Precisamos das legendas (publicado originalmente em 15/5/2012)
Por esses dias, li uma notícia em algum lugar e ao mesmo tempo eu já a imaginava, mas não queria crer. A informação se referia ao crescimento da audiência da rede Telecine, da TV a cabo, após o canal colocar em sua programação uma imensidão de filmes dublados. Foi coisa de 40 ou 50% de crescimento, se não estou equivocado, e o texto ainda falava sobre os motivos deste número: o claro aumento da classe C no país, e suas assinaturas das emissoras fechadas. No momento em que li esta matéria fiz a seguinte reflexão: estamos a caminho do buraco no cinema, que ainda por cima não está em um momento extraordinário, para ser carinhoso. Nada contra a classe C, a popularização de tudo e etc. Porém, nos meus botões, como diz Mino Carta, os canais por assinatura existem para levar aos telespectadores algo a mais em comparação às estações abertas. E este ‘plus’ seria, na parte da sétima arte, os longas-metragens com o som original, e legendas na parte de baixo da tela para nós que nada sabemos de inglês, francês, alemão, italiano, japonês, coreano... Agora, ao facilitar tudo com as falas em português, caímos num mato sem cachorro: de que vale a pena ter canais por assinatura então?
Não. E para você aí que está pensando que sou totalmente contra os dubladores, inclusive nas TVs abertas, desculpe por desapontá-los. Existem programas e até mesmo filmes que todos nós não sabemos ver de outro modo senão com os atores falando em português. Exemplo: Chapolin e Chaves. E devemos o sucesso a profissionais como Marcelo Gastaldi (dono da voz destes dois personagens no Brasil), Nelson Machado (Quico), Mário Vilela (Sr. Barriga), Carlos Seidl (Seu Madruga) e o grande elenco. Imaginem se o SBT se uma hora para a outra resolvesse mostrar estes seriados com as vozes originais. Além de broxante seria chato. Isto se deve ao talento exímio dos dubladores, que criaram frases e expressões que o público brasileiro está mais do que acostumado. Outro dublador admirado por mim é Darcy Pedrosa. Aos que não sabem, é quem dá voz à maioria dos filmes de Jack Nicholson dos anos 1970, 80 e 90, como ‘As Bruxas de Eastwick’ (1987) e ‘Batman’ (1989). Tenho a impressão de que jamais uma voz caiu tão bem a um ator como é o caso de Pedrosa/Nicholson. O dublador, que morreu em 1999, aos 69 anos, tem a mesma elegância rebelde do ator de ‘Laços de Ternura’ (1983).
Retorno à questão dos canais a cabo e as legendas. É o ponto destoante dos canais livres. É ali que desejamos ver as vozes reais dos atores. Têm as pessoas idosas, outras preguiçosas, dizendo: mas ler as letrinhas é muito cansativo, e eu durmo porque não suporto ter de lê-las. Respondo: então faça o favor de se satisfazer com as emissoras sem mensalidade. Aí vêm os fechados e querem por açúcar no mamão da classe C e colocam nas propagandas: Assinem nosso canal! Estamos exibindo diversos filmes dublados para você! Inclusive, muitos deles surgiram apenas para passar os dublados, como é o caso de redes Telecine e HBO. Se não bastassem os filmes, as séries também estão com pacotes em português. Por exemplo: é muito desagradável assistir a ‘Friends’ (1994-2004) dublado. É no original em inglês que estamos acostumados. SBT e RedeTV tentaram transmitir a série em português, mas o público rejeitou com audiência ínfima e foi tirado do ar. Um caso oposto a isso é com ‘Anos Incríveis’ (1988-1993) e ‘O Mundo de Beakman’ (1992-1998), transmitidos pela TV Cultura. Portanto, depende de pontos de vista. E insisto: em TVs fechadas, é incondicional a exibição de produções legendadas.
Àqueles que amam a sétima arte é um prazer tão grande apreciar a obra-prima de diretores dos calibres de sir Alfred Hitchcock, Woody Allen, Clint Eastwood, Francis Ford Coppola, Jean Luc Godard, Vittorio De Sica, enfim, os suprassumos dos clássicos e cults em suas línguas originais que sequer pensar em vê-los dublados me dói toda espinha dorsal. Também me dói demais, como escrevi tempos atrás, ver as salas de cinema exibindo em 90% da sua programação produções dubladas. Isto significa chamar o espectador de burro, tapado, idiota, desleixado. Precisamos das legendas, pessoal!