Quinteto macabro (publicado originalmente em 8/8/2007)
Não apenas pelo sobrenome famoso no meio cinematográfico, Sofia Coppola arranjou para si a qualidade básica de todo diretor de cinema: a atenção. Apesar de seus 36 anos, sua carreira é extensa e de qualidade idílica. O pai dela, Francis Ford Coppola, levou a filha, ainda bebê, aos sets de, nada mais, nada menos, que “O Poderoso Chefão” (1972). Inclusive fez pequenas pontas tanto no primeiro como no segundo filme (de 1974) também. Os ares paternos fizeram bem a ela. Em 1990, coadjuvou a terceira e última parte da história da família Corleone, sem catalisar seu trabalho, que foi bastante criticado. Seis anos mais tarde, montou o curta-metragem “Cama, Banheira e o Outro Mundo”. Com ele, estreava como diretora. Em 98, outro curta: “Lamba a Estrela”. Sem delongas, o longa-metragem não tardou. Com o pai produzindo (leia-se ‘dar dinheiro para’), “As Virgens Suicidas” estreou em 99. A história das cinco irmãs Lisbon é impressionante, forte, revel e carregada de sonhos entrecortados.
Cecília, Therese, Bonnie, Mary e Lux tinham, de uma para outra, pífios 12 meses de diferença na idade, que variava entre 13 e 17 anos. O roteiro, de Sofia e Jeffrey Eugenides (autor do livro com mesmo nome), trata a história na década de 1970. Os pais das moças, senhor e senhora Lisbon (atores James Woods, Kathleen Turner), educam-nas de maneira rigorosa. O quase celibato inclui vigilância atemporal, cobranças ríspidas e superproteção. Cecília, a mais jovem do quinteto, não suporta tanta perseguição e comete suicídio, numa seqüência de cenas de atar qualquer garganta, por mais fria que ela seja. O abalo, ao invés de alijar o ninho Lisbon, o retrai mais ainda. E piora quando Lux (Kirsten Dunst, a Mary Jane dos filmes “Homem-Aranha”), a mais velha, pernoita em um campo de futebol com namorado após ambos se embebedarem na festa da escola onde estudam. A mãe exige que elas queimem seus discos de rock and roll e proíbe qualquer passeio, a menos que os pais estejam juntos.
Em “As Virgens Suicidas” há formas pulcras de mostrar muita sensualidade, recato, vingança e romance. Enquanto ‘presas’, as quatro irmãs restantes são atiçadas por outro quarteto de garotos das ruas vizinhas a se ‘liberarem’ ao amor. Lux é a mais espevitada. No telhado de sua casa, recebe todos os meninos possíveis para uma ‘conversa’ íntima a dois. Para este tipo de cenas, bem como em outras em que a personagem de Kirsten Dunst aparece fumando, Sofia teve de ser polida, já que a atriz tinha 17 anos. Hanna Hall (Cecília) contava 15. Chelse Swain (Bonnie), 16 (na vida real, é irmã da atriz Dominique Swain, protagonista de “Lolita”, de 1997). A. J. Cook (Mary), 21 (era a mais velha). O cuidado precisava ser redobrado para trama, pesada demais. A herdeira de Francis Ford Coppola fez jus ao sobrenome e esgrimiu-se bem. Não se sabe até que ponto Francis auxiliou e aconselhou Sofia durante as filmagens. Seria curioso: pai superpresente, semelhante às páginas transpostas à telona.
A fita passou quase ignota quando em cartaz. Rapidamente virou cult, em razão, pode ser, de “Encontros e Desencontros” (2004), filme dirigido por Sofia afamado mundialmente por concorrer a vários Oscars, dentre os quais na categoria diretor para a própria Sofia, e por ter afirmado a carreira de Scarlett Johansson. “Maria Antonieta” (2006), a mais recente obra de Sofia, ficou com a estatueta de melhor figurino. No entanto, fez menos sucesso que seus demais trabalhos. “As Virgens Suicidas” não vingaram na principal festa da Academia. Porém, desses roteiros apresentados anteriormente, o do longa de 1999 se destaca pela qualidade nédia e lustrosa. É narrada com flash backs pelos garotos que, quanto mais discutem os possíveis motivos que levaram as irmãs a se desfazerem da vida, mais ficam confusos e dolorosos pela saudade inconteste. Assim, o quinteto macabro deixa rastros, incita conversas... Sofia pisou com o pé direito no seu começo como diretora. Segue adiante neste caminho.