A moça da boca aberta (publicado originalmente em 5/6/2012)
A ideia original era ver ‘Um Conto Chinês’, mas a sessão era uma vez por semana, às terças, e não aos sábados, dia no qual desejava. De supetão tive de mirar os cartazes e optar por outro. ‘Branca de Neve e o Caçador’ havia estreado um dia antes, 1º de junho, e o horário era razoável. Escolhi-o. No enredo, sem novidades: era repaginação de ‘Branca de Neve e os Sete Anões’ (1937), de Walt Disney, baseado na obra irmãos Grimm, mas de atores de carne e osso, como já se fez mil e uma vezes. Como a minha expectativa era de desanimação, entrei na sala um tanto relaxado, preparado para esperar o resultado fraco. Surpreendi-me, pois a produção caprichou na direção de arte, figurino e na direção.
O diretor, aliás, veio da propaganda. Rupert Sanders deixou a publicidade pra lá e comandou o longa. E por ser estreante no ramo quis enriquecer a obra com o maior número de detalhes. Isto fez de ‘Branca de Neve e o Caçador’ um filme apreciável de se assistir, assim como as boas fitas de época.
Tudo do desenho está na tela: a rainha malvada, Ravenna (Charlize Theron), o príncipe com bom coração, William (Sam Claffin), o caçador destemido e machista (Chris Hemsworth), e, claro, a mocinha Branca de Neve (Kristen Stewart). Foram acrescentados alguns personagens, como o irmão de Ravenna, Finn (Sam Spruell) e Beith, o pai dos sete anões (Ian McShane). Aos seguidores da saga ‘Crepúsculo’, ver Kristen na pele da jovem comedora de maçãs pode soar ridículo ou desgastante, pra ser o mínimo possível. Entretanto, o carisma de Robert Pattinson não é igual ao da atriz. Ela deixa a interpretação em segundo plano porque não consegue ter outra expressão que não seja a de sempre: a boca meio aberta por conta dos dentões da frente, seu olhar morteiro, parecendo que sempre quer bocejar, e um sorriso tão contagiante como o de quem não entende a piada. Por este fim, o longa tem falhas. Enquanto Charlize, Spruell e Hemsworth reluzem, quando Kristen aparece o brilho esmorece.
O roteiro tem a intensão de nos explicar no estilo tatibitate a história tão alardeada e nem nos dá a chance de procurar outros caminhos. Evidentemente os efeitos especiais têm um toque refinado, sobretudo no ‘espelho, espelho meu...’ e na Floresta Negra, o que dão pontos à fita. Nas guerras dos povos estão outros fatores positivos. Porém, creio existir na sétima arte mais magias do que esta daí.
Respondo agora se o filme cabe para todas as idades: não. Serve para os maiores de 10 ou 12 anos por conta das cenas de luta e do teor de vingança apetitosa dos irmão peraltas. Não há sangue e mortes trágicas, com tripas aparecendo na telona. Mas convém manter as crianças longe e assistir ao clássico dos anos 30. Por falar nisto, fiquei com uma ponta de esperança sobre minha frase presente na coluna da semana passada – não podemos ficar burros: fui à casa de minha cunhada e a filha dela via exatamente esta película prima-dona dos ecrãs. Realmente, nem tudo está perdido neste mundo.
‘Branca de Neve e o Caçador’, como digo das produções medianas, ficará estocada nas lojas e será mais uma obra de prateleira. A culpa é em grande parte de Kristen e seu anticarisma. A moça da boca aberta possui o poder de desmoronar todo o esquema de Sanders. Menos, óbvio, a beleza de C. Theron, que, com ou sem a mocinha de ‘Crepúsculo’, sobressai-se na aventura. Às vezes queremos a vitória e a redenção de Ravenna. Branca de Neve com Kristen merecia sim ser a empregada sofrida.