A dupla de Eastwood (publicado originalmente em 25/7/2007)
Na entrega do Oscar deste ano, cuja festa premiou destaques cinematográficos de 2006, os dois filmes de Clint Eastwood se deram mal. Tanto as “Cartas de Iwo Jima” (melhor edição de som) como “A Conquista da Honra”. Só vi as duas fitas na semana passada. Confesso que, depois de vibrar com “Os Imperdoáveis” (1992), “Sobre Meninos e Lobos” (2003) e “Menina de Ouro” (2004), todos eles dirigidos por Eastwood, me decepcionei com os dois trabalhos dele do ano passado. Ambas as obras são longas e cansativas demais para o público que, em 98, se deleitou com, por exemplo, “O Resgate do Soldado Ryan”, de Steven Spielberg (associado a Eastwood nos filmes de 2006). Há, não poderia deixar de ser, sangue, pedaços de corpos e barulho demais. Em “A Conquista da Honra”, de altos 132 minutos, a semelhança com “O Resgate do...” é impressionante. Além de o assunto ser o mesmo, os tempos da Segunda Guerra Mundial, a tragédia em si envolve pouco. Não empolga como deveria ser.
“Cartas de Iwo Jima”, ao contrário, consegue ser mais humano em seu conteúdo. Dedica-se a maior parte da duração (140 minutos) a narrar de forma contida os dramas e tristezas pelos quais os soldados orientais passaram na batalha de Iwo Jima, em fevereiro de 1945. Há nele relatos sobre os planos do exército japonês de se sustentar com a bravura patriótica somente. Eram milhares de norte-americanos contra centenas de olhos puxados, para ser didático. As mortes no Japão se multiplicaram por dez, 100, 300. E a fita retrata isso ferozmente. A explicação para a depreciação dos dois longas é simples: o fato de Eastwood ter se debruçado a eles simultaneamente. Lidou com elencos diferentes, locações distintas e orçamentos discrepantes (55 milhões de dólares para “A Conquista da Honra” e 15 milhões para “Cartas de Iwo Jima”). Mesmo se considerarmos o extremo trabalho do diretor, não há quem agüente duas superproduções deste quilate. Clint Eastwood sucumbiu à atenção desgastada.
Aos 77 anos, completados em 31 de maio, Eastwood se firmou talentosamente nos seus dois ramos de atuação: diretor e ator. Foram mais de 20 longas-metragens sob sua batuta desde 1971 e 40 e tantas como intérprete. Iniciou sua biografia profissional nos westerns, faroestes, principalmente os coordenados por Sérgio Leone. Ator de fisionomia bruta e rude, com o semblante marcado por rugas e insatisfação, somado a altura dantesca (1,91 metro), Eastwood foi, filme a filme, se ‘comportando’ na cadeira de diretor. Nas duas primeiras décadas neste tipo de trabalho, apenas “Bird” (1988) obteve aclamação da crítica. Forest Whitaker como o saxofonista Charles Parker empolgou na trama. Com “Os Imperdoáveis”, ao lado de Gene Hackman no elenco, estourou como grande sucesso. Os Oscars de filme a ator (Hackman) alavancaram a carreira de Eastwood diretor, o que se confirmou de forma merecida com “Sobre Meninos e Lobos” e “Menina de Ouro” (melhor filme, atriz, ator coadjuvante).
A mão dele à direção não foi amputada para “A Conquista da Honra” e “Cartas de Iwo Jima”. O destaque negativo recai sobre o tema. Ademais, a dupla Eastwood – Spielberg queria por na telona histórias que os contagiaram. E o fascínio pela Segunda Guerra Mundial e seus desdobramentos são roteiros e pratos cheios para eles. As obras de 2006 têm o requinte clássico do ex-homem do western. Percebem-se manobras detalhadas, esmero na escolha dos atores (os de uma fita não estão na outra) e intenso manejo das cenas aonde a pessoa é quem importa. Em “A Conquista da Honra” isso é raro, já que contatos pessoais são praticamente inexistentes. Estes acontecimentos, no entanto, não maculam a imagem de realizador de Eastwood. Para 2008, “A Criança Trocada”, com Angelina Jolie e direção dele, promete retomar os sentimentos emotivos de “Menina de Ouro”. Será a 29ª fita tocada por Clint Eastwood, o “sério fiel”. E ele está longe, podem ter absoluta certeza, de pendurar os rolos de filme.