Aladeen, o opaco (publicado originalmente em 28/8/2012)
Em Wadyia (lê-se Vadia mesmo) ele manda e desmanda desde a tenra idade. Criou o planeta dele. Lá tem Olimpíada própria (na qual vence sempre matando adversários, inclusive), por exemplo. O mandachuva chama-se Aladeen (a alusão ao gênio da lâmpada é até safada) e tem uma barba de se fazer inveja aos árabes unidos, só comparado ao bigode de Sadam Hussein. No universo onde tudo é da marca Aladeen, e qualquer descuido serve para enviar algum subalterno ao fuzilamento, existem, claro, os subversivos desejosos da democracia para fins lucrativos. Democracia demoníaca, diga-se. E então Sacha Baron Cohen surge nesta figura escatológica. Faz piadas dos EUA, dos ditadores recém-derrubados, religiões, da deficiência física duma personagem e opta por caminhos nada estranhos ao seu status quo. Assim é ‘O Ditador’, nova obra-prima do ator conhecido hoje como revolucionário do humor no cinema, estreado sexta-feira passada. É preciso pensar bem antes de tirar as conclusões do filme, dominado por um humor negro de avermelhar os paladinos dos stand-ups que vemos por aí.
Ben Kingsley está no elenco. Dá vida ao capanga de Aladeen, Tamir, e quer democracia para colocar no bolso os rendimentos com a venda do abundante petróleo de Wadyia. Com vários sósias, o ditador Aladeen vira e mexe é o alvo de tentativas de assassinato. Os disparos atingem as cabeças dos sósias e ele sempre se livra. Mas em uma dessas, o comandante é realmente capturado por um oficial dos EUA (‘todos os que nascem fora daqui nós chamamos de árabes’, diz o homem, interpretado por John C. Reilly) e perde a barba nacionalista. O rosto de bebezinho confunde todo mundo e Aladeen perambula pelas ruas dos EUA, onde discursará na sede da ONU (Organização das Nações Unidas), como um estranho. Enquanto isso, o seu sósia, um tapado de marca maior, títere nas mãos de Tamir, está pronto a ler a carta de renúncia e lançar a constituição democrática em Wadyia. E para impedir, afinal a ‘última’ ditadura árabe necessita seguir na estrada, o verdadeiro Aladeen conta com o apoio duma naturalista, Zoey (Anna Faris, da cinessérie ‘Todo Mundo em Pânico’). Daí o clichezão aparece.
Da metade ao final o curto filme (1h23 apenas) se transforma em um enorme festival de um romance tedioso, ordinário, pra não dizer medíocre, no sentido de médio. Com Zoey, ‘O Ditador’ fica simples e Aladeen vira um boneco opaco, tolo, somente propício a dizer besteiras ao léu. É apagado.
Cohen, se o leitor esqueceu, ou não viu, apareceu vestido de Aladeen na festa do Oscar deste ano e derrubou de propósito um vidro cheio de farinha no smoking impecável de um dos repórteres que o entrevistava. E estavam ao vivo. A forma de promover seus espetáculos é meio deformada. Há quem queira (vai saber) comparar Cohen com turma do programa do Pânico pela ousadia. Mas isto é errado. Pânico pode ser comparado com os caras do ‘Jackaas’. O artista de ‘Borat’ e ‘O Ditador’, se no Brasil tivesse paralelo, seria o CQC – Custe o que Custar. Para entender as piadas de Aladeen temos de estar atualizados com caderno Mundo do jornal, pois Sacha Cohen mexe com pilares de governos estrangeiros, desde a Síria até, como escrevi, os estadunidenses (ele é inglês). Fora isto, e para que o público no todo também participe e tire um pedaço do bolo, S.Cohen inclui na fita cenas de autêntico surrealismo, no pior sentido. O lado bom é a brincadeira, numa sequência, de suas amantes. Megan Fox está ali em viva alma deitada com o déspota e diz que precisa ir embora para se encontrar com o primeiro-ministro da Itália (na época Silvio Berlusconi, frise-se, pois agora é o senhor Mario Monti).