Corman ensinando (publicado originalmente em 17/9/2009)
Jack Nicholson buscava alguns trocados em 1963. Sequer havia completado sua primeira década de carreira no cinema e em televisão (isso mesmo – ele já trabalhou em diversas séries de TV sem qualquer sucesso nos anos 1950 e 1960). De 1958 a 1963 rodara sete longas-metragens, todos em filmes B, como, por exemplo, ‘A Pequena Loja dos Horrores’ (1960) e ‘Terra Partida’ (1962). Caminhando ao lado dele, o diretor Roger Corman também engatinhava na profissão, mas era mais experiente. Entre 1955 e 1971 ele comandou nada mais, nada menos, do que 52 filmes! Média de mais de três películas a cada 12 meses. Os dois tinham trabalhado juntos em ‘A Pequena Loja dos Horrores’, cuja participação de Nicholson é de só uma sequência em um consultório de dentista. Há 36 anos, ambos se reuniriam novamente para mais duas produções: ‘Sombras do Terror’ e ‘O Corvo’. Na coluna de hoje dedicaremos o espaço ao primeiro deles.
No Brasil, ‘The Terror’ (título original) teve várias nuances no nome. Atualmente é vendido com os títulos ‘O Terror’ e ‘Sombras do Terror’ pela Internet. Mas isto é o que menos importa. Debrucemo-nos no relevante serviço prestado por Nicholson e Corman à história da sétima arte voltada aos trabalhos B. E não só por eles. ‘O Terror’ tem no elenco Boris Karloff, o decano em filmagens deste naipe. Aos 26 anos, Nicholson interpreta Andre Duvalier, um soldado do grupo de Napoleão Bonaparte que se perdeu do resto do exército do francês. Ele cai em uma ilha assombrada e logo começa a ter visões da bela Helene (a atriz Sandra Knight, na época casada com Nicholson há pouco mais de um ano). O militar encontra abrigo no casebre da velha Katrina (Dorothy Neumann), mulher misteriosa que usa seus métodos de bruxaria para conseguir os intentos. Mas Andre persegue Helene e esta o leva ao castelo do medonho Victor Frederick Von Leppe, o barão viúvo (Karloff). A partir daí, uma série de reviravoltas acontece neste confuso roteiro escrito pelos estreantes Leo Gordon (que também era ator) e Jack Hill (que se tornou diretor no período).
Na biografia não autorizada de Jack Nicholson redigida por Philip Durant em 1991, o autor narra as peripécias de se filmar com Corman. O diretor era de uma generosidade tamanha que suas filmagens mais serviam como aulas de cinema, um estágio nobre, a de fato uma filmagem comprometida com a qualidade da obra e a estética. Isto pode ser comprovado quando se sabe que ‘O Terror’ teve cenas dirigidas até pelo próprio Nicholson e por Hill e ainda por um novato Francis Ford Coppola, então com 24 anos. Claro, tudo sob a supervisão e os olhares atentos de Corman. Fica evidente que o mestre dos filmes B estava muito mais preocupado em ensinar a realizar obras de grande escala. Por seu trabalho, artistas do calibre de Tim Burton (de ‘Batman’ – 1989), Jonathan Demme (‘O Silêncio dos Inocentes’ – 1991), John Landis (diretor do clipe ‘Thiller’, de Michael Jackson, e de ‘Um Lobisomem Americano em Londres’–1981), e Robert de Niro e foram lançados ao mundo das artes. Isto mostra o quanto Roger Corman compartilhava seu talento.
E não é importante se ‘O Terror’ e a maioria de suas obras são rodadas com pouquíssimo dinheiro e em pouquíssimos dias. O que valia para Corman, hoje com 83 anos e sem dirigir películas desde 90 – ele ainda produz (está por trás de quase 400 filmes!) – era montar cenários, ligar as câmeras e dizer: ‘Ação!’