El Pueblito (publicado originalmente em 22/5/2012)
Mel Gibson é destes apocalipses da sétima arte. De reverenciado por ‘Coração Valente’ (95) a esculhambado pelos católicos por ‘A Paixão de Cristo’ (04), o cineasta, de 56 anos (parece um pouco além dos 60) de vez em quando tenta se assemelhar à Fênix. Em ‘Plano de Fuga’ (2012), estreado na sexta-feira passada no Brasil, o ator e diretor estadunidense pula da fronteira do país de Obama para o de Felipe Caldeirón, o México. Alguns personagens da obra não têm nome, ou possuem muitos, e é o caso do de Gibson. Na verdade, ele é um ladrão de bancos. Em fuga, salta de carro o muro entre os dois países americanos e cai na terra do Chapolin. De lá vai para El Pueblito, talvez a cadeia de pior cheiro e de maior corrupção dos flancos da Terra. O impacto de Driver (vamos chamar o personagem de Gibson por este nome) ao ver os arredores da prisão é surpreendente. Lá há superlotação, tráfico de drogas de forma aberta, corrupção, maus tratos, e racionamento de comida, água e personalidade.
Algum tempo se passa e Driver se envolve com um garoto de 10 anos e a mãe. A dupla mora, isso mesmo, mora em El Pueblito e o menino está condenado a doar o seu fígado a Javi, líder do local e detentor de cirrose de dar gosto. O doador é intocável e também passa a ser protegido por Driver, e eles trocam segredos. E é pela relação que o prisioneiro consegue elaborar o plano de fuga do título.
Dirigido por Adrian Grunberg, estreante nesta toada, ‘Plano de Fuga’ contempla a maioria de seus atores de origem latina, mas também europeia. Grunberg deve ter tido bastante trabalho, e ao mesmo tempo, foi bem no propósito de comandar a tropa dos figurantes e extras da superprodução.
A fita tem um quê de ‘Carandiru’ (2004) e ‘O Beijo da Mulher Aranha’ (1985), claro, em suas devidas proporções e comparações. Trata-se de uma história interessante, para uns um pouco batida e repetitiva, mas como há personagens distintos e carismáticos, você engole e compra o ingresso. Ver Mel Gibson, por exemplo, fingindo imitar Clint Eastwood no orelhão, vale a saca. Além disto, existem sequências forçadas, porém divertidas, como a que Driver pega a granada no ar e a arremessa em uns malfeitores dentro da cadeia. Somam-se a estas pomposas características muitos tiros, sangue, iras, vinganças, revoltas e explosões. O roteiro, escrito a seis mãos – além de A. Grunberg e Gibson, Stacy Perskie – mexe com máfias de órgãos, assunto tão mal assombrado nos quatro cantos dos cinemas.
No elenco, Kevin Hernandez é a revelação. Apesar de ser seu segundo trabalho em longa, este menino conquista o público desde sua primeira aparição, pedindo um cigarro a Driver, apesar de ter somente dez anos. A empatia para com as câmeras é inconfundível e este ator promete para o futuro.
Quanto a Mel Gibson, desde as cinesséries ‘Mad Max’ (1979-85) e ‘Máquina Mortífera’ (1987-98), nada fez de aproveitável (não que esses citados fossem produções aceitáveis), incluindo-se neste panteão ‘Maverick’ (1994), ‘O Patriota’, ‘O Preço de um Resgate’ (1996) e o esquisito ‘Sinais’ (2002), no qual ele interpreta um padre místico. ‘Coração Valente’, o trabalho que lhe rendeu muitos Oscars, é um misto dos ingredientes todos. Os músculos do fortão estão ali, por todas as partes do filme. E o ator, quase sessentão, continua se aventurando por caminhos tortuosos e perigosos. Jamais entrará no rol dos grandes cineastas, seja por suas tramas brutas ou pelos personagens acéfalos. No caso de ‘Plano de Fuga’, pelo menos existe a parceria com o garoto K. Hernandez. É um filme regular. E é só.