O boom dos traços (publicado originalmente em 19/6/2012)
Esses dias via o minidocumentário sobre a feitura de ‘Branca de Neve e os Sete Anões’ (1937), onde a ousadia e a perseverança de Walt Disney fizeram toda a diferença. Mais de quatro anos para se montar todo o esqueleto da história, a desconfiança da imprensa e do público, críticas ferozes etc. Passadas sete décadas e meia do lançamento do desenho, existe hoje uma linha de produção destas animações.
Todos os anos dezenas de longas-metragens com personagens rabiscados, seja de forma manual ou totalmente computadorizado – não existem limites para o impossível– são postos à prova dos gostos, humores e deleite de crianças, jovens, adultos e idosos. O do momento é ‘Madagascar 3’.
Com o subtítulo ‘Os Procurados’, vem após os sucessos lançados em 2005 e 2008. O número 3 também rendeu e já vendeu quase dois milhões de ingressos só no Brasil. Fazendo jus à sequência, são três os diretores, dois deles presentes no 1 e no 2: Eric Darnell e Tom McGrath, o outro é Conrad Vernon. Se nos roteiros dos dois primeiros a turma de bichos fugia do zoológico e tentava escapar de caçadores e predadores, neste de 2012 a trama é, digamos, adulta em uma pitada.
Noah Baumbach e Darnell, roteiristas, montaram a aventura de forma a criticar a não utilização de animais em circos.
Um dos felinos, creio ser o leão Alex, diz: ‘Depois que vieram aqueles franceses metidos, eles mudaram o modo de se fazer circo. E sabem como? Tiraram os animais!’, falando sobre o Cirque de Soleil. Escuta isto um bando de bichos de um circo acabado e mal cuidado. Então, todos resolvem se unir para fazer um espetáculo totalmente com seres irracionais, supostamente.
Há na turma o tigre traumatizado com um acidente, a tigresa que só sabe dar a pata, um leão marinho desengonçado e os cachorros com roupas de mulher, mas com cabeça de bandidos. A eles juntam-se uma trupe bastante conhecida: Alex (leão), Marty (zebra), Melman (girafa), Glória (hipopótamo), Rei Julien (lêmure) e aqueles pinguins superinteligentes, arrogantes e pretensiosos. Todos juntos transformam suas vidas.
Ressalta-se aqui a presença da inspetora de animais, fanática por empalhamentos, a francesa agente de controle animal. Ela é difícil de parar e trata-se de uma paródia de tudo que é super-herói ao avesso. Indestrutível e irredutível, a francesa de nariz pontudo e cabelo vermelho aparece em uma cena cantando a famosa ‘Non Je Ne Regrette Rien’, Edith Piaf, cheia de lágrimas borradas nos olhos.
‘Madagascar 3’ tem cenas hilariantes e um roteiro que cabe elogios e reparações. Venerar este circo antigo, com animais e tudo o que tinha direito, é louvável. Claro, ninguém quer os maus tratos aos bichos, a lei está para ser cumprida e hoje em dia, pelo menos o que se sabe, não existem debaixo das lojas números com cães, elefantes, leões, pombas, girafas etc. Nas reparações ao script, devemos avisar que este boom de filmes animados para crianças precisa ser revisto, afinal tudo o que é demais às vezes pode ser ruim.
Em 2011, particularmente, o cinema recebeu traços para adultos. ‘Um Gato em Paris’ e ‘Chico e Rita’ arrasaram corações. De forma injusta saíram da festa do Oscar de 2012 sem estatuetas. ‘Rango’ foi o escolhido. Animação da DreamWorks lançada pela Paramount, ‘Madagascar 3’ vai na contramão disto tudo. Não é tatibitate (os maiores compreenderão um pouco), mas deseja atingir os pequenos no ponto mais fraco deles, a emoção. Consegue sim em determinados instantes.
Provavelmente o longa figurará entre os finalistas da categoria no principal prêmio da sétima arte em 2013. Porém, se levar o troféu será outra zebra. Não é possível não existir desenho melhor.