Naquele 1o. de maio morreu Senna (publicado originalmente em 7/12/2010)
Dei um espaço entre os filmes 'que vendem ingresso' e aqueles de qualidade nesta semana. Vi o documentário 'Senna', sobre o melhor piloto de Fórmula 1 que o Brasil já produziu. E me desculpem, por favor, os fãs de Emerson Fittipaldi e Nelson Piquet, e tampouco os admiradores (há alguns?) de Felipe Massa e Rubens Barrichello. Dirigido por Asif Kapadia e rodado totalmente no Reino Unido, 'Senna' é didático e regular na trajetória do ídolo. Enfatiza bem os desentendimentos entre ele e Alain Prost, o piloto francês e maior rival. Trata-o como vilão e desonesto. Linear, a fita mostra imagens do namoro do brasileiro com as apresentadoras Xuxa (é o primeiro filme que vi com ela dotado de boa qualidade), Adriane Galisteu. Há também imagens raras de arquivo familiar, outras de bastidores das corridas, como as reuniões polêmicas feitas com pilotos e o então presidente da FIA (Federação Internacional de Automobilismo), Jean-Marie Balestre (francês como Prost – resultados são exibidos no longa, dando a entender que Ayrton Senna foi prejudicado várias vezes), antes de todas as provas.
Aos 38 anos, o londrino Kapadia acerta na maioria da realização. Foi boa a sacada de somente por a voz dos entrevistados, sem colocar as imagens. O modo 'escolar' de duração é mais um ponto positivo: a história começa em 1979, com Senna no kart, e termina em 1o. de maio de 1994, quando o piloto morre tragicamente em um acidente na pista de Ímola, Itália. Os depoimentos vão de Alain Prost, passando por Reginaldo Leme, até a irmã Viviane Senna e de comentaristas de Fórmula 1 da emissora de TV ESPN internacional. O documentário escancara, de forma reservada – estilo Senna – se é que isto é possível, a paixão incontrolável do brasileiro pelas vitórias. Há uma frase de Prost que descortina isto de maneira exemplar: 'Ele acha que nunca vai morrer e põe em risco os outros pilotos.' São mostrados ano a ano, 1985 a 94, as temporadas da F. 1: desde o início na fraca Toleman (na qual Senna conseguiu o inacreditável segundo lugar em Mônaco) até sua despedida nas estranhas corridas que fez pela Williams, já no ano de sua morte, onde ele não completou uma corrida sequer.
Sempre gosto de testar as pessoas perguntando a elas onde estavam ou o que faziam em alguma data. Quando questiono sobre o Dia do Trabalho de 1994 todos se recordam. Uns almoçavam, outros assistiam a prova deitados no sofá etc. Eu na época estava com 12 anos e me lembro do momento da batida de Ayrton Senna. Não dei importância porque não era fã de Fórmula 1 nem de Senna. Porém o instante em que foi anunciada a morte dele está até hoje em minha memória. Foi o repórter Roberto Cabrini no Fantástico da Globo, à noite, o responsável por nos informar: 'Morreu Ayrton Senna. Uma notícia que ninguém gostaria de dar. Morreu Ayrton Senna da Silva.' A frase foi exatamente esta. As homenagens ao atleta foram infinitas. De programas especiais até arquivos das emissoras revirados. A obra de Kapadia põe tudo isto na telona e é difícil segurar a emoção, principalmente quando o pai e a mãe dele, Milton e Neyde, surgem no velório. Incomensurável a perda, Senna é hoje ídolo eterno.