Fofinho e ordinário (publicado originalmente em 16/10/2012)
Dois foram os motivos para o meu interesse em querer assistir a ‘Ted’ (2012), o filme sobre a amizade entre um adulto e o seu ursinho maconheiro de pelúcia: a fúria e o escarcéu do deputado do PC do B e delegado Protógenes Queirós e o diretor e roteirista da fita, Seth MacFarlane. O primeiro é sem qualquer dúvida alvo de piadas. Queirós desejou barrar o longa no Brasil porque levou o filho de 11 anos a ver a história e saiu do cinema ‘constrangido’. A tentativa de censura, logicamente, teve seu destino óbvio, acabou no buraco. Outra consequência muito boa se deu com as anedotas do colunista José Simão, da Folha de São Paulo. Dentre os seus escritos, destaco: ‘Agora, Ted levará o seu filho de 11 anos ao Congresso Nacional. Aí verão quem é mais ousado.’ O segundo, MacFarlane, será o mestre de cerimônias do Oscar-13. Além de escrever e dirigir ‘Ted’, o cineasta é o criador do desenho ‘Uma Família da Pesada’, este sim, arrepiaria os cabelos do pudico parlamentar comunista. Estou curioso a descobrir como MacFarlane abordará Hollywood na frente de suas estrelas. O deboche, creio, será a arma na manga, mas não só isto. O Oscar necessita, há tempos, duma pessoa como ele no comando. Talvez possa ser o substituto à altura de Billy Crystal. Aguardemos. Aposto alto no quase quarentão.
‘Ted’ é para adolescentes. Protógenes não deve ter prestado atenção na censura – 16 anos – e pensou se tratar de conto infantil como o da Carochinha. Enganou-se. A fita relata o relacionamento de John Bennett (Mark Wahlberg), empregado relapso de uma loja de aluguel de carros, com Ted, o urso de pelúcia que ganhou no Natal de 1985, quando tinha 8 anos. Naquela noite, o garoto pediu ao presente ter vida, e não é que o ursinho começou a falar e andar? A partir daí, fez tudo e acompanhou John nos caminhos das mudanças: fumou maconha, bebeu álcool, transou com garotas de puro trato e penou para arranjar emprego. John, enquanto isso, namora Lori (Mila Kunis, bela), mulher muito bem sucedida e sempre paquerada pelo chefe. Mas o amor do casal é constantemente abalado pelas farras promovidas por Ted. Numa, o ídolo Sam J. Jones (o ‘Flash Gordon’ – interpreta ele mesmo) é o protagonista e John, fã ardoroso dele, vai e vira a noite entre bebedeiras, música, drogas e moças. E o namoro é terminado, Ted é o culpado e sai de casa para morar sozinho (sim, o urso dividia a casa com John e Lori). Pra piorar a situação, Donny e Robert (Giovanni Ribisi e Aedin Minks), pai e filho, sequestram o brinquedo. A salada feita, o público tem na bandeja um prato só, o urso problemático.
As mulheres o consideram ‘engraçado’, ‘bonitinho’, ‘meiguinho’ e querem um para elas. Mas Ted é um fofinho ordinário, diria Nelson Rodrigues. Nem está à venda nas lojas especializadas. O tal equívoco de Protógenes só fez dar mais cartaz ao longa e atrair espectadores a rodo. Descolado, Ted é o que as pessoas têm medo de ser, porém o brinquedo de pelúcia pode, pois nada lhe acontecerá de grave. Claro, não me refiro aqui às bebedeiras e às drogas. Trato do comportamento avançado, além das linhas do bom senso. Exatamente estas características vemos, por exemplo, em quase 100% dos personagens d’ ‘Uma Família da Pesada’, em especial o cão Brian e o bebê diabólico Stewie. Podemos dizer que Ted e Brian são primos de segundo ou terceiro graus? Sim. Até de primeiro grau. ‘Assustar’ o público com meras ousadias é o propósito de MacFarlane (na versão original, em inglês, ele é a voz de Ted – em ‘Uma Família da Pesada’, dá voz a Peter, o patriarca). Além de participar de tudo, o que é novo no sentido de produção, o cineasta tem o tino de saber chocar na medida precisa entre a linha do bom senso e a do exagero banal. ‘Ted’ é o resultado disto. Macfarlane tem tudo nas mãos para se tornar o ícone carismático e ao mesmo tempo polêmico. Estas duas coisas juntas dão um bom caldo.