Maus de bico (publicado originalmente em 11/12/2012)
Cada vez mais o cinema nacional se engessa das mesmas pessoas, iguais histórias, não desvia da estrada da vulgaridade e da esculhambação, no pior sentido. ‘Os Penetras’ aborda o exemplo ruim de juntar a larica com a pajelança podre, se vocês me entendem. Estreou há 12 dias e arrastou grande público, para deleite dos donos do ecrã tupiniquim. Engana-se quem pensa no sucesso do elenco da trama, recheado com craques do humor televisivo e veteranos da citada tevê. Encabeçado pela dupla Eduardo Sterblitch (o Freddy Mercury Prateado do programa ‘Pânico’) e Marcelo Adnet (da MTV), a fita trata de trambiques detonados em festas. Beto (Sterblitch) esbarra em Marco Polo / José Carlos (Adnet) por causa do rompimento da namorada, Laura (Mariana Ximenes / Andrea Beltrão). E deste encontro surgem as mais incólumes situações, com Nelson (Stepan Nercessian), o parceiro de Marco. Junta-se na comédia os empresários Anchieta (Luís Gustavo) e Cordeiro (Luís Carlos Miéle), com a esposa Ivone (Suzana Vieira). Então, o público é servido com cenas de insinuação de sexo e piadas de gosto incerto, tudo amontoado no roteiro para lá de estranho, simultaneamente ingênuo, do quarteto formado pelos cineastas Andrucha Waddington, Marcelo Vindicato, Rafael Dragaud e Nina Crintzs.
‘Os Penetras’ atesta o óbvio: Sterblitch só funciona no ‘Pânico’, Adnet é o pseudocomediante de ar galanteador e Waddington, o diretor (fez também ‘Eu Tu Eles’ – 2000 e ‘Casa de Areia’– 2005), rendeu-se às especulações endinheiradas. Resumo: o filme é ruim de doer, porém encheu os bolsos de todo mundo. Ao ver Beto na telona, o espectador claramente se lembrará dos personagens do ator na atração da Rede Bandeirantes. A dicção não se altera. O ritmo, menos. Não há preparo de elenco, por exemplo. Adnet está ali como esteve antes em ‘As Aventuras de Agamenon, o Repórter’, ou seja, a MTV mudou de local, agora está nas telas grandes do país. O mais triste é saber ser este o tal ‘cinema de entretenimento brasileiro’, ou besteirol. É de tão baixo nível e de qualidade tão rasteira que chega a dar dó. Do mesmo modo, equivoca-se quem compra ingresso para ‘Os Penetras’ com o pensamento de ver ‘Os Penetras Bons de Bico’ (2005), igualmente desastroso, com Owen Wilson. O parentesco se dá não unicamente pelo título, mas pelo equívoco de direção e roteiro. Será normal se vocês forem lá ver a obra e no meio dela se arrependerem de terem comprado o bilhete. Elena Sopova, intérprete de Svetlana, é o ponto alto. Seu papel é o de falar russo, e ela nos encanta com este e os outros atributos.
Na sessão de estreia de ‘Os Penetras’, no Rio de Janeiro, no fim do mês passado, apenas para convidados, o ‘Pânico’ aprontou com o seu integrante de sobrenome impronunciável. Meses antes, o programa havia exibido a filmagem do humorista, digamos, ‘passando um telegrama’. Estava ali, ao vaso, como o rei. Pois é. Tiveram ideia de reexibir a película como espécie de trailer de ‘Os Penetras’. Contaram com a anuência de Waddington, o qual facilitou a colocação do DVD na cabine, e pronto: a travessura estava feita. Fernanda Montenegro estava na plateia. E.Sterblitch ficou sem reação Adnet era risada de orelha a orelha, além da sala completa rachando o bico em gargalhada. Na saída, ao ser indagado sobre a opinião do feito, César Polvilho falou, sem jeito: ‘A Fernanda Montenegro viu isso, cara...’ No meu entender, quiçá esta armadilha tenha sido o maior brilho de ‘Os Penetras’. Juro. Mais risadas dei na exibição da matéria do que durante o longa-metragem inteiro. Um dos raros instantes de sorriso se deu quando Beto quase vomita ao ser enfiado em sua boca docinhos bonitinhos. Fez-me lembrar do ‘Pânico’, fazer o quê? É o preço pago por querer repetir intenções. O título ficaria melhor se fosse ‘Penetras Maus de Bico’, ou ‘Manual a se Assistir a um Filme e Ficar Inconformado Depois’.