Monsieur Verdoux (1947) - Charles Chaplin
Monsieur Verdoux é um filme de 1947 que foi estrelado e dirigido por Charles Chaplin. O roteiro é do próprio Charles Chaplin e foi baseado numa ideia de Orson Welles. O personagem principal é Henri Verdoux, um dedicado bancário que trabalhou por mais de três décadas até ser demitido por causa da crise de 1929. Havia sido quebrada sua rotina de contar o dinheiro dos outros. Agora ele era um homem de meia-idade, sem emprego e sem perspectivas que decide criar um negócio próprio: casar com mulheres de meia-idade e depois matá-las para ficar com o dinheiro e as propriedades. As vítimas não são encontradas, pois Monsieur Verdoux incinera os corpos em improvisados fornos crematórios.
Galanteador e romântico, Monsieur Verdoux incorpora uma ‘persona’ diferente para cada tipo de mulher que tem que conquistar para depois fazê-las tirar o dinheiro do banco, pois é muito perigoso manter o dinheiro nestas instituições financeiras por causa da crise mundial. Monsieur Verdoux usa nomes diferentes, roupas diferentes e discursos diferentes, sempre de maneira adequada para conseguir envolver cada tipo de mulher. O mundo é cruel e as pessoas estão desesperadas, portanto ele está tomando medidas desesperadas, pois sua justificativa é dar condições de vida para a esposa paralítica na cadeira de rodas e seu filho pequeno. Monsieur Verdoux anda de trem por todo o país para cometer seus crimes. Ele vive sempre sob tensão o que afeta seu estado de espírito. Apesar do mundo cruel e sombrio, sob depressão econômica e aumento do desemprego (manchete do jornal que é lida por sua esposa), Monsieur Verdoux pensa apenas no mundo que ele ama, onde estão a mulher e o filho. No 10º aniversário de casamento, Monsieur Verdoux presenteia a esposa com a escritura da casa onde ela vive com o filho deles, visando dar segurança à própria família.
O dinheiro ganho com os assassinatos é ironicamente investido na Bolsa de Valores, mas quando esta cai, Monsieur Verdoux tem que matar mais mulheres para cobrir os prejuízos. Como em Paris ficaria difícil incinerar um corpo sem chamar a atenção, Monsieur Verdoux decide utilizar um composto de três elementos que misturados acabam provocando um ataque cardíaco na vítima de assassinato. Decidido a testar sua ideia, Monsieur Verdoux atrai, para seu apartamento, uma jovem refugiada belga que saíra da prisão, após cumprir três meses por penhorar uma máquina de escrever que era alugada. Monsieur Verdoux serve uma taça de vinho à jovem belga e está decidido a matá-la. No meio da conversa, a jovem belga revela que havia sido casada com um homem que ficara paralítico por causa da guerra e que ela faria tudo por ele, até mesmo matar. Neste momento, ao cair em si, Monsieur Verdoux tira a taça de vinho e não permite que ela a beba. Ele serve outra taça de vinho (sem o veneno) e ainda dá um pouco de dinheiro para ela manter-se em Paris.
Monsieur Verdoux, em uma de suas viagens, não consegue nem tomar o dinheiro e nem matar uma mulher que sempre dá gargalhadas espalhafatosas. Sempre o acaso o impede no último momento de completar seu plano. De volta a Paris, ele espera ansiosamente uma resposta da mulher para quem envia flores durante semanas. Na floricultura, Monsieur Verdoux é visto por um detetive que o seguia há duas semanas. Ao retornar para sua loja de móveis, que montara em Paris, Monsieur Verdoux é seguido e confrontado pelo detetive. Após ouvir todas as acusações, Monsieur Verdoux afirma que assinaria uma confissão, querendo apenas despedir-se da esposa antes de ser preso. O detetive muito feliz aceita um cálice de vinho e morre de ataque do coração durante a viagem de trem até a cidade onde morava a esposa de Monsieur Verdoux.
De volta a Paris, Monsieur Verdoux vai à floricultura e finalmente recebe, por intermédio da florista, uma carta da mulher para quem constantemente enviava flores. Após telefonar para ela, Monsieur Verdoux marca um encontro e vai a casa dela. Os dois são geniosos e sabem o que querem, pois são do signo de Áries. O discurso é rápido para envolver a mulher que aceita rapidamente marcar o casamento. Antes de a cerimônia começar, Monsieur Verdoux ouve algumas vezes uma gargalhada espalhafatosa e tenta ficar escondido em vários momentos. Para não ser reconhecido, ele é obrigado a fugir do casamento antes do início da cerimônia.
Além de ficar sem condições de obter dinheiro com mulheres em Paris, Monsieur Verdoux perde todo o dinheiro na Bolsa de Valores, após uma corrida bancária que aprofundou a Grande Depressão. A hipoteca da casa é executada e ele perde também a família. Sozinho em Paris e sem esperança, Monsieur Verdoux lê o jornal que noticia o bombardeio alemão na Espanha (provavelmente é uma referência velada a Guernica). Após sair de um Café, Monsieur Verdoux é quase atropelado ao atravessar a rua. A mulher pede que o motorista pare o carro. Ela é a jovem belga, que ele ajudara anos antes, e agora ela estava casada com um homem que tinha uma fábrica de munição cujas ações renderiam bons dividendos na Bolsa de Valores. Ela se oferece para levá-lo para jantar no restaurante do Café Royal, onde há uma pista de dança. Os dois conversam e Monsieur Verdoux não vê perspectivas do que fazer, mas ela afirma que sempre há um destino a se cumprir porque sempre há algo pelo que se deve lutar, pois a vida está acima da razão.
Durante o jantar, Monsieur Verdoux é reconhecido pela irmã de uma de suas vítimas, que está na pista de dança, e ele percebe o fato. Após despedir-se da jovem belga, Monsieur Verdoux afirma que tem um destino a cumprir e se entrega à polícia no hall de entrada do Café Royal. Durante o julgamento, o promotor acusa Monsieur Verdoux de ter um cérebro e que ele poderia ter trabalhado de maneira honesta e não matado e roubado mulheres. Em seu discurso final, antes da sentença, Monsieur Verdoux afirma que trabalhou durante 35 anos, mas depois ninguém lhe dava mais emprego. Os crimes cometidos em pequena escala não se comparam aos que acontecem em larga escala com bombas e armas matando mulheres e crianças. Condenado à morte, Monsieur Verdoux aguarda a execução. Confrontado com a típica frase moralista “o crime não compensa”, ele responde dizendo que em pequena escala o homem é um vilão, mas em grande escala torna-se um herói. O filme termina com ele caminhando em direção à execução na guilhotina.
O filme mostra um Charles Chaplin amargo e reflexivo sobre os acontecimentos anteriores à Segunda Guerra Mundial. O filme discute o moralismo dos pequenos atos e das pequenas ações individuais versus o moralismo dos grandes atos e das grandes ações de governos, empresas e de quem detém o capital. É uma crítica ao militarismo e à crise financeira mundial da década de 1930.
O filme usa um pouco de mitologia ao mostrar o personagem Monsieur Verdoux com uma lua cheia e citando Endimião. A Lua se apaixonou por Endimião, que era muito belo, Zeus ofereceu a ele escolher o que quisesse; ele escolheu dormir para sempre, para permanecer sempre jovem e imortal. No final do filme, durante o jantar no Café Royal com a jovem belga, Monsieur Verdoux diz ter acordado de um sonho, se pergunta se aquele mundo realmente existiu, pois aquele passado parecia não ter acontecido na vida dele.
O filme resgata um pouco do humor de Carlitos (famoso personagem de Charles Chaplin) nas cenas em que Monsieur Verdoux cai pela janela no início do filme, quando esbofeteia seguidamente um homem numa cena pastelão no restaurante após um show de can-can e, finalmente, quando faz os famosos trejeitos antes de cair da canoa no lago, numa de suas infrutíferas tentativas de matar a mulher das gargalhadas espalhafatosas.
No primeiro encontro entre Monsieur Verdoux e a jovem refugiada belga, eles conversam sobre o filósofo alemão Arthur Schopenhauer do século XIX. No momento em que mostra compaixão pela jovem belga e poupa-lhe a vida, Monsieur Verdoux toma consciência de si em nível radical, se experiencia como um ser movido por aspirações e paixões. Estas constituem a unidade da vontade, compreendida como o princípio norteador da vida humana.
No final do filme, a jovem belga é confrontada em sua consciência pelos acontecimentos do julgamento e, ao cair em si, percebe que a riqueza e seu conforto eram resultados de negócios que eram administrados de maneira inclemente pelo marido. Para Monsieur Verdoux, matar e roubar (no plano individual) é apenas um negócio como são as guerras e os conflitos. Estes são negócios num mundo que é inclemente. Portanto, as pessoas devem ser inclementes para lidar com este mundo. O bem e o mal não são tão claros, pois o criminoso pecador e o herói santo são figuras mais religiosas do que reais. O importante é cumprir seu destino pois sempre há algo pelo que se deve lutar neste mundo.