Hill, Newman e Redford (publicado originalmente em 23/4/2009)

Quatro anos depois do sucesso de ‘Butch Cassidy’ (1969), o diretor George Roy Hill reuniu outra vez a dupla Paul Newman e Robert Redford para um filme. Hill percebera que ambos davam liga. Tinham entrosamento. Contracenavam magnificamente. Nas sequencias, não queriam se sobrepor ao companheiro e atuavam como se deve atuar: como um time de futebol, onde os melhores passes quase sempre dão em gols lindos. Havia neles esta recíproca troca, o respeito. Duas gerações que tinham algo a oferecer a todo o público. Assim, em 1973 foi lançado ‘Golpe de Mestre’. A função dos dois atores praticamente nada se alterou da filmagem anterior. Newman interpretaria o espertalhão charmoso, já cinquentão. Redford era o ‘boa pinta’. Aos 37 anos, estava no auge da beleza. A sorte profissional lhe sorria. Rodaria ótimos longas como ‘Todos os Homens do Presidente’ (1976). A carreira como diretor aflorava com primorosos scripts, por exemplo ‘Gente como a Gente’ (1980), ganhador do Oscar de melhor filme. Era ‘o ator do momento’.

Newman, por seu lado, tinha a bem-querência dos espectadores há muito. Contava 48 anos e levava na bagagem clássicos do porte de ‘Gata em Teto de Zinco Quente’ (1958) e ‘Cortina Rasgada’ (1996), no qual foi dirigido pelo sir Alfred Hitchcock. Possuía carisma. Esbanjava graça, sedução, fascínio, encanto.

A trama de ‘Golpe de Mestre’ se passe em Illinois no ano de 1936. Johnny Hooker (Redford) é um tranbiqueiro nato. Vive de pequenos golpes para sobreviver, mas está cansado da vida de mínguas. Quer arranjar uma trapaça alta e desta forma ganhar milhões. É quando esbarram, sem perceber, num capanga de Doyle Lonnegan (Robert Shaw, ator que ficou conhecido por seu papel em ‘Tubarão’ – 1975) e tiram dele uma grande quantia em dinheiro. Lonnegan fica sabendo e corre por vingança. Assassina o parceiro de Hooker. Este consegue escapar da cova e procura na cidade por Henry Gondorff (Newman), um antigo golpista que está aposentado. Na verdade, mergulhado na bebida e na vagabundagem. A cena de encontro dos dois é antológica. Hooker entra na casa de Gondorff e o encontra roncando, caído no chão ao lado da cama e pergunta: “Este é o famoso?”. Depois de pequenas tiradas entre um e outro, o mais velho decide auxiliar o novato na estripulia contra Lonnegan. Fica formada a cilada: um busca vingança ao outro. E os dois lados são capengas, pois nem um está do lado do bem. É nisto que o filme se diferencia e ousa muito.

A fita tem várias reviravoltas. Quando se pensa que alguém mente, ele diz a verdade. Se você acha aquele personagem amigo de Hooker, ele está a serviço de Lonnegan. Se Gondorff planeja o maior golpe do milênio e quer contar com a ajuda dos companheiros, será mesmo que eles toparão sem delatar tudo ao inimigo? São questões indecifráveis à primeira vista, maleáveis mais tarde. ‘Golpe de Mestre’, por tantas qualidades, não ficou de fora do Oscar. Indicado a dez categorias, ganhou sete: filme, diretor, direção de arte, figurino, edição, trilha sonora e roteiro original. Poderia levar as três restantes: ator (Redford), som e fotografia. Superou ‘Butch Cassidy’, apesar de a música ‘Raindrops Keep Fallin’ on My Head’, cantada por B.J. Thomas, na cena de Newman andando de bicicleta ser inesquecível aos nossos ouvidos até hoje...

Uma curiosidade de ‘Golpe de Mestre’ é a caracterização do personagem de R. Shaw. Poucos dias antes do início das filmagens, ele torceu o tornozelo. Ao invés de pedir uma licença dos sets, preferiu, de forma acertada, incorporar seu andar manco ao seu Lonnegan. Ficou perfeito. Com aquele bigode fininho, cabelos engomados e os passos tortos, deu ao personagem um ar maligno, mas ao mesmo tempo cômico, caricato e burlesco. Mais um dado da película: o papel de Hooker foi oferecido a Jack Nicholson, que não aceitou por estar envolvido nos roteiros de ‘A Última Missão’ (1973) e ‘Chinatown’ (1974) – nestes dois trabalhos ele receberia a indicação do Oscar de melhor ator. E, finalizando a lista de fatos inusitados, o maior deles: Redford viu pela primeira vez ‘Golpe de Mestre’ em 2004, 31 anos após o fim da gravação.

Nas finanças, conquistas. Com orçamento baixo aos padrões dos EUA – US$ 5,5 milhões – o filme arrecadou, somente lá, US$ 156 milhões. Tudo, claro, devido ao talento do trio Hill, Newman e Redford.

Rodrigo Romero
Enviado por Rodrigo Romero em 27/09/2009
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