As histórias de Forrest (publicado originalmente em 22/3/2006)
Acreditem ou não, vi “Forrest Gump” (1994) pela primeira vez no fim de semana que passou. E, claro, me encantei com as histórias contadas pelo personagem de Tom Hanks. São várias décadas da trajetória dos Estados Unidos com a participação do jovem de QI baixo. Passa pelo governo de John Kennedy, escândalo de Watergate nos anos Richard Nixon, mais Lindon Johnson, George Bush pai, o homem na lua etc. Em cada situação, Forrest Gump, nome dado pela mãe para homenagear um herói norte-americano da Guerra Civil, coloca seu dedo. São sensacionais as belas sacadas dadas pelo diretor Robert Zemeckis. Em 1994, efeitos visuais não possuíam toda a maquinaria de hoje em dia e eram mais humildes. Mas todos movimentos labiais dos comandantes dos EUA são extraordinários. Johnson pedindo a Gump para ver onde havia sido um ferimento da guerra do Vietnã é demais para os puritanos do norte. E o resultado do pedido, idem. Considero Forrest Gump um bom sujeito, muito desajeitado e bastante carismático. Ambos os adjetivos se completam nesta fita. Não fosse assim, a figura de Jenny, a garota que cresceu e viveu com ele, passaria em branco na trama. Interpretada na fase adulta por Robin Wright, Jenny aparece em momentos que Gump tem dúvidas sobre seu destino. Um assunto totalmente vinculado a ele. Que o intriga.
Destino este tão debatido com a mãe, a senhora Gump (a sempre competente atriz Sally Field). Jenny percorre tudo que Forrest não pode ou deseja de afastar: consome drogas, vive sob estilo dos hyppies, bebe, fuma, viaja de canto em canto sempre à procura da sua outra metade. Engraçado é esta parte da laranja estar agarrada com Forrest, o amigo das horas difíceis. Só Jenny, a menina-problema, enxerga isso de forma embaçada. Finge. E, com isso, maltrata o pobre contador de histórias. O fim do filme é o ápice de que tudo caminha, mas com mãos separadas. Aliás, durante todo o longa isso é mostrado. O personagem de Hanks narra suas histórias a um público rodízio, que se reveza no banco de uma praça tal como os humoristas da “Praça da Alegria”, de Manoel de Nóbrega. Desde os passos iniciais de Gump, com um aparelho ortodôntico para corrigir a coluna, até suas incríveis habilidades no pingue-pongue e os encontros na Casa Branca. Ele perde amigos, como Bubba, mas traz outros, como o tenente Dan e sua coragem de sobreviver. E sua casa, no Alabama, continua firme. Aquela mesma que outrora serviu de pensão, cujo um inquilino foi um jovem rebelde que só queria saber de rebolar (o rei do rock Elvis Presley). Ele aprendeu a dançar com quem? Forrest Gump, o próprio. As várias alternativas se encaixam no decorrer do filme.
Tom Hanks não saberia, mas se tornaria um expert em guerras a partir de “Forrest Gump”. Na fita de 12 anos atrás, ele rasteja contra os Charlies do Vietnã. A narrativa poética que faz emociona. Os trechos da chuva principalmente. “Foram os meses chovendo sem parar, até que um dia, alguém desligou tudo e parou”. Dá a sensação de histórias em quadrinhos misturada com um sentimento que ainda não consegui desvendar em mim mesmo. Algo de lúdico demais para mim, assim como os dois céus que surgem quando corre três anos sem parar. Há detalhes pouco visíveis em “Forrest Gump”, ressalte-se. São tão mínimos que eu também não os vi, mas tive a certeza de que eles existem. Isso porque os traços históricos prevalecem mais. Depois do filme, Hanks encamparia outra batalha em “O Resgate do Soldado Ryan” (1998), onde nas trevas da Segunda Guerra Mundial procura Ryan por toda parte. No monólogo “Naufrago” (2000) acontece o mesmo, mas a questão para viver é outra. Ele já vinha de exuberante performance em “Filadélfia” (1993), citado na coluna da semana passada. Os Oscars daquele ano e de 1994, como não poderia deixar de ser, foram para o ator. “Forrest Gump”, além disso, levou mais cinco estatuetas, dentre as quais estão as de diretor (Zemeckis), filme, roteiro adaptado, efeitos visuais e montagem/edição.
Uma curiosidade do filme está na participação de Haley Joel Osment. Para os esquecidos, Joel protagonizou em 1999 o excelente “O Sexto Sentido”, no papel do garoto que vê e conversa com os fantasmas. Cinco anos antes, aos quase seis de idade, ele aparece na parte final da fita, como o filho de Forrest com Jenny. Entre os extras do DVD, está o teste dele para o personagem Forrest Júnior. Em 10 de abril, Joel fará 18 anos. Desde 2003, quando rodou “Lições para Toda Vida”, não tem um filme em cartaz. Parece com a pluma que navega pelo ar de “Forrest Gump”.Carreiras e destino, o impasse estipulado por Gump. Espera-se até que ela caia em alguém.