A corrida de cascavéis (publicado originalmente em 25/10/2011)
O script nos mostra Tattum, repórter em busca de fama a qualquer preço. Demitido de 11 jornais por 11 razões diferentes bate à porta de um pasquim de Albuquerque, Novo México. Plano: labutar ali por dois meses e conseguir o emprego dos sonhos num periódico de categoria. Passa-se um ano e Tattum está na mesma. Pior: as matérias são degradantes. Então Jacob Boot (Porter Hall), dono do jornal, o pede para cobrir a corrida de cascavéis. No meio do caminho Tattum descobre que Minosa está preso na Montanha dos Sete Abutres. Minosa invadira sem permissão a buscar relíquias indígenas. Era a maldição dos índios.
Tattum sente a vitória. A chance. Precisa ter controle. Ele reduz deliberadamente a velocidade do resgate. Ao invés de horas, porque não seis dias? Leo é forte. Tattum arma tudo: convence Lorraine (Jan Sterling), esposa da vítima, a se passar pela mulher desesperada (na verdade, ela estava prestes a largar o companheiro em busca de uma vida melhor). ‘Você quer o mesmo que eu: o dinheiro’, diz o jornalista. A lanchonete dela se fartará de turistas. Chegam cinegrafistas e jornalistas do país todo, porém C.Tattum é o homem da exclusividade, em conluio com o xerife. Pisa nos ex-colegas. A empáfia o domina. Dará certo?
A minha primeira vez com ‘A Montanha dos Sete Abutres’ (1951) era lógica: faculdade. Claro, a de Jornalismo. A história teve tanto impacto para mim que logo após o término tive duas certezas: estava no curso certo e o cinema se tornava uma paixão. Depois de muitos anos, revirei locadoras atrás do filme. Não ter encontrado-o também era lógico: a obra dos anos 50 tinha tamanha raridade impregnada nela que alguém ter o tesouro de Sierra Madre nas mãos significava não dividi-lo. Egoísmo muito bem justificado.
Então, achei ‘A Montanha dos Sete Abutres’ no site especializado. Lançamento cinco estrelas. Aí sim. Recebi em casa. Cinco minutos depois o DVD rodava aquela trama brilhante, recheada de astros e, já sabido, até hoje atual. Que delícia. Um manjar dos deuses na tela do televisor. Que bom seria se todos os longas-metragens do século 21 fossem assim. Sou suspeito a opinar sobre roteiros ligados ao Jornalismo. Amo-os. ‘A Montanha dos Sete Abutres’ é o maior deles, sem dúvida. Emociona-me cada vez que o vejo.
Dirigida pela lenda Billy Wilder (dos também legendários ‘Crepúsculo dos Deuses’, de 1950, e ‘Quanto Mais Quente Melhor’, de 1959) e roteirizado pelo próprio Billy Wilder, em parceria com Walter Newman e Lesser Samuels, além do não creditado Victor Desny (ator sem sucesso da década de 50 e só participou deste script na profissão), a obra conta o acontecimento real de Floyd Collins, o mineiro preso em uma montanha nos EUA. Em 1925, sem ser resgatado, acabou morrendo à espera de seu salvamento.
Aliás, V. Desny adquirira os direitos da aventura macabra antes de Wilder querer rodar o filme e um processo arrolou-se meses antes de ligarem as câmeras. Durante o desenvolvimento do roteiro, o caso foi solucionado em favor a produtora e Victor Desny, por isto, nem sequer surge nos créditos. Há 86 anos, Skeets Miller sagrou-se como o jornalista da entrevista exclusiva com Collins. Ganhou o Pulitzer, prêmio principal do Jornalismo até hoje. Em 1951 coube ao futuro Spartacus, Kirk Douglas, a tarefa de assumir o papel, com o nome Charles Tattum. Richard Benedict deu vida a Leo Minosa, o trabalhador encarcerado.
O incrível é que quando ‘A Montanha dos...’ foi lançado recebeu críticas negativas. Fracassou nas bilheterias. Os produtores decidiram, sem autorização de Wilder, mudar o título pra ‘O Grande Carnaval’ e relançá-lo nos cinemas, em nova tentativa de brilho. E falhou igualmente. Filme e protagonista: iguais.
Não perca de jeito nenhum ‘A Montanha dos Sete Abutres’. Obra de arte a ser admirada. E ponto.
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