados, o casal é liberal na questão de Renato. Ou a trama, inspirada livremente na vida do cantor, inventou? A dúvida, claro, não é precisamente esta. O ponto-chave é o seguinte: ‘Somos Tão Jovens’ quer ser uma espécie de cinebiografia de Renato Russo desde o Aborto Elétrico, a carreira solo e o Legião Urbana, mas mesmo encerrando os trabalhos com imagens de show do real R.Russo, consegue pouco. Se for a intensão da fita ser exibida na ‘Sessão da Tarde’ acertou em cheio. Ali não há palavrões, sexo e a vida atribulada do compositor, que faz Freddie Mercury corar de inveja. Fontoura ‘dirigiu por dirigir’ ou a trama não rendeu o quanto queria? Só pelas músicas valeria passar pouco mais de cem minutos nas salas de cinema? Evidentemente, os fãs do Legião, dentre os quais não me incluo, adorarão o filme, e os apesares serão colocados. A película está abaixo dos 80% de aceitação. O que resta é aguardar as próximas duas histórias baseadas nas canções – ‘Faroeste Caboclo’ e ‘Eduardo e Mônica’. Creio que o par terá destaque maior do que ‘Somos Tão Jovens’. Por enquanto, o resgate ainda foi pouco alegre.

Rodrigo Romero
Enviado por Rodrigo Romero em 07/05/2013
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