Oficial ou real? (publicado originalmente em 12/4/2011)

Muito se falou e se alardeou sobre 'Rio' (2011), mais recente trabalho do carioca Carlos Saldanha, estreado sexta-feira última, dia 8. Porém, em meio à tragédia provocada por um demônio naquela escola fluminense, o colorido se transformou em preto-e-branco. Falemos do filme. Blu é última espécie macho da arara azul. Capturado na floresta amazônica ainda bebê, vai parar nos EUA, em Minnesota. Vive com Linda, sua dona, e com ela tem o relacionamento carinhoso. Algum tempo depois surge Túlio na vida de ambos. Ele é ornitólogo e descobriu ser Blu a raridade procurada. Linda e o passarinho embarcam para o Rio de Janeiro, onde está a espécie fêmea certa a Blu acasalar. É Jade, e a avezinha é o oposto de Blu. Ela preza a liberdade, o ar livre e a natureza, tudo o que o azulzinho tem medo. Travam uma batalha de egos. A aventura se inicia na verdade quando a dupla de penas é capturada por uma quadrilha que vende aves.

A maior qualidade de 'Rio' é o estrondoso esmero de Carlos Saldanha sobre os detalhes da Cidade Maravilhosa. Vemos na telona pormenores nunca antes visto em desenhos computadorizados. E reparem nas cenas na praia e na sequência final com o desfile das escolas de samba. É incrível porque chegamos a pensar se tratar de uma filmagem autêntica, e não uma mera animação. Saldanha, diretor dos sucessos 'A Era do Gelo' 2 e 3 (2006 e 2009) e codiretor de 'A Era do Gelo' (02) e 'Robôs' (05), não menos brilhantes, tem aqui seu ápice. Desenvolveu junto com sua turma processos inovadores de desenho para reprodução em 3D, um deles chamado de Ruffle Deformer. A equipe chegou a pintar cada asa de Blu para chegar até a precisão exata. O resultado é uma sucessão de homenagens ao Rio de Janeiro, algo semelhando, fazendo as devidas comparações medidas, a o que Disney fez com 'Você Já Foi à Bahia?' (1944), com Zé Carioca.

Li em algum ligar acerca das possibilidades de 'Rio' vencer a categoria animação no Oscar 2012. Pode ser. No próximo ano os cinemas verão apenas continuações de longas famosos, como 'Carros'. Mas é bom lembrar que em 2011 a Academia premiou uma sequência, 'Toy Story 3' (2010). Antes, só 'Shrek 2' havia concorrido e perdido em 2004. Assim sendo, há chances, mas não são favas contadas. O certo é que 'Rio' veio para figurar na história da animação, desta forma consequentemente mostrar ao planeta todas as belezas cariocas. A fita foi lançada dia 22 de março no Brasil. Os dubladores dos EUA estiveram por aqui e prestigiaram. Anne Hathaway, apresentadora do Oscar 2011, Jesse Eisenberg, ator de 'A Rede Social', e Rodrigo Santoro deram entrevistas e visitaram paisagens. Saldanha é reconhecido hoje como artista e seu 'Rio' ficará como o 'Você Já Foi à Bahia?' do século 21. Merecida a honraria. Justa, imparcial e elegante.

Os mais impressionantes, alusão às produções de outrora, são o balé dos pássaros e a paisagem de o queixo cair do Rio de Janeiro. Passa a ideia de que seja uma reprodução de filmagem ou fotografia dos campos verdes, florestas etc, mas não. Saldanha consegue nos impregnar de emoção. É a pintura do Brasil real, como escreveu Machado de Assis em um artigo no fim do século 19. O Brasil real nos faz esquecer do país oficial, aquele que não presta definitivamente, cheio de ouro de tolo. E não aguentamos ser tolos.

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Rodrigo Romero
Enviado por Rodrigo Romero em 12/04/2011
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