Ficou no ar (publicado originalmente em 4/2/2010)
‘Amor Sem Escalas’ estreou e nota-se nele dois pontos substanciais: a atriz Anna Kendrick mostra finalmente todo o seu talento (ela não pôde fazer isso em ‘Crepúsculo’–2008 e ‘Lua Nova’–2009) e George Clooney se fixa como um dos atores mais lineares e regulares deste ecrã. Impressiona sobremodo a maneira como o ator tem faro para participar de filmes com bastante qualidade nos últimos anos, o que é raro, pois atores costumam deslizar em algum momento. Mas G. Clooney não... A crítica saboreou-se com ‘Boa Noite e Boa Sorte’ e ‘Syriana’ (ambos de 2005), ‘Conduta de Risco’ (2007) e ‘Queime Depois de Ler’ (2008). Agora surge o ‘Amor Sem Escalas’.
E o que dizer de Anna Kendrick? Aos 24 anos, esta mignon de 1,56 metro rouba praticamente todas as cenas em que aparece. Todas mesmo. Seu rosto angular e a fala concentrada, além de seu nariz arrebitado, dão à personagem Natalie Neener um aspecto ao mesmo tempo de ‘patricinha’ e de menina desajeitada. O diretor Jason Reitman (o mesmo dos excelentes ‘Juno’–2007 e ‘Obrigado por Fumar’–2005) soube manobrar bem todas as características de Anna. Passou a Natalie a feição da executiva do século 21: frases bem ditas, velocidade de pensamento ritmada e raciocínio muito bem distribuído. Porém, as pessoas têm problemas e ‘Amor Sem Escalas’ revela-os para os espectadores.
A fita trata de solidão. Ryan Bingham (Clooney) é o agente de uma empresa especializada em demitir funcionários de outras empresas. Assim, dos 365 dias do ano, passa mais 300 viajando. Não tem casa nem carro – tudo é alugado e ele vive nos aviões. Está acostumado a desesperos, choros e qualquer outro tipo de reação dos empregados que demite. Por isso, tornou-se uma pessoa fria e que não liga muito para família e tem pavor em se casar. Mas eis que aparece Natalie, a estagiária desta associação que Ryan trabalha. Ela possui uma ideia inovadora: videoconferência para as dispensas. Desta forma, ninguém mais precisa viajar. A economia seria estupenda e o pessoal ficaria contente.
Ryan enxerga nisto um risco à sua boa vida. Caso seja implementado, ele não mais estaria nos ares praticamente o ano inteiro. A mesa de sua sala no escritório seria a rotina. Teria de fincar casa e carro. Então, para mostrar à jovenzinha o quão importante são os contatos que faz pessoalmente, ele leva Natalie a conhecer o cotidiano do trabalho. Ensina a ela os meandros da profissão e a testa em algumas demissões. Enquanto isso, Ryan tem tempo para ‘manter’ o relacionamento com Alex Goran (Vera Farmiga, de ‘Os Infiltrados’–2006), uma executiva que também passa muitas horas em aviões. Encontros e desencontros acontecem em ‘Amor Sem Escalas’ e é isso que prende o público.
Reitman por pouco não fez deste longa-metragem uma estreia fracassada. Escreveu o script em 2002, mas não o rodou. A crise econômica mundial de 2008 chegou a ele teve de mudar o tom da obra. Sorte. Se tivesse lançado a fita há oito anos, seria um fracasso. A economia estava forte e ninguém se aventuraria a ver uma história sobre dispensas e despedidas. Agora, a película veio bem a calhar. E com exceção dos atores, a maioria dos depoimentos dados em ‘Amor Sem Escalas’ são realmente de pessoas que passaram pela situação de serem demitidas. Encarando a câmera como se fosse os patrões, tiveram a chance de gritar, esbravejar ou simplesmente dizer ‘obrigado por tudo’.