Literalmente melado (publicado originalmente em 4/10/2006)

O filme tema da coluna de hoje não foi um fenômeno de bilheteria. Nem tampouco um enredo inédito ou incrível. E também eu mesmo gostei pouco, mas gostei. Em “Chocolate” (2000), não estão atores de quem seja fã. Mas estes artistas têm alguma categoria. Johnny Deep, Judi Dench, Juliette Binoche, Alfred Molina e John Wood compõe o elenco. A fita é típica dos contos de fadas. Em uma pequena cidade da França, onde a população é fervorosamente religiosa e dominada por um prefeito de mesmo estilo (Molina), uma jovem mãe solteira (Binoche) chega para montar uma confeitaria. Ou melhor, a chocolataria. Ela aluga uma casa abandonada. A proprietária (Dench), uma senhora muito ranzinza, tem problemas familiares escondidos. A loja de Vianne Rocher (talvez uma referência bem explícita àquele chocolate famoso, pelo sobrenome), entretanto, tem tudo para dar errado. Ela fica em frente a igreja da cidadezinha. As freqüentadoras das missas apostam no seu fracasso. Essa certeza se concretiza mais ainda quando o conde de Reynaud, o prefeito, desdenha da doceria e a boicota, com a ajuda de suas seguidoras. Mas Rocher possui um talento escondido: na fabricação de chocolates, a moça adivinha os gostos mais íntimos de cada freguês. Para o casal frio, uma dose de pimenta para a relação ficar melhor. Para Amande Voizin, a proprietária, o chocolate quente para ela se soltar mais.

O diretor Lars Hallstrom, o mesmo de “Regras da Vida” (1999) e “Um Lugar para Recomeçar” (2005), não teve (ou não tem) criatividade para escolher seus trabalhos. Esses dois citados, mais o da coluna de hoje, têm um círculo parecido: histórias doces, com dramas curtos e soluções meio à toa. Ou seja, roteiros que empolgam pouco e logo são esquecidos. “Chocolate” é todo desenrolado desse jeito. O espectador tem a noção de como a trama se desamarrará. É óbvio que a chocolataria fará um sucesso grande. Está na cara ainda a bela receptividade da confeiteira quando desembarca na cidade o pirata Roux (Deep), que leva a vida quase de modo igual a ela. Nestes passos, Hallstrom imita seu outro filme, “Regras da Vida”. Com quem o protagonista ficará? No caso do filme de sete anos atrás, era Homer Wells (Tobey Maguire) quem estava indeciso. Agora, é Rocher. Para ela, há três opções: ir embora sozinha da cidade com a filha, ficar lá até que a geração seja passada para frente ou seguir a caminhada de Roux, rumo a sabe-se lá aonde. É evidente que existe no filme um atrativo diferente de todos os outros: o chocolate. As receitas exploradas por Vianne Rocher é o chamariz para toda a população. A película é a aceitação disso tudo. O duelo com o conde vem em segundo plano porque o personagem de Molina é pouco explorado. Entretanto, o ator se destaca por sua boa performance.

É um longa-metragem literalmente melado. De todos os lados. Hallstrom é um diretor de fitas meladas. Com ele, criatividade praticamente não tem vez. Basta o espectador analisar seus trabalhos já mencionados. Penso que atualmente roteiros desse tipo precisam parar. A época de histórias com o sentido tão doce passou. Isso serviu bastante nos anos 1940 e 1950. Hoje não mais. Em nossos dias, tem espaço longas como “Menina de Ouro” (2004), ou “Perto Demais” (2004). Exibem situações de força extrema, exigem do ser humano seu mais íntimo sentimento. Nada de mentiras. O tempo das mãos dadas passou para a sétima arte. A beleza é conquistada pela firmeza, não pelo romantismo e o pieguismo. Adianta pouco o disfarce de Chapeuzinho Vermelho de Rocher e Anouk em suas idas e vindas de vilarejo em vilarejo. É pouco. Essa associação está longe, mas bem longe, de dar a virada em algo. Coragem e ousadia têm de ser regra, nunca exceção. O fim de “Chocolate” podia ser outro, claro. Mas por culpa do diretor, isso não ocorreu. “Chocolate” é o típico filme que ‘poderia ser, mas não é’. Poderia ser espetacular, mas é somente mediano. Poderia causar um estouro nas salas, mas só causa uma ou outra emoção. Por não querer se comprometer de fato, cai no ostracismo. Portanto, será pouco lembrado. E eu me lembrei desse filme, vejam vocês, apesar de nem gostar tanto de chocolate.

Rodrigo Romero
Enviado por Rodrigo Romero em 04/08/2009
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