Carcaças aproveitadas (publicado originalmente em 5/4/2011)
Wagner Moura é versátil como ator. É ponto pacífico. Já viveu presidiário (Zico em ‘Carandiru’ – 2003), policial (Capitão Nascimento nos dois ‘Tropa de Elite’ – 2007 e 2010), membro de um triângulo amoroso, ao lado de Lázaro Ramos e Alice Braga (Naldinho em ‘Cidade Baixa’ – 2005), o nordestino de desconfiança afiada (Taoca no ‘Deus é Brasileiro’ – 2003) e até um apresentador de TV (‘A Máquina’ – 2005), entre outros tantos trabalhos dignos de nota. No recente ‘VIPs’ (2011), lançado dia 25 de março, o ator entra na pele de Marcelo Rocha, o deturpador de identidades que enganou meio mundo alguns anos atrás em Recife, num carnaval fora de época, quando ele se fez passar por Henrique Constantino, filho do dono da Gol. No cinema, se não me engano, é o primeiro baseado em fatos reais interpretado por Moura.
O filme caminha bem nos primeiros minutos, mas logo se percebe que o estreante diretor Toniko Melo está desprovido de força para carregar tamanha responsabilidade nas mãos. Ademais, as telas estão começando a enjoar do artista. Não é tão bom assim ficar o tempo todo rodando filme atrás de filme. Com 12 anos de carreira, Moura conta 16 longas-metragens, fora as novelas, minisséries e curtas. Em ‘VIPs’, o ator parece ligado no piloto automático. Soou-me um ajuntamento de seus antigos personagens no cinema misturados, o que ‘resultou’ em Marcelo Rocha. Ali está o caráter duvidoso de Zico, a esperança brava de Nascimento, o assanhamento de Naldinho e o medo de Taoca. Melo não obteve êxito em arrancar de W. Moura um quinto tipo psicológico digamos assim. Nesta película, somente estão as carcaças aproveitadas.
A participação do apresentador Amaury Júnior é o que há de melhor em ‘VIPs’. Posso assegurar. Fazendo aquela caricatura de si próprio, cheio de botóx, o jornalista da RedeTV! está em cena para gozar dele mesmo, afinal foi enganado por Rocha naquele carnaval pernambucano, o que deixa demonstrado a total falta de informação por parte de Amaury e equipe. A estada em frente às câmeras dura pouco, mas é o suficiente a termos a certeza de que a fita acaba ali. Evidentemente, ‘VIPs’ tem os instantes bons. Banã, o traficante que emprega Marcelo como piloto a levar drogas e armas (Juliano Cazarré) tem impregnado no corpo a comicidade. Os seus palavrões em espanhol fazem algumas cócegas, porém tudo passa rápido. E qual a razão de escalarem Norival Rizzo, dos papéis infantis na TV Cultura, para ser o pai de Marcelo?
Outra peça fora do lugar é Roger Golbeth. Fica a pergunta: ele foi ator um dia? E o que representa o topete louro em sua cabeça? Simplesmente dispensável responder. A veterana Gisele Fróes como Silvia, a mãe do delinquente, possui lampejos de qualidade. No saldo total creio ser dela o número mais positivo. Aqui ponho mais uma questão: por que com tantos defeitos ‘VIPs’ ganhou quatro prêmios no Festival do Rio de Cinema (filme, ator para Moura, e coadjuvantes para Jorge D’Elia e Gisele)? Desvencilhar Moura do Capitão Nascimento a cada dia fica mais complicado. Culpa dele que eternizou o personagem em dois longas brilhantes. No resto, sabemos que Marcelo segue preso e que duas semanas atrás foi entrevistado, via holografia, por Hebe Camargo em seu programa. Ah, sim, a apresentadora está na RedeTV! também.
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