Para o gasto (publicado originalmente em 31/1/2007)
“O Amor não Tira Férias” (2006) tem muitas passagens semelhantes a “Perto Demais” (2004). Ambas têm um quadrado amoroso – Kate Winslet, Cameron Diaz, Jude Law e Jack Black na fita do ano passado e Natalie Portman, Julia Roberts, Jude Law e Clive Owen na outra –, as duas possuem Jude Law em cena, existem cruzamentos de casais, e, finalmente, têm sob os bastidores diretores que sabem conduzir enredos deste tipo: Nancy Meyers em “O Amor não Tira Férias” e Michael Nichols em “Perto Demais”. Mas há as diferenças desproporcionais entre a dupla de longas-metragens. A de 2006 é bem mais tranqüila e light em comparação com a outra, um tanto rude, mais real e com atores em outro nível de inspiração e superação. Na trama conduzida por Meyers, tema da coluna de hoje, as personagens de Winslet e Diaz (respectivamente a jornalista frágil Íris e a produtora de trailer para filmes Amanda) se conhecem em um site de trocas de casas e combinam de uma passar uma semana na vida da outra. Vale tudo: casa, empregados, carros, roupas, utensílios, mordomias etc. Então, Íris vai a Los Angeles viver no paraíso de Amanda: mansão imensa, piscina idem, carros último tipo, os empregados sempre dispostos, toda a espécie de conforto possível e imaginável. Já Amanda, não...
Em um bairro superdistante de Londres, um pequeno vilarejo, a cineasta se depara com o chalé de Íris: mal cuidado, com tudo para fazer, um frio impressionante, cômodos bem apertados e um cão à beira de um ataque de nervos. Porém, esta troca de vidas tem motivos: Íris estava sofrendo por ter o amor platônico por Jasper (Rufus Sewell), colega de trabalho dela que se casará em breve; Amanda é o contrário: culpa-se por não conseguir chorar desde a adolescência, é fria com as pessoas e está bem cansada da rotina estressante que leva no trabalho. Nas mudanças da dupla, uma quer esquecer o não-correspondido amor, a outra quer descansar e dormir sete dias seguidos. Os planos se alteram. Íris é surpreendida por conhecer Arthur Abbott (Eli Wallach – para mim, o grande destaque do filme), ex-roteirista de Hollywood, de 91 anos. Decepcionado com a indústria do cinema, ampara a jornalista e a trata como se fosse sua neta postiça. Íris ainda fica amiga de Miles (Jack Black), colega de Amanda na produção de trailers para filmes e trilhas sonoras. Amanda, em contrapartida, fica espantada com Graham, um bon vivant acostumado a baladas e (surpresa!) o irmão de Íris. Amanda e Graham ficam juntos na noite em que se conhecem. Enfim, um descompromisso. Mal sabe ela das conseqüências...
Nancy Meyers, responsável também pelo roteiro, é a diretora do melódico “Alguém tem que Ceder” (2003), com Jack Nicholson e Diane Keaton (indicada ao Oscar por este trabalho) no elenco. A história estilo ‘dá para o gasto’ era a mesma que terminava bem igual: felizes, contentes, reunidos. Reparem que até os cartazes de divulgação de “O Amor...” e “Alguém...” são parecidíssimos!
“O Amor não Tira Férias” tem todos os ingredientes de um filme padrão. Para mim, o happy end não funciona nestes casos. Em “Perto Demais”, citado aqui como uma cópia diet de “O Amor...”, quem já assistiu sabe sobre o que me refiro. Nancy desperdiçou a chance de mudar sua performance. Neste filme, dá para sentir que ela deixou para escanteio o momento de exigir um pouco mais de seus comandados, principalmente com a atriz Cameron Diaz. Na fita, parece que vive ela própria, mas ao invés de ser atriz, é produtora de trailers. “Eles me pagam para isso”, ela repete umas duas vezes durante o longa. Quem vir “O Amor não Tira Férias” notará a participação especial e engraçada de Dustin Hoffman numa locadora de vídeos. E há a bela homenagem ao cinema com o personagem de Wallach. No intercâmbio de casas, nas desilusões amorosas, o público se diverte “para o gasto”...